Capítulo sobre mortes de Pedrógão só será divulgado sem nomes das vítimas

Ministério da Administração Interna diz que tem "outras prioridades" neste momento e que capítulo que descreve circunstâncias de mortes e do socorro às vítimas será divulgado quando identidades forem retiradas.

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Reuters/RAFAEL MARCHANTE

Falta um capítulo inteiro ao segundo relatório sobre o incêndio de Pedrógão Grande encomendado pelo Governo. É o capítulo mais extenso, é inteiramente dedicado aos “acidentes pessoais” que aconteceram em 17 de Junho, e descreve em detalhe as circunstâncias em que ocorreram as mortes e os pormenores do socorro às vítimas. Mas no lugar do sexto capítulo do relatório produzido pelo Centro de Estudos sobre Incêndios Florestais o que aparece é uma página quase toda em branco.

"O conteúdo deste capítulo, por motivos relacionados com a Protecção de Dados Pessoais, será disponibilizado oportunamente, logo que seja tornado anónimo”, justifica-se na página 149 do documento que foi divulgado nesta segunda-feira. O Expresso adiantou entretanto que esta parte do documento foi cortada a pedido da ministra da Administração Interna, com o objectivo de assegurar a protecção dos dados pessoais, mas o relatório vai em breve ser publicado na íntegra, até porque isso mesmo terá sido exigido pelos familiares.

Começando pelas mortes, o sexto capítulo do estudo coordenado por Xavier Viegas (do Centro de Estudos sobre Incêndios Florestais da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra) analisa igualmente algumas situações "de sobreviventes, de pessoas que estiveram em perigo e, nalguns casos, ficaram feridas” e descreve “alguns casos de prestação de socorro”, lê-se na parte inicial do relatório.  

O PÚBLICO perguntou ao Ministério da Administração Interna quando é que o capítulo em falta será tornado público. "Quando forem expurgados todos os dados pessoais como decorre da lei”, respondeu o gabinete da ministra Constança Urbano de Sousa. Qual é a data prevista para a divulgação? "Não é possível avançar data, até porque, como é publico, há para já outras prioridades", foi a resposta.

Os responsáveis da Associação das Vítimas do Incêndio de Pedrógão Grande, que se reúne nesta quarta-feira com o primeiro-ministro, exigem que esta parte do estudo seja divulgado, sublinhando que é fulcral para se perceber o que falhou no socorro. "As pessoas e o país têm o direito de saber o que aconteceu com uma das componentes mais importantes do papel do Estado, que é o socorro às vítimas”, defende Nadia Piazza, presidente da associação e mãe de um menino de cinco anos que morreu na tragédia .

Nas mais de duzentas páginas do documento, enfatiza-se que os problemas começaram logo no combate inicial e que várias circunstâncias poderiam ter evitado ou pelo menos minorado a dimensão da tragédia. 

Os peritos concluem ainda que a coordenação das operações, que incluía o socorro às vítimas e o combate ao incêndio, foi claramente afectada depois de se saber que havia um grande número de vítimas mortais. "Não foi feita uma operação de busca e salvamento em larga escala" para chegar junto dos feridos e "levá-los para locais onde pudessem ser tratados". "Estamos convencidos de que se poderiam ter evitado algumas mortes e muito sofrimento aos feridos, se este socorro fosse mais pronto e melhor organizado", concluem.

A grande dimensão desta tragédia evidenciou ainda que o nosso sistema de emergência não está preparado para fazer face a um número tão maciço de pessoas afectadas, feridas ou mortas. A prestação de apoio psicológico e socorro médico e hospitalar teve deficiências" e a situação do país no socorro a "doentes queimados graves" é "ainda insuficiente em acidentes desta escala". 

Destacando a circunstância de “apenas quatro das 65 vítimas deste incêndio” terem perdido a vida “dentro de casa” e de todas terem "algum problema de mobilidade ou de saúde”, os autores do relatório afirmam que “para a larga maioria” a permanência em casa "teria sido a opção mais segura”.

Por isso é que, nas recomendações, manifestam reservas quanto às "evacuações compulsivas generalizadas”. "Os cidadãos que estejam física e psicologicamente aptos para defender as suas habitações não deverão, em princípio abandoná-las”. Se necessária uma evacuação, esta deve ser “planeada e executada com antecedência”, preconizam. Já as crianças, os idosos, as pessoas de mobilidade reduzida e as pessoas debilitadas ou doentes devem ser retiradas "logo que possível”.

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