Risos madrugadores, férias, contradições e zero demissões

O filme político de mais um dia trágico em que Marcelo andou sempre à frente de Costa e foram ditas algumas frases no mínimo surpreendentes.

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LUSA/JOSÉ SENA GOULÃO

Portugal estava em alerta. Previam-se temperaturas altas para aquele domingo, 15 de Outubro, com ventos que poderiam ser fortes e um país em seca grave. O alerta justificava-se logo de manhã. Mais uma vez, durante a noite tinham começado vários fogos e alguns evoluíram para graves logo de manhã. Pela 13h já havia notícias de milhares de homens no combate aos fogos, de estradas cortadas e lugares evacuados. Os incêndios voltavam a queimar violentamente o Centro e Norte do país. Ao longo da noite de domingo e na madrugada e manhã de ontem ficar-se-ia a saber que o país passava por mais uma enorme tragédia. Como reagiu o Governo a tudo isto? O PÚBLICO faz o filme político do Governo e do Presidente da República.

Dia 15

18h49 – É conhecida a primeira acção política do Governo. A agência Lusa noticia que a ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa, preside à reunião extraordinária do Centro de Cooperação Operacional Nacional (CCON), que decorreu ao fim da tarde na Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC), em Lisboa. Nesta altura, segundo a ANPC, estavam activos 18 “grandes incêndios” em todo o país, tendo os fogos já provocado 23 feridos e destruído várias casas. Havia pessoas evacuadas e estradas cortadas.

20h46 – Jorge Gomes, secretário de Estado da Protecção Civil, surge pela primeira vez nas televisões. Está no Posto Operacional de Comando de Arouca. Ao longo da noite vai rodando por várias televisões. Mas é já depois da meia-noite que, em declarações à SIC, faz a afirmação mais surpreendente. “Têm de ser as próprias comunidades a ser proactivas e não ficarmos todos à espera que apareçam os nossos bombeiros e aviões para nos resolver os problemas.” Numa altura em que Jorge Gomes sugeria aos cidadãos que fossem para o terreno combater as chamas, em Espanha, onde havia grandes incêndios na Galiza, o Governo apelava a que “ninguém actue por sua conta” e que mantivessem em casa e  cumprissem as ordens das autoridades.

Dia 16

0h51 – Marcelo Rebelo de Sousa é a primeira figura política de destaque a comentar a situação. O presidente entra em directo por telefone na SIC Notícias, faz um balanço do dia, fala em “mais um dia e noite trágicas”, agradece aos bombeiros e populações e deixa uma palavra de apoio aos familiares das vítimas. Marcelo colocaria também uma nota na página da Internet da Presidência da República.

1h31 – A Lusa revela que António Costa vai a caminho da sede da ANPC, onde se vai juntar à ministra da Administração Interna. Nesta altura era já oficial a existência de três vítimas mortais.

2h32 – António Costa deixa a sala de operações da Protecção Civil e, acompanhado pela ministra da Administração Interna, aceita responder a perguntas dos jornalistas. Questionado mais uma vez sobre se Constança Urbano de Sousa tem condições para continuar no cargo, responde: "Claro, senão não estava aqui com a senhora ministra." Costa tem também uma afirmação surpreendente feita em jeito de aviso aos portugueses: "seguramente" situações como as vividas no domingo "vão repetir-se".

O primeiro-ministro protagonizaria ainda uma das frases do dia. Uma jornalista da SIC fala-lhe “num pacote florestal apressado” e no facto de quatro meses depois de Pedrógão Grande voltar a haver vítimas mortais nos incêndios. “Minha senhora, não me faça rir a esta hora”, diz, explicando depois que o pacote florestal não foi apressado. António Costa tinha um reparo a fazer à SIC, lamentando que a estação “não tenha dado a menor atenção” ao debate sobre a reforma da floresta.

11h34 – A ministra da Administração Interna, no final de mais uma visita à ANPC, falou aos jornalistas e voltou a dizer que “este não é tempo de demissões”. A este propósito, Constança Urbano de Sousa proferiria outras das frases do dia: “Para mim seria o caminho mais fácil. Ia-me embora, ia ter as férias que não tive e isso resolvia o problema? Não resolvia.”

11h49 – Depois de o primeiro-ministro ter falado detalhadamente aos jornalistas sobre a reforma florestal, a Lusa publica uma notícia em que o ministro do Ambiente, Matos Fernandes, diz que “este não é o momento para falar” sobre o assunto.

14h50 – A Presidência da República coloca uma nova nota na página da Internet em que Marcelo reafirma “a urgência de agir”. Numa altura em que já tinha cancelado a sua agenda e anunciado que falaria ao país, não revelando quando, o Presidente apela “a uma mudança de ponto de vista, traduzida em actos e não em palavras". É ainda dito que Marcelo visitará as áreas ardidas e que poderá adiar uma visita aos Açores.

16h16 – A Lusa revela que António Costa, que também cancelou a agenda, fala ao país sobre a situação dos incêndios depois das 20h. Desta vez o primeiro-ministro sai à frente, por acordo com o Presidente, que, neste caso, terá a última palavra.

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