Oposição venezuelana quer vencer regionais sem legitimar o regime

Em causa está a escolha de novos governadores e as sondagens apontam para um reforço da oposição. Governo aposta numa participação baixa para conter perdas.

Foto
O até agora governador do estado de Miranda, Henrique Capriles (à direita), um dos líderes da oposição, não se recandidata. Em seu lugar, concorre Carlos Ocariz MIGUEL GUTIERREZ/EPA

Depois de meses marcados por violentos protestos que deixaram mais de cem mortos nas ruas de várias cidades venezuelanas, oposição e oficialismo voltam a trazer o seu confronto para a arena eleitoral. Para o regime de Nicolás Maduro trata-se de demonstrar ao mundo que, apesar da contestação, é possível regressar ao funcionamento normal das instituições. Para os seus opositores, as eleições regionais deste domingo representam uma oportunidade para capitalizarem o descontentamento crescente e reforçar a sua posição.

Em causa está a escolha dos governadores dos 23 estados venezuelanos, mas num contexto de crise política e económica, as implicações das eleições deste domingo são mais profundas. Trata-se, desde logo, do primeiro duelo eleitoral entre a oposição e o oficialismo desde as eleições legislativas de 2015, que deram uma vitória retumbante à coligação da Mesa de Unidade Popular (MUD) – que passou a deter a maioria na Assembleia Nacional. A oposição decidiu boicotar as eleições para a Assembleia Nacional Constituinte, em Julho, por encará-las como um artifício do Governo para substituir a Assembleia Nacional.

Nos meses mais recentes, a oposição tem perdido alguma da capacidade para mobilizar as ruas contra o regime e, por isso, aposta agora em infligir uma nova derrota ao oficialismo nas urnas. A grave crise económica que atinge a Venezuela deverá jogar a favor da MUD, cujos candidatos, de acordo com algumas sondagens, podem ser eleitos em 18 dos 23 estados – actualmente, há apenas três governadores oposicionistas.

Porém, há divisões no seio do movimento de oposição quanto à estratégia de participação nas eleições. Alguns sectores consideram que a apresentação de candidatos confere legitimidade ao acto eleitoral, mesmo perante abusos cometidos pelos organismos fiéis ao chavismo, como a Comissão Nacional de Eleições. Em Agosto, a ex-deputada María Corina Machado dizia à CNN que o objectivo das eleições era “travar os protestos, desarticular a pressão internacional e dar tempo à ditadura”.

Para a oposição há ainda um problema adicional. Mesmo que eleja vários governadores, é incerto qual será a margem de manobra que terão para desempenhar dos cargos. Receia-se que a todo-poderosa Assembleia Nacional Constituinte  esvazie os seus poderes.

Porém, para os que defendem a participação, uma vitória nas eleições de domingo significa mais um passo no objectivo último da oposição – retirar Maduro do poder nas presidenciais do próximo ano. “Se as pessoas perceberem que com estas eleições estamos a dar mais um passo para derrubar Maduro, então irão votar”, disse ao Washington Post o candidato da oposição no estado de Vargas, José Manuel Olivares.

O objectivo do Governo é dar uma aparência de normalidade institucional, sobretudo para aliviar a pressão internacional. “O que é substancial é que nesta ‘ditadura’ liderada por Maduro, há eleições em cada estado  e a oposição apresentou candidatos para todos os cargos”, disse ao Post o ministro das Comunicações, Ernesto Villegas, que considera as acusações da oposição um “déjà-vu”.

Foto
Argenis Chávez, irmão do falecido Presidente Hugo Chávez, candidata-se a governador do estado de Barinas Ricardo Moraes/Reuters

O dado crucial para o desfecho das eleições será a participação e a estratégia governamental parece ser de desincentivar os eleitores a sair de casa. A poucos dias do voto, a CNE decidiu, alegando “razões de segurança”, alterar a localização de centenas de mesas de voto sem revelar os novos locais. A MUD diz que há 400 mil eleitores afectados pela mudança.

Outra decisão denunciada pela oposição foi a inclusão dos pré-candidatos da MUD nos boletins em alguns estados, em vez de aparecer apenas o nome do candidato escolhido pela coligação – algo que irá provocar uma fragmentação dos votos. “A ideia é desencorajar as pessoas de participarem”, diz à BBC Margarita Lopez Maya, professora da Universidade Central da Venezuela. “Fazem todas estas coisas porque sabem que não podem vencer e fazem-no para dividir a oposição e confundir os eleitores.”

Sugerir correcção
Ler 1 comentários