Fotografia
Os segredos que escondem os portões de Veneza
José Pedro Martins percorreu ruas e ruelas na cidade de Veneza, em Itália, acompanhado (mentalmente) por Corto Maltese e pelas suas aventuras na Fábula de Veneza. Uma passagem do livro, escrito por Hugo Pratt, passou vezes sem conta pela memória do fotógrafo enquanto percorria "a cidade do amor", como reproduz ao P3. Nela, o narrador recorda-se de, na sua infância, acompanhar a avó ao antigo Ghetto de Veneza, onde ia visitar uma amiga. A Sra. Bora Levi morava numa "casa antiga", para a qual se entrava por uma escada exterior de madeira, a "escada louca", "escada dos ratos de esgoto", "escada turca". De lá, da janela da cozinha, avistava-se um pequeno largo, o "Pátio Secreto" ou "do Arcano", cujo acesso era tudo menos fácil. Para lá chegar, diz o livro, tinham de ser abertas sete portas. Cada uma delas tinha gravado o nome de um Shed, um "demónio da casa dos Shedim", e, para abri-las, bastava proferir uma "palavra mágica", ou seja, o nome de cada um deles — Sam Ha, Mawer, Ashmodai, Shibbetta, Ruah, Kardeyakos, Nà Amah. "Um dia", conclui a personagem, "a Sra. Bora Levi pegou-me na mão e conduziu-me ao Pátio Secreto, iluminando o nosso caminho com um menorá, o candelabro de sete braços. A cada porta que abria, apagava uma vela." As portas das casas de Veneza e os demónios que nelas habitam encerram em si um mistério que José Pedro Martins tentou traduzir em imagens na série de fotografias Portas de Veneza, que realizou em Setembro de 2017. "[As portas] não serão as mesmas que Pratt referiu no seu texto, diferem pela sua individualidade", indaga do fotógrafo no comunicado que dirigiu ao P3. O que existe para lá dessas portas? "Ficará para sempre a dúvida, o secretismo...", conclui. O fotógrafo e professor, já premiado internacionalmente, publicou outras séries no P3: sobre os farricocos, as fachadas das casas das Caxinas e os heróis nas paredes de Vila do Conde. Mantém, ainda, o Acrobatic Project.