Lusitânia retira quase 80 milhões ao Montepio Gestão de Activos

Com os chineses da CEFC Energy Company Limited à porta, para serem accionistas, a seguradora Lusitânia do grupo Montepio “desvia” quase 80 milhões da esfera do accionista.

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pcm patricia martins

Nos últimos dois anos e meio, o montante de activos sob gestão na sociedade Montepio Gestão de Activos, detida pela Associação Mutualista Montepio Geral (AMMG), reduziu-se em 185 milhões de euros. Um diferencial que resulta em parte dos quase 80 milhões de euros de activos que foram resgatados pela seguradora do grupo, a Lusitânia, para os colocar sob gestão externa.

Entre 31 de Dezembro de 2014 e 31 de Agosto de 2017, os activos sob gestão na sociedade especializada do grupo Montepio, reduziram-se em 52,44%, passando de cerca de 351.925.072 euros para 167.373.692 euros [no mesmo período o sector cresceu em torno de 1%]. E do diferencial de 184.551.380 euros (a diferença entre resgates e subscrições) apurado pela Montepio Gestão de Activos, quase 80 milhões de euros foram retirados pelo grupo segurador liderado por Fernando Nogueira.

A Lusitânia confiou à disposição da multinacional Mercer (sob contrato de gestão) a parte relevante dos quase 80 milhões de euros que foi levantar à Montepio Gestão de Activos. Esta multinacional opera em Portugal, nomeadamente na área dos fundos de pensões e dos recursos humanos (aconselhando os clientes onde aplicar os activos, por exemplo, em fundos da própria Mercer ou em fundos de terceiros.)

Uma empresa que não é desconhecida dentro do grupo Montepio. É que foi à Mercer que, em 2014, a Lusitânia foi buscar Paulo Martins Silva, que começou como director e passou, em 2016, a administrador financeiro (CFO) de Fernando Nogueira. Paulo Martins Silva é genro de José Almeida Serra que, entre outros cargos, era em 2016 administrador da AMMG e membro da Comissão de Vencimentos da Lusitânia.

Recentemente, a Mercer anunciou a compra da consultora portuguesa Jason Associates, que opera no domínio da comunicação, mudança e transformação, gestão de talento, tecnologia e gamificação na área de recursos humanos.

Uma fonte do PÚBLICO, próxima da gestão de Tomás Correia, justificou a deliberação da Lusitânia, ainda que a título informal, como visando diversificar o risco, num quadro regulatório mais apertado e de turbulência como o que se vivia em 2015 e 2016. Razões que terão levado a seguradora a contratar “uma grande consultora, como a Mercer”.

O que não evitou que se abrisse a porta a mais uma polémica dentro do Montepio. E não por estar em causa uma ilegalidade ou uma decisão incorrecta. Mas porque a Lusitânia foi “desviar” quase 80 milhões de euros do universo accionista num contexto particularmente sensível, como sublinharam ao PÚBLICO fontes próximas da administração. “O desempenho da Montepio Gestão de Activos até tem sido favorável” e a Lusitânia, ao optar por deixar de ter exposição ao grupo, “acabou por dar um sinal, ainda que involuntário, de não acreditar no accionista.” E há sempre “o tema de o CFO ter sido recrutado da Mercer.”

O PÚBLICO enviou à Lusitânia um conjunto de pedidos de esclarecimento sobre os temas aqui referidos: “O que levou a Lusitânia a retirar de dentro do grupo Montepio os activos sob gestão na Montepio Gestão de Activos? Qual o montante resgatado? Quem tomou a decisão? Quais os critérios que levaram à escolha da Mercer? A Lusitânia acautelou juridicamente o facto de Paulo Silva ter sido recrutado à Mercer, o que poder ser considerado ‘um conflito de interesse’?” E a Lusitânia respondeu: “Vimos por este meio informar que todos os investimentos realizados são efectuados pelos órgãos próprios da companhia” e “a nossa política de investimentos tem como critério central a conjugação de dois factores: segurança e rentabilidade.”

Os tempos são de mudança para a Lusitânia. Cinco dias depois de, a 17 de Setembro, o Jornal Económico ter avançado que o Montepio mandatou o escritório de advogados Uría Menéndez-Proença de Carvalho para preparar a venda de parte do capital da Lusitânia (Vida e Não Vida), Tomás Correia anunciou que celebrou um acordo com o grupo chinês CEFC Energy Company Limited e que abrangia parcerias em várias áreas. E entre elas estará a entrada no capital da Lusitânia, processo que está a levar a reuniões e pedidos de informação aos reguladores e tutela.

A Lusitânia Vida fechou o exercício de 2016 com um lucro de 2,85 milhões de euros e prémios processados de 162,2 milhões de euros, enquanto a Lusitânia (não vida) acabou o ano no vermelho, com um resultado líquido negativo de 8,4 milhões de euros em 2016, uma melhoria de 80,5% face a 2015.

 

Notícia alterada às 13h: onde estava Lusitânia Vida, passou a estar Lusitânia.  

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