Os detalhes que fazem a diferença nestas eleições autárquicas

Afinal, as eleições não permitem assim tantas coligações entre PS, PCP e BE e há estreias a salientar. Aqui ficam alguns detalhes destas eleições autárquicas.

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Luísa Salgueiro foi das poucas mulheres eleitas presidente da câmara Paulo Pimenta

Nas trocas e baldrocas, houve nove câmaras a experimentarem um partido novo

Em 2017, ainda havia 36 pequenos mundos autárquicos que nunca tinham experimentado um partido novo para presidir à câmara municipal. Nove decidiram virar a agulha nestas eleições, com o PSD a ser o partido a ver invadidos mais espaços eleitorais que até agora dava como seus.

Nas surpresas destas eleições, os sociais-democratas perdem cinco câmaras que nunca foram governadas por outro partido. Ribeira Brava e Oliveira de Frades para independentes, Ponta do Sol, Oliveira de Azeméis e Ansião para os socialistas. 

Não foram, no entanto, os únicos a perder câmaras de sempre para o PS. O PCP viu os socialistas levarem-lhe bastiões que desde 1976 sempre tinham votado nos comunistas, coligados com Os Verdes. Almada foi a maior surpresa da noite, com Inês de Medeiros a ser eleita por 303 votos de diferença para os comunistas, sem maioria absoluta. Além de Almada, o PS, com António José de Brito, roubou ainda à CDU Castro Verde, onde o presidente Francisco Duarte se recandidatava para o último mandato. 

Até o PS perdeu câmaras para socialistas. E isto não é um erro. Em Vizela, o candidato oficial do partido, um independente, perdeu para um ex-militante socialista dissidente, que se candidatou como independente... Em Vila do Conde, a independente que foi candidata do PS em 2013 não chegou este ano a acordo com o partido e entendeu que se devia candidatar mesmo como independente.

Estas nove alterações foram das mais surpreendentes da noite, mas foram 47 as câmaras que trocaram de cor nestas eleições. O PSD perdeu 20 câmaras, a sua maioria para socialistas (15), mas na luta entre os dois partidos, o resultado líquido, apesar de favorável ao PS, não é muito desiquilibrado, porque os socialistas também perderam 15 câmaras, 12 delas para os sociais-democratas e três para independentes.

O PCP foi o outro derrotado da noite, perdendo dez câmaras, nove delas para o PS e Peniche para um grupo de independentes. Liliana Valente

As eleições dão pouco espaço a "geringonças"

A análise dos dados finais das eleições mostra que os portugueses não deram muito espaço à formação de acordos de governação à esquerda no próximo mandato autárquico. Feitas as contas, das quase 160 câmaras que se sabe terem sido ganhas pelos socialistas, apenas em 15 não conseguiram uma maioria absoluta. Mas, de entre estas, só em sete casos os autarcas “rosa” poderão escolher um parceiro à esquerda para negociar a governação. Já agora, mais um ponto: só num dos casos o Bloco pode entrar, no de Lisboa.

Na capital, Fernando Medina falhou o objectivo máximo por apenas um vereador. Mas pode escolher um entre quatro aliados possíveis: seja o CDS, o PSD, a CDU ou o Bloco. Nas restantes seis câmaras de alinhamento possível à esquerda, as hipóteses de trabalho são mais reduzidas: no Alandroal e Marinha Grande é entre PCP e um independente; em Vila Franca de Xira resta o PCP; no Crato é entre comunistas e sociais-democratas; em Matosinhos é escolher entre dois independentes, PCP ou PSD; em Alcochete (surpresa) entre PCP ou CDS.

Mas há mais quatro “geringonças em potência" pelo país fora – só que de sentido contrário: em Vila Viçosa, Moita, Palmela e Seixal é o PCP que escolhe com quem “se casar”. Só num dos casos, no Seixal, o Bloco pode ajudar – muito longe, portanto, do objectivo que Catarina Martins assumiu na estratégia eleitoral do partido.

Já para o PSD, há apenas cinco casos de autarquias ganhas sem maioria, e apenas numa, em Marvão, o parceiro pode ser o CDS. De resto, terão os sociais-democratas de optar entre apoio dos socialistas ou de independentes. David Dinis

Oposição costuma ganhar autárquicas

Desde 1985 que um partido no poder não ganhava as eleições autárquicas, sobretudo com tamanha diferença em relação ao segundo mais votado. António Costa, secretário-geral do PS, deu no domingo a primeira vitória eleitoral a António Costa, primeiro-ministro. Ou vice-versa. O importante é que os números comprovam que em 2013, 2009, 2005, 2001,1993 e 1989 foi sempre o partido que estava na oposição a ganhar as eleições. Em 2001, inclusivamente, a derrota foi de tal modo acentuada, em número de câmaras, que o Governo de António Guterres acabou por cair. Nos últimos 32 anos, só em 2017 o partido que governava ganhou as autárquicas. E em 1997 houve um empate.

Fazendo as contas de trás para a frente, enquanto foi primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho teve umas eleições locais e perdeu-as para o PS, que estava na oposição sob a liderança de António José Seguro. José Sócrates atravessou, com derrotas, as autárquicas de 2005 e de 2009, nas quais o PSD obteve 158 presidências (contando com as coligações feitas à direita) e 139, respectivamente. No caso de António Guterres, em cujos mandatos houve duas eleições (1997 e 2001), houve a grande derrota do "pântano", em 2001, em que o PSD conquistou 175 câmaras contra 113 do PS, e um empate a 128 câmaras, em 1997. A comparação é sempre feita entre socialistas e sociais-democratas coligados com o CDS.

É preciso recuar até 1985 para encontrar um partido que estava no Governo e conseguiu ganhar mais câmaras. E aí, a vitória do PSD foi retumbante: 149 câmaras para o PSD e 79 para o PS (o mesmo resultado agora obtido pelo PSD sozinho, sem alianças). O primeiro-ministro era Cavaco Silva. Antes dele, outros sociais-democratas (Pinto Balsemão e Mota Pinto) tinham repetido a façanha. Sónia Sapage

Com o fim dos “dinossauros”, muitos concelhos entram noutro tempo

No país havia 33 “dinossauros” que não se podiam recandidatar, por causa da lei de limitação de mandatos. Nesses municípios, houve 15 que mantiveram a cor política, 16 que aproveitaram para mudar e dois em que o poder passou para as mãos de independentes. A CDU perdeu Peniche para um independente e, em Águeda, Jorge Almeida, que foi nos três últimos mandatos vice-presidente de Gil Nadais (PS), venceu com maioria absoluta pelo movimento independente Juntos. Houve ainda mudanças em câmaras que eram governadas pela direita em coligação e que agora o são apenas por um dos partidos – PSD ou CDS.

Mas nas autarquias há outras voltas e reviravoltas mais surpreendentes. Um exemplo: os destinos de Oliveira de Frades estavam nas mãos de Luís Vasconcelos (PSD/CDS) que já não se podia recandidatar. Agora o concelho vai passar a ser liderado por Paulo Ferreira que era presidente da União das Freguesias de Oliveira de Frades, Souto de Lafões e Sejães, eleito nas listas do PSD. Só que, desta vez, foi eleito presidente de câmara… pelo Nós, Cidadãos! – é a primeira vez que o partido o consegue. Alguns exemplos de câmaras governadas por estes autarcas antigos e perdidas pelo PS: Castanheira de Pêra passou a concelho laranja e quem vai mandar é Alda Correia. Quem governava Celorico da Beira era o “dinossauro” José Monteiro (PS); agora é o PSD, com Carlos Ascensão. Passagens da direita para a esquerda: Alter do Chão passa do PSD para o PS; Lamego do PDS/CDS para o PS; Marco de Canaveses estava nas mãos de Manuel Moreira (PSD) e agora é do PS. Barreiro, Barrancos e Alcochete, que também eram governados por “dinossauros” comunistas, passam para a alçada do PS. Maria João Lopes

Este país autárquico continua a não ser para mulheres

A lei da paridade já chegou às listas, mas não chegou aos resultados eleitorais. Os homens continuam a ter a esmagadora maioria das presidências de câmara (276), tendo sido eleitas este domingo apenas 32 mulheres como autarcas. Os dados até já foram piores e têm vindo a melhorar. Em 2013 eram apenas 23.

Para este aumento, contribuiu sobretudo o aumento de autarcas socialistas mulheres. Na noite eleitoral, houve 19 candidatas do PS a cantar vitória, sete do PSD (ou PSD/CDS), três da CDU e três eleitas por grupos de cidadãos. 

No campo socialista, oito delas protagonizaram reviravoltas eleitorais que não eram esperadas. Aliás, o resultado eleitoral mais surpreendente da noite foi mesmo o de Inês de Medeiros (candidata pelo PS), que roubou a presidência da Câmara de Almada ao PCP. Mais a norte, em Matosinhos, Luísa Salgueiro foi protagonista de uma guerra acesa entre socialistas. Foi a candidata oficial do partido que venceu dois ex-militantes do PS que concorriam como independentes, António Parada e Narciso Miranda.

Já o PSD elegeu quatro novas presidentes e reconduziu três. Há apenas uma única mulher cabeça de lista que conseguiu roubar a câmara a outro partido. Trata-se de Alda Correia, em Castanheira de Pêra, que substitui o dinossauro do PS Fernando Lopes. 

No PCP, das seis mulheres eleitas para presidências de câmara em 2013, só três conseguiram a reeleição. Duas já tinham saído e a terceria, Mariana Chilra, no Alandroal, foi uma das derrotadas da noite, perdendo para o candidato socialista João Grilo. Liliana Valente

Um pé no Parlamento, agora têm de ir os dois para a câmara

O grupo parlamentar do PS vai ter de fazer pelo menos duas substituições por causa das eleições. Os socialistas apostaram em duas deputadas para os municípios de Matosinhos e Mirandela e ganharam. A deputada Júlia Rodrigues virou Mirandela, até aqui um bastião social-democrata para os socialistas. E a deputada Luís Salgueiro ganhou para o partido a câmara que também era disputada por dois candidatos independentes da área socialista, Narciso Miranda e António Parada. 

Houve outras apostas como a de Gabriela Canavilhas em Cascais que não saíram vitoriosas, mas que reforçou a votação e foi eleita vereadora da oposição. 

Só em Lisboa, PSD e CDS ficaram assim com duas deputadas eleitas vereadoras da oposição, Teresa Leal Coelho e Assunção Cristas.

No BE, Joana Mortágua foi eleita vereadora da oposição em Almada (e pode ser a chave para ajudar a que a cidade fique governável para o PS). E nos restantes partidos, vários deputados foram eleitos para assembleias municipais. Liliana Valente

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