PSD, aqui e agora

Se quer um candidato credível a primeiro-ministro em 2019, a partir de segunda-feira Passos terá de mudar a estratégia e redefinir um projecto de poder.

A partir de segunda-feira a política portuguesa sairá do modo de pausa em que tem vivido os últimos meses, pelo facto de os partidos com assento parlamentar estarem focados em atingir os melhores resultados eleitorais possíveis nas autárquicas.

Com o Orçamento do Estado para 2018 em fase final de negociações, muitas das suas opções estão já decididas e seguem-se ajustes no concreto da despesa pública. É, aliás, sabido que a viabilização do OE2018 está à partida garantida pelo BE e pelo PCP, ambos os líderes já o afirmaram. Até porque não seria politicamente viável comunistas e bloquistas denunciarem agora o acordo de governação com os socialistas. Era imenso o risco de serem eleitoralmente punidos e darem ao PS uma maioria absoluta em legislativas antecipadas. O mesmo é verdade também para o OE2019.

A retoma da normalidade parlamentar e os tempos mornos que se avizinham na política portuguesa, embalados pela expectativa de crescimento económico e de baixa de desemprego, não significa que a política esteja adormecida. Há questões maiores no horizonte do debate partidário nos próximos dois anos: a descentralização e a preparação do próximo quadro comunitário de fundos estruturais, o Portugal 2027.

A descentralização está anestesiada no Parlamento à espera do fim das autárquicas. Quanto ao Portugal 2027, o primeiro-ministro, António Costa, já lançou o tema em entrevista ao Expresso, antes da campanha autárquica. E desafiou o principal partido da oposição, o PSD, para diálogo e consensos em torno das opções e da preparação da estratégia portuguesa para negociar com os outros 26 Estados-membros uma redistribuição de fundos que seja o mais favorável possível ao Estado português.

É previsível que os próximos tempos não sejam fáceis para Pedro Passos Coelho, como não têm sido desde que foi apeado do Governo pelos acordos de Costa com o BE, o PCP e o PEV para conquistar a oportunidade de o PS governar. É provável que a contestação a Passos permaneça ou se intensifique, sobretudo se for negativa a leitura nacional das autárquicas. O próprio Passos já reafirmou que permanecerá à frente do partido e garantiu que quer disputar a liderança no início do ano, para ganhar. Mas Rui Rio também já fez saber que, para si, “este é o momento”.

Se quer um candidato credível a primeiro-ministro em 2019, a partir de segunda-feira Passos terá de mudar a estratégia e redefinir um projecto de poder. Não chega fazer um discurso despeitado e muito menos manter como mensagem a ideia de que se tivesse podido continuar a sua trajectória de governação o país estaria melhor. Na política, como na história, não há “ses”.

Cabe ao PSD cumprir o seu papel histórico no sistema político português, ser um partido de poder, disputar o Governo e contribuir, mesmo na oposição, para viabilizar soluções de longo prazo para o país. E se até 2019 não é expectável que o tipo de solução parlamentar que apoia o Governo se modifique, tudo indica que, depois das legislativas, muito dificilmente se repetirá um acordo do mesmo tipo entre PS, BE e PCP. Por muito que Costa o deseje, os sinais dados por Catarina Martins e por Jerónimo de Sousa vão em sentido contrário.

Há um factor que obriga o PSD — e Passos se este permanecer na liderança — a construir uma estratégia de poder, um discurso e um projecto político compatíveis com a realidade. Chama-se actualidade. O país não é hoje o mesmo de 2015, quando Passos deixou o Governo — ainda que seja obrigatório reconhecer o seu papel na baixa do défice, o que o torna num dos principais vencedores da superação da crise.

Por isso, Passos — se continuar como presidente do partido — terá obrigatoriamente de mudar o chip depois de amanhã. Abandonar o despeito que o tem consumido estes dois anos e começar a construir um novo projecto para o PSD apresentar ao país. Sem perder coerência, é evidente. Isso obriga-o a digerir o passado. Caso contrário, continuará a arrastar-se como um fantasma, mesmo que se mantenha à frente do partido até 2019. O PSD tem que estar aqui e agora.

Sugerir correcção
Ler 4 comentários