Morreu Luís Andrade de Sá, jornalista e “conhecedor de novos mundos”

Repórter, editor e chefe de redacção da Lusa passou por Macau e Moçambique, fez jornalismo político em Portugal e foi autor de vários livros. Tinha 58 anos e deixa uma filha de 20 meses e um filho de 12 anos.

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Luís Andrade de Sá tinha 58 anos

Amigos e colegas recordam Luís Andrade de Sá como uma pessoa frontal e culta, um jornalista de grande experiência, que manteve o sentido crítico e o humor até aos últimos momentos. Já doente, continuava a ler jornais da primeira à última página. Nos últimos meses, apenas passava os olhos cansados mas sempre atentos pelos títulos.

Os livros  também o acompanharam até às últimas semanas, pela voz de Isadora – sua mulher e mãe de Luísa, a filha mais nova – que o ligava ao presente e à vida através da leitura nos dias (todos os dias) em que esteve a seu lado.

Os jornais, os livros, as viagens preencheram a vida do repórter e editor da agência Lusa que morreu nesta terça-feira, aos 58 anos, de cancro. A doença foi-lhe diagnosticada há pouco mais de dois anos.

Os álbuns de fotografia que ficam para os dois filhos estão repletos de paisagens, mas antes de mais Luís Sá era “um agregador de pessoas, um grande amigo” como diz a jornalista italiana Paolla Rolletta, uma amiga de Maputo.

Continuou a interessar-se pelo mundo e pelos amigos que o rodeavam até a doença –  que viveu com a serenidade de um grande senhor – lho permitir. O velório será esta quinta-feira, entre as 10h e as 22h na Capela São João de Deus, na Praça de Londres. A cerimónia fúnebre será no dia seguinte no crematório dos Olivais, em Lisboa, às 11h.

Luís Andrade de Sá nasceu a 31 de Dezembro de 1958, em Setúbal, e começou a trabalhar como jornalista com 26 anos em 1984. Nesse ano, iniciou a sua primeira de muitas grandes descobertas de “novos mundos”, como diz um dos amigos, Jorge Silva, que com ele, e mais dois recém-licenciados do primeiro curso de Comunicação Social na Universidade Nova de Lisboa, foram nesse ano para Macau.

Começaram por trabalhar no gabinete de comunicação social nascido de um acordo entre a UNL e o governo de Macau, passaram pelo semanário Oriente, antes de entrarem para a TDM (Teledifusão de Macau).

Em Setembro de 2000, em Portugal, Luís Sá foi admitido na Lusa onde trabalhou 17 anos. Aí, assumiu as funções de editor adjunto da secção de Nacional entre Janeiro de 2001 e Março de 2003, antes de chefiar a delegação em Maputo. Em Lisboa dedicou anos ao jornalismo de Política, no Parlamento, em São Bento, ou a acompanhar chefes de Estado, como Jorge Sampaio.

Em Maputo, como delegado da Lusa, “ele não era chefe, era amigo, dos jornalistas que com ele trabalhavam”, a maioria colaboradores moçambicanos, lembra Paola Rolletta. Na primeira reportagem que fizeram juntos ficaram logo “muito amigos”. Ele ia como repórter da Lusa, ela como repórter italiana do jornal moçambicano Savana e da agência italiana Agi.

“O Luís era um homem mesmo bom, um grande jornalista. Partilhava aquela coisa de ir ao fundo” dos assuntos, “de fazer perguntas e conferir informações”, recorda a jornalista, uma das muitas amizades que Luís Sá fez pelos cinco continentes – aqueles onde trabalhou ou viajou. “O Luís era um agregador” de amigos, “apesar do seu carácter frontal e ríspido”, diz. “Quantos almoços, quantos jantares tivemos na casa deles aqui em Maputo, com pessoas de Macau, Portugal, Itália ou Austrália.” E muitas outras proveniências.

O Luís era um grande amigo que nascia das pequenas circunstâncias da vida. Era um conversador nato, que sabia (tão bem como conversar) ouvir.

O jornalista dedicava-se tanto à notícia de política e aos assuntos de agenda como ao jornalismo de investigação, à grande reportagem, recorda Jorge Silva, ainda hoje editor e apresentador da TDM. Em Macau, Luís Sá trabalhou em órgãos locais e foi correspondente do PÚBLICO e outros órgãos de comunicação social.

Como correspondente da Lusa em Maputo, publicou reportagens no semanário Expresso ou a revista Visão. Voltou a Lisboa em Fevereiro de 2007 para editar a secção Lusofonia, função que cumpriu até 31 de Outubro desse ano.

África e Oriente 

Em poucos anos, fez dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) um lugar do qual conhecia bem a História e as nuances, como antes fizera com Macau e o Oriente, pelo qual tinha preferência. Escreveu vários livros sobre Macau, entre eles A Aviação em Macau: um século de aventuras, The Boys from MacauHotel Bela Vista e A memória na bagagem.

Deixou escrito para publicação um ensaio Rosebud sobre jornalismo e cinema que reflecte sobre as várias facetas do jornalista numa revisitação a filmes de diferentes épocas.

Em Lisboa, foi chefe de redacção da Agência Lusa entre Novembro de 2007 e Fevereiro de 2011, quando voltou, até Maio de 2014, a chefiar a delegação de Maputo, onde vive o seu filho mais velho Daniel.

Percorreu Moçambique, como repórter, e também o Zimbabwe, onde cobriu eleições, e conheceu a região da África Austral, em viagens de trabalho e pessoais. Foi para Moçambique, como tinha ido 20 anos antes para Macau, diz Jorge Silva: à descoberta. “Moçambique era mais um desafio, e o Luís era um conhecedor de novos mundos.”

 

 

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