Peritos recusaram fazer perícia aos temas de Tony Carreira por receio do artista

Há mais de dois anos que o Ministério Público fez um pedido de perícia aos trabalhos do cantor.

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Enric Vives-Rubio

Vários especialistas recusaram fazer a perícia às músicas de Tony Carreira por receio da dimensão do artista, refere a resposta da Inspecção-Geral das Actividades Culturais (IGAC) enviada quase dois anos após o pedido de perícia feito pelo Ministério Público (MP).

Em Maio de 2015, o Ministério Público  enviou para a Inspecção-Geral das Actividades Culturais apensos e CD dos temas, juntamente com um pedido de perícia, segundo o processo em que Tony Carreira é acusado de plagiar 11 temas, com a colaboração do compositor Ricardo Landum, consultado pela agência Lusa no Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa.

Após várias tentativas do MP, o inspector-geral da IGAC só respondeu a 8 de Fevereiro deste ano. "Penitenciamo-nos pela morosidade numa resposta. A realidade é que fomos confrontados com sucessivas hipóteses frustradas para recrutar um perito para o exame em questão", refere o ofício assinado por Luís Silveira Botelho, que consta dos autos.

No documento, o inspector-geral da IGAC explica as razões das recusas: "Por um lado, pela especialidade dos conhecimentos musicais exigíveis, por outro, porque nos contactos efectuados a pessoas com conhecimentos desta natureza, estas têm temerariamente recusado a colaboração ou demonstrado indisponibilidade, fundamentalmente alegando a dimensão do artista, sucesso comercial das obras e receio de futuro litígio em que se possam ver envolvidos."

Um perito interno da IGAC ainda iniciou a perícia, mas concluiu que a mesma exigia conhecimentos técnicos musicais apurados para a sua concretização.

Luís Silveira Botelho conta que, "dada a urgência em dar seguimento ao processo", foram desenvolvidos novos contactos, através da Cooperativa GDA (Gestão de Direitos dos Artistas), "no sentido de conhecer a possibilidade de indicação de artista com perfil e conhecimentos de especialidade, ainda que estrangeiro, para a realização da perícia".

A Cooperativa GDA respondeu "ter feito diversos contactos e, em resultado, indicou a possível disponibilidade" do maestro e compositor espanhol Luis Cobos.

"Perante este cenário, tudo nos leva a crer estarmos perante um técnico com conhecimentos musicais adequados à realização do exame pericial em causa, razão porque solicita-se a V. Exa a possibilidade de esta inspecção-geral contactar directamente o artista em questão por forma a articular questões atinentes a eventuais custos financeiros e forma de remeter o material (uma vez aquele residir em Madrid e estar impossibilitado de se deslocar a Lisboa)", explica Luís Silveira Botelho, no ofício remetido à procuradora do MP titular do processo.

Em resposta, via email, enviado menos de duas semanas depois, a 21 de Fevereiro, a procuradora Cláudia Ribeiro solicitou ao inspector-geral da IGAC o nome das pessoas contactadas em Portugal para a realização da perícia "por forma a evitar diligências inúteis", solicitando a devolução ao DIAP de "todos os apensos enviados à IGAC em Maio de 2015, juntamente com o pedido de perícia", no prazo de 48 horas.

Cerca de duas horas depois, o inspector-geral da IGAC respondeu também por email dizendo que foram contactados Eduardo Manuel Lobo da Costa Simões, que presidiu à Associação Fonográfica Portuguesa, e Pedro Oliveira, músico e director-geral da Cooperativa GDA, os quais "transmitiram não terem obtido sucesso nos contactos telefónicos efectuados em Portugal", desconhecendo a IGAC os nomes "objecto de contacto directo" por parte de ambos.

O MP viria a conseguir um perito português, professor universitário, pianista e maestro, 60 anos, com vasta carreira ligada à música.

Contactado pela Lusa, o inspector-geral da IGAC reconhece que quase dois anos para responder ao MP não é um prazo razoável.

"Apesar das diligências efectuadas, várias outras centenas de perícias e de acções de fiscalização no terreno que a IGAC realiza, nem sempre são alcançadas, em tempo razoável, respostas a todas as solicitações", assume Luís Silveira Botelho.

"Não é normal que situações destas sucedam, mas a realidade é que, entre várias centenas de perícias, com escassos recursos, há por vezes situações que não correm como desejável, como foi o caso em apreço", refere o inspector-geral da IGAC na resposta escrita.

Luís Silveira Botelho diz que é "subjectivamente compreensível o constrangimento de músicos portugueses em avaliar obras de um artista português em situação como a que está em causa", razão pela qual num determinado momento ponderou avançar para peritos estrangeiros.

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