Costa quer Brasil e Índia com lugar permanente no Conselho de Segurança da ONU

Primeiro-ministro reiterou posição que Portugal defende desde os anos 1990 sobre uma das questões mais complexas e controversas das Nações Unidas: quem mais deve ter poder de veto na ONU? E retratou Portugal como um país fortemente multilateralista

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O Brasil e a Índia devem passar a ser membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas, disse esta quarta-feira o primeiro-ministro António Costa mal abriu a sua intervenção na 72.ª Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova Iorque.

Costa, que falou em português e se referiu à "emoção" de falar numa ONU com o primeiro secretário-geral português, pediu um “novo impulso” na reforma do conselho, uma vez que o órgão precisa de "uma representatividade acrescida correspondente ao mundo actual”, e defendeu que “o continente africano não pode deixar de ter uma presença permanente”. A seguir concretizou: “O Brasil e a Índia são dois exemplos incontornáveis.”

Esta é uma das questões mais complexas e controversas das Nações Unidas. Há anos que se discute que modelo de alargamento adoptar (há algum consenso quanto a um conselho de 24 membros, mas fórmulas várias feitas com este total) e que países escolher. Um lugar africano (sobre o qual Costa omitiu a preferência de Lisboa) é informalmente disputado pela África do Sul, Egipto e Nigéria.

O Brasil e a Índia pertencem ao “Grupo dos Quatro” (com a Alemanha e o Japão) que exigem um lugar permanente no conselho e funcionam em bloco, apoiando-se entre si, numa campanha que tem a oposição do "Clube do Café", liderado pela Itália, e que inclui o Canadá, Espanha, Argentina, Coreia do Sul e outros rivais, regionais ou económicos, do G4.

Esta semana, o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, fez um apelo semelhante num encontro com o secretário-geral, António Guterres, pedindo "mudanças significativas” no conselho, mas numa linha mais dura. O Conselho de Segurança da ONU, que faz parte da estrutura original da organização, tem os mesmos cinco membros permanentes desde 1945: EUA, Reino Unido, França, Rússia e China, os únicos (em 193) com poder de veto. Com o crescente poder da Assembleia Geral a partir de 1955, o conselho foi reformado e, em 1965, aumentou de 11 para 15 membros, mas não-permanentes, que rodam entre si anualmente. Pelo menos desde os anos 1990 que Portugal defende a entrada do Brasil e da Índia no conselho.

"As suas, são as nossas prioridades"

O discurso de Costa esteve 100% alinhado com as prioridades definidas pelo novo secretário-geral da ONU. O primeiro-ministro começou mesmo por dizer: "As suas prioridades, senhor secretário-geral, são as nossas prioridades."

Costa usou o palco da "assembleia dos povos" para posicionar Portugal como um país que segue “o caminho das Nações Unidas”: envia tropas para as missões de paz, acredita na “diplomacia pela paz”, na “diplomacia pelos Direitos Humanos”, na Agenda do Clima e na Agenda 2030. “De todas elas o meu país é parte. Para todas elas, Portugal contribui. A bem da humanidade.”

Deu três exemplos da sua defesa do multilateralismo. 1) Portugal cumprirá o compromisso voluntário da União Europeia de reduzir, até 2030, 40% das emissões de gases de efeito de estufa (em comparação com valores de 1990); 2) contribuirá para o Fundo Verde do Clima destinado à adaptação das alterações climáticas nos países em desenvolvimento; e 3) “uma das prioridades mais claras da política externa [portuguesa] é a participação nas operações de paz e de capacitação institucional das Nações Unidas”, onde reforçou os efectivos no Sahel e na África Central.

Além disso, Portugal acredita que pode “participar com maior valor acrescentado” num dos 17 objectivos da Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável: os oceanos.

Costa voltou a dizer que Portugal gostaria de acolher a próxima conferência internacional sobre os oceanos em 2020. “A sustentabilidade dos oceanos requer um reforço da sua governação. Por isso, defendemos que a Assembleia Geral [da ONU] deve estabelecer formalmente o início das negociações, já a partir de 2018, de um novo instrumento juridicamente vinculativo sobre a conservação e utilização sustentável da biodiversidade marinha em áreas para Além da Jurisdição Nacional”, defendeu o primeiro-ministro.

Como Emmanuel Macron, Donald Tusk e outros líderes europeus fizeram nesta sessão anual da Assembleia Geral da ONU — muito marcada pelo discurso nacionalista e unilateralista de Donald Trump —, António Costa sublinhou, da primeira à última palavra da sua intervenção, que Portugal acredita no multilateralismo. "O multilateralismo em nada diminui a soberania de cada uma das nações", disse Costa. Pelo contrário. "É a cooperação fraterna que o multilateralismo promove" que acrescenta força "às nossas próprias forças".

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