Terra treme no México em dia de simulacro e espalha a morte numa escola

Sismo de magnitude 7,1 fez pelo menos 225 mortos, entre as quais 21 crianças do Colégio Enrique Rébsamen, na capital. País lembrava os 32 anos do grande terramoto de 1985.

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O terramoto fez pelo menos 225 mortos Carlos Jasso/Reuters

Equilibrados em cima dos pedaços de betão que ainda há poucas horas formavam uma escola na capital do México, os muitos voluntários que ajudam a procurar e a resgatar dezenas de crianças que ficaram debaixo dos escombros vão gritando nomes através de megafones – são os nomes de crianças encontradas com vida, algumas depois de terem conseguido telefonar à família a pedirem socorro. Cá fora, ao longo de toda a noite, os pais aguardam em desespero que do próximo megafone saia o nome dos seus filhos.

A busca por informações sobre as crianças que estavam no Colégio Enrique Rébsamen quando um terramoto de magnitude 7,1 abalou o Centro e o Sul do México, na tarde de terça-feira, espalhou-se também pelas redes sociais – no Twitter e no Facebook partilhava-se o pedido dos pais de Paola Mireya, uma criança que pela fotografia não teria mais do que seis anos: "Se tiverem informações sobre uma criança Paola Mireya Jurado Rodriguez, da escola Enrique Rébsamen, entrem em contacto com o seu papá, Alejandro Jurado", seguido de um número de telefone.

Às 9h da manhã de quarta-feira, 20 horas depois do terramoto, o jornal Excelsior dava a notícia que ninguém queria ler: "Por volta das 6h30 da manhã desta quarta-feira, as equipas de resgate recuperaram o corpo da menina Paola Mireya entre os escombros do colégio Rébsamen."

Paola foi uma das 22 crianças que morreram naquela escola privada na zona Sul da Cidade do México, onde durante todo o dia ficavam mais de 300 crianças – desde o infantário, para crianças a partir dos três anos, até ao 3.º ciclo, para rapazes e raparigas de 14 anos. Era esse o número avançado pelas autoridades ao final da manhã desta quarta-feira (mais seis horas em Portugal continental) – outras três crianças continuavam desaparecidas ao fim da tarde, e toda a gente sabe que os ponteiros do relógio vão trazendo cada vez menos boas notícias à medida que passam.

Ao todo, segundo um balanço provisório, o terramoto de terça-feira à noite no México matou pelo menos 225 pessoas, 94 delas na capital e as restantes em outros cinco estados, todos no Sul do país: Morelos (71), Puebla (43) e Mexico, Guerrero e Oaxaca (um total de 17).

Menos intenso e mais mortífero

Há menos de duas semanas, no dia 7 de Setembro, o Centro e o Sul do México foram sacudidos por um terramoto de magnitude 8,2 – o mais forte em quase um século, segundo disse então o Presidente do país, Enrique Peña Nieto. Morreram mais de 90 pessoas e dois milhões ficaram com as suas casas destruídas ou muito danificadas, principalmente nos estados de Chiapas e Oaxaca, mas os estragos foram relativamente modestos porque o abalo ocorreu no mar, a quase mil quilómetros de distância da Cidade do México.

Em comparação, o terramoto de terça-feira teve uma intensidade muito mais fraca em termos de energia libertada (44 vezes mais fraca, segundo a calculadora da agência norte-americana que monitoriza a actividade sísmica), mas o que conta nestes casos é a proximidade de grandes cidades – e poucas há maiores do que a Cidade do México, com os seus quase dez milhões de habitantes que passam para o dobro se se contar a área metropolitana.

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Ao contrário do terramoto do dia 7 de Setembro, o de terça-feira resultou de um embate entre a Placa Norte-americana e a Placa de Cocos mesmo por baixo do território continental mexicano, a 51 quilómetros de profundidade (hipocentro) e a apenas120 quilómetros de distância da Cidade do México (epicentro). As coordenadas deste terramoto foram também a receita para uma tragédia maior do que a de 7 de Setembro, que está ainda em aberto – entre mortos, feridos e desalojados, o número de vítimas foi crescendo quase de hora a hora.

Para além de todos estes factores, a Cidade do México foi construída e alargada, em grande parte, em cima dos restos do lago Texcoco – o solo mais permeável e mais frágil amplifica o poder de devastação das ondas de choque, ainda por cima numa das zonas de todo o mundo em que se registam mais terramotos. Desde 1985, o México foi abalado por 11 terramotos de magnitude 7,1 ou superior.

Falha nos alarmes?

Uma das perguntas a que as autoridades mexicanas vão ter de responder quando as operações de busca e salvamento forem concluídas está relacionada com as sirenes de alarme. De acordo com vários relatos, principalmente na Cidade do México, algumas sirenes não terão soado como é suposto – um pouco antes de o sismo ser sentido à superfície, ainda que poucos segundos, o que pode dar a muitas pessoas uma fracção de tempo para tentarem manter o equilíbrio durante o terramoto.

Por coincidência, o sismo de terça-feira aconteceu no dia em que passavam 32 anos desde o terramoto mais mortífero da História do México, a 19 de Setembro de 1985 – um terramoto que matou, no mínimo, cinco mil pessoas, mas que pode ter soterrado para sempre os corpos de outras cinco mil ou dez mil.

Tal como acontece desde 1986, milhões de pessoas em todo o México prestam homenagem às vítimas daquele terramoto nos dias 19 de Setembro – nos últimos anos, as homenagens passaram também a incluir um gigantesco simulacro, para testar a reacção das autoridades a um terramoto como o que aconteceu há 32 anos. E foi pouco depois de esse simulacro ter terminado, na manhã de terça-feira, que a terra voltou a tremer na capital mexicana e em outros estados mais a Sul – por causa disso, pode ter havido alguma confusão entre a população por causa dos alarmes. Na conta no Twitter da agência mexicana SASMEX (responsável pela emissão de alertas sísmicos), algumas pessoas disseram que não ouviram os alarmes durante o simulacro.

Por volta das 11h da manhã de terça-feira, o SASMEX anunciou através do Twitter que estava a decorrer o simulacro, e que o sistema de alertas tinha sido activado após um "sismo forte no Distrito Federal e Toluca".

"Ouviu-se com o volume muito baixo na zona de San Jerónimo, a Sul da Cidade do México", respondeu o utilizador Alberto Ubaldo. "Na rua Dr. Marqués, entre o Hospital Infantil do México Federico Gómez e o Hospital Geral, o alerta não se ouviu com clareza", disse Liliana Vargas.

Entre as 13h14 de terça-feira (19h14 em Portugal continental) e a manhã desta quarta-feira foram registadas 23 réplicas do terramoto, a mais forte das quais de magnitude 4 na escala de Richter. Nas próximas horas e dias vão ser registadas muitas réplicas, à imagem do que aconteceu após o sismo de 7 de Setembro, que já teve 3400. Ainda assim, nenhuma delas comparável à réplica de magnitude 7,5 registada apenas um dia depois do terramoto de 19 de Setembro de 1985.

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