Laboratório virtual internacional quer desvendar os segredos do cérebro

Como é que tomamos decisões? Esta é a pergunta que um novo laboratório virtual de neurociências com um financiamento de 11 milhões de euros vai tentar responder.

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Imagem de neurónios, que recorreu a uma técnica que usa proteínas fluorescentes para os distinguir Michael Hausser Laboratory

Chama-se International Brain Laboratory (IBL), é o mais recente laboratório virtual de neurociências e junta 21 grupos de cientistas de Portugal, da França, da Suíça, do Reino Unido e dos Estados Unidos. De bata branca nos seus laboratórios, os investigadores vão seguir os comportamentos do ratinho para compreender como o cérebro aprende e toma decisões. Mas tudo terá de ser feito com os mesmos procedimentos e colocado numa única base de dados. Afinal, o trabalho em rede é um dos motes do IBL.

A “abertura” deste laboratório é esta terça-feira e conta com um financiamento de 11 milhões de euros da fundação britânica Wellcome Trust e da norte-americana Fundação Simons. De Portugal para o laboratório virtual está Zachary Mainen, da Fundação Champalimaud.

“O IBL é um novo modelo de investigação em neurociências, com investigadores a trabalharem juntos através de uma plataforma aberta para realizar experiências, organizar e processar os dados, permitindo uma colaboração muito mais próxima.” É assim que um comunicado da Fundação Champalimaud define o novo laboratório virtual.

O modelo deste laboratório já vinha explicado na revista Nature em Novembro de 2016, por Zachary Mainen, da Fundação Champalimaud, Michael Haüsser, da University College London (Reino Unido), e Alexandre Pouget, da Universidade de Genebra (Suíça). “Propomos uma estratégia alternativa: colaborações de base que envolvam investigadores distribuídos à volta do globo, mas que já trabalhem nos mesmos problemas”, escreviam na altura. Para isso, os investigadores traçaram uma série de objectivos para uma nova colaboração virtual, como a utilização dos mesmos procedimentos e a investigação de uma única função cerebral.

Qual é então o objectivo deste laboratório? “Construir um modelo computacional de como o cérebro toma uma decisão”, diz ao PÚBLICO, Zachary Mainen. “O que nos interessa é perceber como o cérebro usa informação para decidir que acção deve tomar em qualquer momento”, acrescenta. Andrew Welchman, neurocientista da Wellcome Trust, salienta ainda: “Um obstáculo de longa data na compreensão do cérebro tem sido a questão de captar e de desemaranhar esta actividade.”  

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O investigador Zachary Mainen Gabriela Martins

Para compreender então esta actividade, o modelo animal usado pelos cientistas deste laboratório será o ratinho. Por isso, enquanto este animal desempenhar um certo comportamento, como a melhor forma de conseguir comida, os cientistas irão medir a sua actividade cerebral. Assim, será possível observar os passos dados pelo ratinho até à tomada de decisões.

“Há cerca de mil regiões no cérebro do ratinho e muitas destas nunca foram estudadas em pormenor”, salienta Zachary Mainen, no comunicado. Agora, a dimensão deste laboratório virtual pode vir a tornar isso possível. Kenneth Harris, investigador da University College London, reforça a importância da transformação de vários laboratórios num só. “No passado, os laboratórios de neurociências trabalhavam essencialmente sozinhos e focavam-se nos detalhes do funcionamento de uma única região do cérebro. Mas para perceber como tomamos decisões, precisamos de estudar como todas essas regiões funcionam em conjunto.”

Partilha com toda a comunidade científica

Neste laboratório, trabalhar em conjunto significa utilizar os mesmos procedimentos. Para isso, tal como informa o comunicado, os investigadores usarão “os mesmos equipamentos e condições experimentais idênticas”. Além disso, cada laboratório fará medições em neurónios de várias regiões do cérebro ao mesmo tempo. “Os procedimentos, que serão estandardizados entre os vários grupos, vão permitir a combinação dos dados produzidos e a sua integração numa base de dados unificada”, informa o comunicado.

Serão ainda desenvolvidas novas ferramentas de análise de dados, que serão depois partilhadas com a comunidade científica. “Esperamos que a grande escala de colaboração deste projecto, a sua ênfase na partilha de dados e o seu foco num único comportamento ajudem ao progresso das neurociências, ilustrando a forma como muitos laboratórios podem trabalhar juntos de forma integrada”, considera David Tank, da Universidade de Princeton (Estados Unidos). “Os cientistas do IBL possuem a motivação para construir as ferramentas necessárias que lhes permitam colaborar como nunca nas neurociências. Algo que, do ponto de vista sociológico e psicológico, é totalmente novo nesta área”, conclui Zachary Mainen.

Agora, tal como as redes de neurónios, também este laboratório vai trabalhar em rede. E talvez inspirar outras colaborações do género. 

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