Número de licenciados pelo ensino privado caiu 41% em dez anos

Crise económica, demografia e aumento de oferta pública terão contribuído para a quebra. Menos alunos inscritos no privado há cinco anos resultaram em menos diplomados no ano passado

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Joana Bourgard

As razões para a descida do número de diplomados pelo ensino superior privado nos últimos anos serão várias: menos jovens, mais dificuldades sentidas pelas famílias, quebra de confiança. Em 2015/16, foram entregues 12.210 diplomas a finalistas no ensino privado – menos 1545 do que no ano anterior.

Não se tratará de um fenómeno novo, considera no entanto João Redondo, presidente da Associação Portuguesa de Ensino Superior Privado (APESP), mas da consequência da quebra das entradas a partir do início desta década. “O número de ingressos diminuiu e é essa diminuição que se está a ver agora” no número de saídas de diplomados, explica João Redondo, para quem a crise vivida nas famílias e o facto de haver menos jovens entre a população portuguesa contribuíram bastante para a redução sentida a partir de 2009 ou 2010. 

António Cunha, presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), faz uma leitura semelhante ao associar esta quebra de licenciados à quebra de alunos inscritos em universidades ou politécnicos privados, que se acentuou a partir de 2012. Os números, contudo, começaram a baixar há mais tempo. De acordo com a Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC), e feitas as contas aos últimos dez anos, o privado teve menos 41% de licenciados no ano passado do que em 2005/6 quando tinham sido 20.772.

O universo de estudantes diplomados pelo ensino superior privado cresceu todos os anos, de forma significativa, mas só até 2000/2001. Manteve-se depois acima dos 21 mil até 2003/2004. Mas a partir do ano seguinte, desceu para cerca de 20 mil, ficando depois em cerca de 19 mil, e registando uma queda brusca em 2012/13 quando o total de licenciados pelo ensino privado – universitário ou politécnico – não passou dos 16.778. A descida continuou todos os anos até 2015/2016.

Questão demográfica e a crise

Como explicação, António Cunha salienta igualmente a questão demográfica e admite um efeito relativo da crise sentida nas famílias. Em 2001, havia 1,5 milhão de jovens entre os 15 e os 24 anos; dez anos depois, esse número baixou para 1,1 milhão, segundo o Instituto Nacional de Estatística.O presidente do CRUP e ex-reitor da Universidade do Minho acrescenta um outro factor que relaciona com “uma certa avaliação que os candidatos passaram a fazer relativamente a ter ou não ter um curso superior” e com “um discurso incompreensível de que não haveria vantagem em ter um curso superior”. E contrapõe: “Ter um curso superior é absolutamente essencial.”

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Numa análise retrospectiva da última década, a redução do número de vagas no privado (de cerca de 36 mil em 2005/2006 para cerca de 22 mil no ano passado) foi inversamente proporcional ao crescimento das vagas no ensino superior público: ao fim dos mesmos dez anos passaram de 47 mil a 51 mil.

Estará então a descida dos diplomados no privado relacionada com a maior abertura de vagas no público? "É muito difícil dissociar as duas coisas, mas é evidente que esse não é o factor principal porque o decréscimo das vagas no ensino privado foi muito superior ao crescimento das vagas no público", diz António Cunha. Mais recentemente, o aumento de vagas no ensino público só voltou a ser notado a partir do ano passado depois de quatro anos de quebra e foi "residual". Em 2015, houve mais 133 no público do que em 2014. 

A partir de 2009, também se assistiu a uma descida do número de inscritos no ensino superior público, refere António Cunha, mas a do privado foi “tremendamente mais significativa”. Essa tendência começou a inverter-se no ano passado, quando o número de alunos colocados no ensino superior público beneficiou de um aumento embora ligeiro. Com base nos resultados da 1.ª fase do concurso nacional de acesso deste ano (ainda falta conhecer os resultados da 2.ª fase), entraram quase 45 mil alunos. E este é o número mais alto desde 2010.

Assim cerca de 40% dos jovens entre os 18 e os 20 anos entrou no ensino superior este ano, congratula-se António Cunha. E nota que isso coloca Portugal a caminho de alcançar a meta estabelecida pelo Programa Quadro Europa 20/20 de ter – em 2020 – 40% da população (na faixa etária dos 30 aos 34 anos) com formação superior. A proporção actual em Portugal é de 34% da população nessa faixa etária. No total, entre público e privado, em 2015/2016, foram entregues 73.086 diplomas – ou seja, menos 1671 do que no ano anterior.

Falta de alunos no privado

No ensino superior público houve em 2015/16 uma ligeira redução do total de diplomados (menos 126) relativamente ao ano anterior já que a acentuada descida do número de alunos diplomados nos politécnicos (mais de mil) não chegou a ser totalmente compensada pelo aumento de mais de 950 diplomados nas universidades.

No privado, assistiu-se ao nível máximo da redução há cinco anos, quando de mais de 19 mil diplomados se passou a um número abaixo dos 17 mil. “A falta de alunos levou à impossibilidade de formar turmas e de contratar professores. Nessa fase, houve ajustamentos muito complexos, para instituições de muito pequena escala, com um ou dois cursos", explica João Redondo.

Algumas deixaram de reunir condições, quando passou a ser necessário ter pelo menos um curso de licenciatura e um curso de mestrado, acrescenta. “Agora, já há instituições que estão a crescer, onde são mais os que entram do que os que saem”, refere. Não fala em redução do número de universidades privadas, mas antes em reajustamentos, referindo-se aos estabelecimentos que alteraram os seus projectos, associando-se a outros ou desenvolvendo parcerias. No universo de mais de 80 estabelecimentos de ensino privado, pelo menos quatro decidiram fechar a partir de 2015 por falta de alunos.

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