Lixo e´ a tua tia, pa´!

A Standard & Poor’s não teve outro remédio senão, invejosa da Madonna, deixar-nos entrar no grupo. Agora é aproveitar

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Lili Popper/Unsplash

O funcionamento do mundo dos mercados financeiros tem muito de incompreensível. Sustenta-se em palavreado difícil e muito estrangeiro para dificultar, logo à partida, qualquer tentativa de entendimento. Responde sempre com números, gráficos de setas e probabilidades de risco. E quando usa letras é para definir gavetas onde enfia países consoante o rating que lhes reconhece.

Portugal, por exemplo, andava arrumadito lá num canto da gaveta BB+, até há pouco a Standard & Poor’s (Padrão e Pobre’s, em bom português) nos escolher para ascendermos ao compartimento acima da estante. Saímos do lixo, dizem eles. Por desconhecer em absoluto os bastidores destas agências de notação financeira — para que servem exactamente e, mais perigosamente, o que servem —, estava a sentir muita dificuldade em processar a ideia de uma entidade com o poder de rotular outras entidades mais complexas.

Até me ocorrer que, por sorte, passei muito tempo da minha existência em escolas e dessa dinâmica percebo eu bem. A Standard & Poor’s é a miúda popular finalista encarregue de fazer a selecção de garotos fixes para o seu grupo. Enquanto isso, Portugal é o pré-adolescente preso no mais feroz processo de puberdade, com direito a um violento acne, óculos fundo de garrafa e membros desproporcionais.

Fomos considerados lixo por esta miúda uns seis anos lectivos seguidos enquanto acalentávamos, com uma esperança infinita, poder um dia ter a honra de partilhar a mesma mesa do refeitório ao almoço. Sofremos bullying da escola inteira, em especial de três camafeus grandalhões do 8.º ano que tinham troika como street name. E aguentámos. Acreditámos nos livros de biologia que nos diziam que isto era só uma fase. Havia de passar. E, de repente, as coisas mudaram. Ganhámos os torneios de futebol no recreio. Aniquilámos a concorrência nos concursos de canções inter-escolas. Começámos a tirar boas notas. As borbulhas desapareceram e a nossa beleza começou a ser reconhecida pelos outros alunos.

E, quando demos por ela, nas férias de Verão, apareceu-nos a Madonna com expressivas juras de amor diárias. Chegou o regresso às aulas e Portugal, de repente, é o tipo fixe de blusão de cabedal e cabelo da moda. A Standard & Poor’s não teve outro remédio senão, invejosa da Madonna, deixar-nos entrar no grupo. Agora é aproveitar. Que isto só dura até começar a aparecer-nos a barriga de cerveja.

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