Em Loulé, os caldeireiros estão de volta para ensinar como se faz uma cataplana à algarvia

Uma cataplana em cobre para 100 pessoas levou 14 dias a ser feita. Foi o “rei das marteladas” no Algarve que a malhou.

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Analide do Carmo é o “rei da martelada” no Algarve
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Quantas marteladas são precisas para fazer uma cataplana? “Sei lá, centenas ou milhares”, responde o mestre caldeireiro, Analide do Carmo, em Loulé, acrescentando, com um sorriso maroto: “No Algarve, sou eu o rei da martelada”.

De facto, é ele um dos últimos representantes da comunidade de artesãos que, em Loulé, produzia cataplanas para o país e estrangeiro. A peça continua a ser símbolo da gastronomia regional mas falta quem seja capaz de “fazer uma cataplana à maneira algarvia”, observa. Para começar, a ferramenta: “Não é qualquer martelo que serve, tem de ser polido”. Depois, bem... depois é uma questão de arte e engenho, para lidar com o material e dar-lhe um cunho pessoal.

Analide do Carmo trabalhou 15 anos nas oficinas “Barracha”, em Loulé, numa época em que o ofício tinha muitos seguidores e interessados na aquisição destes produtos. Com a industrialização, o mestre não teve outro recurso que não abandonar a arte e procurar outro modo de vida: “Fui trabalhar para a Cimpor (fábrica do cimento) por causa do dinheirinho”. Após um interregno de 40 anos, já reformado, voltou a “martelar” e a ensinar o ofício.

O município, em colaboração com o projecto TASA — Técnicas Ancestrais, Soluções Actuais — resgatou os saberes das artes artesanais para criar uma oficina de artes de ofícios. As ferramentas, autênticas peças de museu, vieram das antigas oficinas Barracha. Há cerca de dois anos, uma das iniciativas mais marcantes do programa “Loulé Criativo” — que juntou artistas e artesão, portugueses e escoceses, numa residência artística — foi a construção de uma “mesa partilhada” feita pelos participantes. Quando chegou a altura de conceber o tacho para confeccionar o manjar, um dos elementos, Francisco Dias, comentou: “Comigo, na Cimpor, trabalhou um artesão que era verdadeiramente um mestre”. Foi assim que Analide entrou em cena, para ensinar como se fazia o tacho, passando a colaborar com a TASA para não deixar morrer a tradição.

No final do ano passado deu um curso de formação de caldeireiros, para cinco iniciados. “Alguns dos rapazes são jeitosos”, comenta, acrescentando que os alunos passaram a ser seus colegas na oficina que a câmara lhe proporcionou, situada junto ao castelo da cidade. “Passam aqui muitos turistas mas nem todos percebem o que é uma capatlana”. Quando lhes pede 100 euros por uma peça, alguns acham caro. Quando isso acontece, diz: “Vão ali mais à frente, compram por 60 ou 70 euros mas é uma máquina que faz um trabalho.” Qual a diferença? “Só os entendidos detectam os pormenores”, admite. A razão é simples: “As cataplanas produzidas em série são rebatidas para fingir que são artesanais — mas não é a mesma coisa”.

O último desafio feito ao mestre caldeireiro aconteceu no princípio do mês: “É capaz de fazer uma cataplana para 80 ou 100 pessoas?”. Meteu mãos à obra e começou a trabalhar na peça que lhe foi sugerida por João Ministro, da TASA. Ao fim de 14 dias, nasceu a mega cataplana. O chef do Vila Vita, neste domingo, já vai dar a conhecer aos alemães o que é gastronomia algarvia na sua forma original. “Uma peça exclusiva, experimental”, comenta João Ministro, sublinhando que o exemplo deveria replicado para dar sentido e conteúdo à promoção que é feita sobre a região e os seus produtos.      

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