A fita do tempo na Educação — 2016/2017

Alguns dos factos mais relevantes que marcaram um ano letivo relativamente calmo no país.

As aulas terminaram em junho, embora o ano escolar vá até ao último dia deste mês para que, no dia seguinte, tenha início o de 2017/2018. A grande diferença do arranque em setembro de 2016 incidiu na colocação dos professores, merecendo os seguintes comentários:

  • Pela primeira vez, o Ministério da Educação (ME) permitiu oposição a todos os horários (completos e incompletos) identificados pela escolas, pelo que a 1 de setembro os professores puderam preparar as actividades letivas anuais, ao nível do grupo disciplinar e do conselho de turma; por não ser um procedimento normal, quero aqui salientá-lo, embora não tenha sido feita mais que a obrigação de quem tutela esta importante pasta governamental;
  • Não obstante, a lista de colocação, implícita no ponto anterior, foi dada a conhecer nos últimos dias de agosto, ou seja, muito tardiamente para professores que, não podendo ser perspetivados enquanto números, têm de preparar a sua vida, quantas vezes a centenas de quilómetros de sua casa, que percorrem continuadamente durante meses de trabalho e, em muitos casos, obrigados a procurar alojamento, escola para os filhos e a reorganizar as rotinas; presentemente seguimos o mesmo caminho, embora reconheça propósito à desculpa da coexistência de quatro (!) concursos, sendo obrigação ministerial encontrar mecanismos para que estas colocações sejam conhecidas até inícios de agosto. Os docentes são merecedores desse respeito.

Porventura pela novidade aludida no primeiro ponto, o ano letivo decorreu sem grandes sobressaltos, propondo-me nomear alguns factos, dignos de destaque:

Contratos de associação. Pela primeira vez, as turmas de alguns colégios, em início de ciclo, deixaram de ser financiadas; foram várias as manifestações contra esta medida corajosa do Governo, pecando por tardia, e compreendida por quem não aceita desperdícios financeiros da coisa pública; a comprovar o referido, este ano, apesar da continuação desta política, o ruído inexistiu;

Dar voz aos alunos. Iniciativa do ME que se disponibilizou a ouvir alunos, numa conferência onde estiveram presentes dezenas de discentes interessados em opinar sobre matérias fulcrais do seu quotidiano;

Redução do número de alunos por turma. Embora os diretores tivessem solicitado a atribuição de um número de turmas por ano escolaridade (indício de efetiva autonomia), só as turmas das escolas localizadas nos territórios educativos de intervenção prioritária (TEIP) regressam à dimensão que todas tinham antes de 2013; oportunidade perdida para demonstrar confiança nas escolas e em quem as dirige, plasmada num passo medroso e de significado quase residual;

Eleição de directores. Sobretudo entre abril e junho último, a grande maioria dos agrupamentos elegeram os seus líderes ou reconduziram-nos em novo mandato; apresenta-se como um modelo de administração e gestão adequado ao nosso país, e que, também por este motivo, tem contribuído para os excelentes resultados internacionais alcançados (Trends in International Mathematics and Science Study – TIMSS, Programa Internacional de Avaliação de Alunos – PISA);

Aumento do número de atestados médicos. Ao nível do pessoal docente e não docente, tratou-se de um ano letivo em que, muito provavelmente, o número de baixas médicas por depressão foi dos mais elevados, ao ponto de, no início do próximo, os visados não entrarem de imediato ao serviço, por aguardarem convocação para junta médica; pelo disposto, tenho defendido que esta profissão seja reconhecida como de desgaste rápido, inquestionavelmente anormal; os políticos não estariam a fazer qualquer favor, pela justeza do ato, devendo o ME apresentar os números deste flagelo;

I Encontro Nacional de Direções Associativas do Ensino Básico e Secundário. Representantes de diversas associações de estudantes de todo o país reuniram-se em Vila Nova de Gaia e discutiram a sua organização, num patamar mais elevado; podendo influenciar a política educativa, os alunos perceberam que a “união faz a força” e constituíram-se num núcleo como entidade relevante; se os docentes, os diretores e o pessoal não docente já tinham conquistado a sua voz junto da tutela, persistia um vazio que, assim, ficou muito bem colmatado com a formação de uma estrutura estudantil mais reivindicativa e colaborante;

Viagens de finalistas do 12.º ano. Em abril, os alunos finalistas rumaram a Espanha e foram expulsos de uma unidade hoteleira, devido a atitudes alegadamente inapropriadas, provadas através da visualização de escassas fotografias manhosas e questionáveis; parte dos críticos nacionais crucificaram os nossos jovens (estiveram longe de ter um comportamento irrepreensível, note-se!), olvidando que, e uma vez mais, de forma abusiva, a exemplo de outras alturas, o respetivo dono locupletou-se com 50.000 euros, valor das cauções exigidas; para o ano haverá mais?

Orçamento Participativo das Escolas. Salutar iniciativa democrática, “os alunos pensaram, criaram e debateram onde e como quiseram aplicar uma verba, de forma a convertê-la numa mais-valia para a sua escola”. Cada ideia foi votada, e a vencedora mereceu a aplicação do montante, com teto mínimo de 500 euros; é obrigatório repetir este excelente exemplo no próximo ano, confirmativo dos inúmeros exemplos de democracia que reinam nos estabelecimentos de ensino;

Greves dos funcionários e do pessoal dos refeitórios das cantinas concessionadas. O pessoal não docente manifestou profundo desagrado, através da paralisação; a adesão a esta greve não demonstrou a enorme razão que lhes assiste; “pau para toda a colher”, estes briosos profissionais auferem o equivalente ao salário mínimo nacional; escasseando nas escolas, amiudadamente fazem o seu trabalho e o do colega em falta; os 300 contratos atribuídos em novembro — distribuídos por 84 agrupamentos — souberam a muito pouco, pois as necessidades são de maior monta; anunciada, estes dias, a contratação de mais 250 assistentes operacionais, a grande expetativa está agora na atualização/revisão da portaria de rácios, pois deverá traduzir-se num passo decisivo na resolução de um problema persistente no sistema educativo; o procedimento concursal é da responsabilidade das escolas, o que se saúda;

Greve aos exames. Esvaziada pelo recurso aos serviços mínimos — “arma” aprovada na governação de Passos Coelho —, e da discordância de muitos professores que sentiram o movimento sindical apático e medroso; alguns sindicatos, ao querer procurar redimir-se, incorreram em tamanho erro estratégico, resultando num tiro com pólvora seca; escreveram torto por linhas tortas;

Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar. Em 2016/2017, a totalidade dos recursos humanos pedidos pelas escolas (no âmbito do Plano de Ação Estratégica) tardaram em chegar; no próximo ano letivo prevê-se que estes sejam alocados logo no primeiro dia de setembro; o programa em causa contribuirá para o aumento do sucesso escolar e os seus benefícios far-se-ão sentir a médio prazo, e já em 2017/2018 no 2.º ano de escolaridade, pois diversas escolas direcionaram as suas estratégias para os alunos nos primeiros anos de aprendizagem;

Provas de aferição. Alargadas a todos os estabelecimentos de ensino, decorreram às disciplinas do 2.º e a algumas do 5.º e 8.º anos de escolaridade; a novidade foi a realização às disciplinas de Expressões Artísticas e Expressões Físico-Motoras que, não só colocaram em foco a escassez de material específico nos estabelecimentos de ensino do 1.º ciclo para estas áreas do currículo, como também salientaram o excelente trabalho realizado nas escolas; com os apoios das autarquias, das associações de pais e outras entidades colaborantes, nada faltou para a realização dos exercícios em avaliação; no entanto, percebeu-se da necessidade em dotar estas escolas de material próprio, para a prática rotineira, durante os períodos letivos;

Autonomia envergonhada. Um despacho conhecido recentemente admite a possibilidade da renovação dos contratos de formadores e técnicos especializados que no ano letivo 2016/2017 tiveram horário anual e completo, caso persista essa necessidade; medida meritória e inédita, colocará estes profissionais nas escolas a 1 de setembro, aconselhando-se o seu alargamento ao pessoal docente, ganhando, deste modo, as escolas maior e efetiva autonomia na gestão dos recursos humanos;

Colocação de 200 psicólogos. Anunciada a contratação de mais psicólogos, as comunidades educativas agradecem este investimento, aproximando o respetivo rácio da média europeia; trata-se de técnicos especializados e as suas funções afiguram-se já imprescindíveis em qualquer estabelecimento de ensino, sendo-lhes reconhecidas competências essenciais, também na promoção do sucesso escolar e na diminuição do absentismo e abandono;

Surto de sarampo. As escolas deram uma resposta muito positiva a um problema em que foram apupados os denominados defensores antivacinas mas, na realidade, não se lhes conheceram o rosto, pelo menos o de um líder deste alegado movimento; julgando lutar contra moinhos de vento, e acautelando a preocupação generalizada, o Ministério da Educação e a Direção-Geral da Saúde souberam gerir diligentemente a propagação de uma doença, comumente considerada ter sido já erradicada;

Municipalização da Educação. Tema debatido em alguns fóruns, será a grande novidade após eleições autárquicas, geradora de legítima desconfiança nas escolas e nos seus diretores; se municipalizar for sinónimo de perder, ainda mais, a escassa autonomia que as escolas detêm, então não, obrigado!; se significar a atribuição de efetiva autonomia através da passagem de competências/funções da tutela diretamente para as escolas, estas sentirão a sua ação reconhecida, para se motivarem ainda mais;

Projeto Autonomia e Flexibilidade Curricular. 236 agrupamentos piloto vão decidir o quê e como vão ensinar os alunos; trata-se de uma experiência pedagógica envolvendo escolas da rede pública e privada que terão autonomia na gestão curricular; a adesão à iniciativa atingiu relevância digna de nota, motivadora para o acompanhamento a realizar por diversas direções gerais do ME, tendo como objetivo a sua disseminação a todas as escolas do país a partir do ano letivo 2018/2019;

Divulgação da estrutura do exame do 12.º ano de Português. Um ficheiro áudio que revelava informações sobre a prova de Português, difundido antes da aplicação dessa, levantou dúvidas sobre o secretismo dos exames nacionais; aparentemente invioláveis e guardados a sete chaves, a desconfiança em quem as elabora veio à tona, tendo sido decidida, atentas as circunstâncias e o apurado, a manutenção da validade das provas realizadas, aguardando-se conclusões;

Moradas falsas. Tema recorrente, ampliado em julho por ser mais notório em algumas escolas da capital; a facilidade com que se delega a função de encarregado de educação é questionável, necessitando de uma solução mais profunda, impossível de realizar nesta ocasião; contudo, e no imediato, conferir a solenidade a um ato tão importante como o subjacente à delegação em causa resolveria a maior parte das situações, resistindo um número residual de casos solucionados com o critério da morada fiscal da criança/aluno, conjugado com a morada fiscal do Cartão de Cidadão;

Novo diploma da Educação Especial. O aumento descontrolado do número de alunos identificados com Necessidades Educativas Especiais (só este ano contabilizou 4441 novas elegibilidades!), em contraciclo com o decréscimo do número global de discentes, leva-me a pensar que algumas sinalizações (devidas a problemas de comportamento, dificuldades transitórias de aprendizagem...) possam estar a ser (mal) encaminhadas para a Educação Especial. Por conseguinte, a proposta de alteração (Regime legal da inclusão escolar) do Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro, submete-se à participação através de auscultação pública, até final do próximo mês.

Outros factos marcaram um ano letivo relativamente calmo, sendo obrigação de todos os envolvidos perceber o positivo e, sobretudo, propor alteração de decisões indiciadoras de percursos erróneos e, por isso, merecedores de correção.

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

 

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