SNC-AP: tornar o bom amigo do ótimo

O novo sistema contabilístico para as administrações públicas é um passo em frente no aumento da transparência, uniformização e rigor das contas públicas em Portugal.

Agora que nos aproximamos rapidamente do dia 1 de janeiro de 2018, data de entrada em vigor do novo sistema contabilístico para as administrações públicas (SNC-AP), voltam a surgir, à semelhança do ano passado, algumas vozes divergentes sobre todo o processo de implementação. A dissonância resulta da falta de coordenação global dos vários stakeholders, da experiência incipiente das entidades-piloto e do atraso evidente na preparação das demonstrações financeiras de abertura do novo exercício em SNC-AP.

Tudo isto é verdade e podíamos ainda acrescentar o atraso na concretização da ECE (Entidade Contabilística do Estado), que é uma peça-chave em todo este processo de reforma, pelo modo como prevê consolidar elementos materialmente relevantes. São exemplos desses elementos a receita fiscal, a dívida fiscal não paga e a dívida direta do Estado, que ainda hoje não vemos refletidos em nenhuma demonstração financeira consolidada do Estado.

Infelizmente, se impusermos como condições mínimas de arranque de um sistema desta envergadura as condições ótimas, então dificilmente o SNC-AP verá a luz do dia. O caminho faz-se caminhando e é essencial, nesta fase, percebermos se os ganhos obtidos pela sua implementação imediata, particularmente ao nível da gestão orçamental, compensam alguma falta de rigor na preparação do balanço de abertura e na aplicação da nova estrutura concetual. Esta compensação deve ser analisada independentemente de esta nova estrutura representar um passo em frente relativamente aos planos setoriais anteriores e de o fazer sem ferir o essencial, que é manter a ambição inovadora de juntar num único modelo uma resposta coerente às dimensões contabilísticas orçamental, financeira e de gestão.

Vejamos muito rapidamente apenas alguns pontos da norma NCP 26 que, na minha opinião, justificam a aplicação imediata do normativo:

  • Normalização dos vários planos setoriais;
  • Concentração na classe 0 de toda a movimentação contabilística orçamental;
  • Eliminação de contas de passagem, ou seja, os saldos de todas as contas orçamentais passam a ter informação relevante e com significado para o utilizador;
  • Reflexão na contabilidade digráfica de todas as fases de execução orçamental e atribuição de contas específicas para cada uma das colunas dos mapas de relato orçamental;
  • Nova fase de obrigação orçamental.

Ainda que não estejam reunidas as condições ideais para a implementação plena do SNC-AP, este modelo representará sempre um passo em frente no aumento da transparência, uniformização e rigor das contas públicas em Portugal.

É preciso avançar. E, para tal, é mesmo preciso que o bom se torne amigo do ótimo, pois só atingindo esse primeiro patamar é que se poderá atuar, corrigir e formar. Só dando este passo de forma firme se poderá fazer evoluir o sistema até ao patamar de exigência pretendido. Não vamos protelar mais. Os contribuintes merecem este rigor!

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

 

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