O que (não) sabemos sobre a geração milenar

Os millennials não são assim tão diferentes da geração X (os seus antecessores) quando tinham a mesma idade

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Nem tanto ao mar nem tanto à terra. Esta poderia ser a expressão que, à boa maneira portuguesa, caracteriza o debate em torno dos millennials (milenares, à portuguesa, ou geração Y). A ideia de que esta geração é muito diferente das gerações anteriores e, por isso, exige uma completa revolução nos princípios de gestão de pessoas, está longe de ser verdade. Isto porque não existem bases factuais suficientes para suportar esta ideia. Aliás, as evidências apontam o contrário: os millennials não são assim tão diferentes da geração X (os seus antecessores) quando tinham a mesma idade.

Mas vamos por partes. Uma falácia do entusiasmo com as questões geracionais prende-se com a suposta homogeneidade geracional. Os millennials são a última geração nascida no século XX — daí o nome milenar —, entre 1980 e 1999. Estamos a falar de indivíduos que, em 2017, têm entre 18 e 37 anos. Com esta amplitude de idades, não é difícil perceber que esta geração é, tal como outras, suficientemente diversificada. De tal forma que, caracterizar uma geração como um aglomerado de pessoas semelhantes, que caracterizando uma caracterizam-se todas, exige um salto de lógica pouco honesto intelectualmente.

Por isso, defendo que os millennials encerram diferenças entre si que não podem ser ignoradas. Os indivíduos mais novos desta geração (digamos com 18 a 27 anos), os late millennials, serão diferentes em alguns aspectos dos indivíduos com 28 a 37 anos, os early millennials. Por exemplo, os late millennials, não sendo uma geração touch native fez boa parte da sua adolescência e juventude em contacto com os smartphones e tablets. Já os early millennials ainda se lembrarão de usar os telemóveis que não eram assim tão smart.

Corroborando a tese de Thomas L. Friedman, apresentada no seu último livro "Obrigado pelo atraso", 2007 foi o ano da viragem no que diz respeito às tecnologias. Este ano marca o surgimento do Facebook, do iPhone e de outras tecnologias que mudaram de forma indelével o contexto em que vivemos. Em 2007, os early millennials tinham entre 18 e 27 anos, ao passo que os late millennials tinham entre 8 e 17 anos. Ou seja, os primeiros eram já adultos ao passo que os segundos estavam ainda na adolescência e juventude, tendo assimilado de outra forma as novidades tecnológicas.

Outra falácia das constatações sobre as diferenças geracionais, nomeadamente entre os millennials e os "outros", é a facilidade com que se estereotipa os millennials. Basta folhear (ou googlar) a comunicação social e perceber que, de preguiçosos a insatisfeitos, não faltam adjectivos para os caracterizar. No contexto organizacional também existem alguns estereótipos ready-to-use. O problema dos estereótipos é que, muito raramente, têm algum tipo de fundamento.

Por exemplo, é comum ouvir os gestores comentarem o comportamento errante dos millennials, saltando de emprego em emprego, não apostando seriamente em construir uma carreira numa empresa. Mas o job-hopping não é uma característica exclusiva dos millennials, e está longe de ser uma realidade. Um estudo da Resolution Foundation, um think tank britânico, conclui que apenas 1 em cada 25 jovens tinha trocado de emprego no último ano. Outro estudo, nos Estados Unidos, conduzido pelo Pew Research Center, reporta que os millennials não estão a mudar de emprego a um ritmo superior aos seus antecessores, a geração X (1964-1979).

Em Portugal, o estudo "Millennials in Transition (MiT)" conduzido pelo centro de investigação REMIT/Universidade Portucalense, junto de estudantes finalistas de licenciatura demonstra igualmente que cerca de metade dos inquiridos espera ter não mais que três empregos ao longo da sua carreira. O rótulo de geração instável, sempre a mudar de emprego, não se coaduna com as intenções e ainda menos com os factos. Dir-se-á que esta geração parece ser adepta da mudança e desprendida ao ponto de mudar de emprego e até de país. Provavelmente o problema desta tese estará na ordem dos factores (será que eles mudam porque são assim ou será a realidade que os faz mudar?), mas isso daria outra conversa...

Então, as diferenças geracionais devem ser ignoradas porque, na realidade, não existem? Não. De todo. As gerações são ainda um instrumento importantíssimo para analisarmos e explicarmos as diferenças e evoluções comportamentais em inúmeras dimensões da vida social (entre estas as organizações). É importante, contudo, identificar bem quais são as verdadeiras diferenças e não cair no engodo fácil e atractivo dos estereótipos, chavões e verdades absolutas. 

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