Juros da casa em queda graças ao BCE

Valor negativo das taxas já anula os spreads até 0,30% e 0,25% nos contratos à Euribor a três e seis meses. Bancos continuam “protegidos” em relação ao pagamento de capital.

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Taxas de juro em valores negativos aliviam custo do empréstimo da casa. Paulo Pimenta

As taxas Euribor, que estão na base da larga maioria dos empréstimos à habitação, agravaram esta sexta-feira os valores negativos em que se encontram, o que se vai traduzir no pagamento de menos juros por parte das famílias em boa parte dos contratos. O responsável por este comportamento é o Banco Central Europeu (BCE), que esta quinta-feira anunciou a manutenção das taxas de juro e do programa de compra de activos.

A ajudar a que as taxas fixadas diariamente no mercado interbancário reforcem os actuais valores negativos, reflectindo a expectativa de um número elevado de bancos de que as taxas de juro na zona euro permanecerão negativas durante um período longo de tempo, esteve a revisão em baixa das previsões do BCE para a inflação.

Ainda afastada do objectivo de médio prazo para a inflação, que é de 2%, o BCE manteve a projecção de 1,5% para o corrente ano, mas baixou de 1,3% para 1,2% em 2018 e de 1,6% para 1,5% em 2019.

Este cenário, que, no entanto, é “ensombrado” pela apreciação do euro, com impacto negativo no crescimento da economia, e que é também uma preocupação do BCE, conduziu a Euribor a três meses (negativa desde Abril de 2015) para -0,331%, mais 0,001 pontos negativos do que na sessão anterior (e face ao mínimo histórico de -0,332%, que data de 10 de Abril).

Não é expectável que as taxas Euribor possam descer muito mais, mas reforçam o horizonte de sua manutenção em valores historicamente baixos. 

O actual valor negativo anula spreads (margem comercial dos bancos) até 0,30% e até já daria lugar ao pagamento de capital, se o PS e o Banco de Portugal não tivessem travado essa possibilidade no Parlamento.

A Euribor a seis meses, a que estão associados boa parte dos contratos existentes, fixou-se em -0,275%, o valor mais negativo de sempre. Também aqui, o spread de 0,25% já foi anulado, o que significa que os empréstimos abrangidos já na pagam juros, reembolsando apenas capital.

O prazo de 12 meses, a taxa maioritariamente utilizada nos contratos mais recentes, fixou-se em -0,166%, um agravamento de valor negativo em 0,004 pontos face ao anterior.

A crescente evolução negativa das taxas Euribor reduz o pagamento de juros na maioria dos contratos e anula esse pagamento nos que têm spreads muito baixos. O reflexo desta queda é parcialmente anulado, uma vez que a descida da componente com juros é compensada por um aumento da amortização de capital, o que é positivo para os particulares, por reduzir mais rapidamente o capital em dívida.

O reflexo integral da taxa Euribor, como começou por defender o Banco de Portugal, levaria os bancos a, depois de anulado o spread, pagar parte do capital aos clientes. Recorde-se que a instituição liderada por Carlos Costa expressou, em carta-circular, o entendimento de que nos contratos de crédito existentes, “não podem ser introduzidos limites à variação do indexante [Euribor] que impeçam a plena produção dos efeitos decorrentes da aplicação desta regra geral”.

Os bancos não acataram este entendimento, o que levou o grupo parlamentar do PS, no arranque de 2016, a apresentar um projecto de lei com vista a obrigar os bancos a reflectir o valor negativo da Euribor, iniciativa que contou com o apoio do PCP e BE.

Este projecto acabou por ser travado pelo Governador do Banco de Portugal, ao lembrar que os particulares também não pagam para depositar dinheiro nos bancos. As declarações de Carlos Costa foram entendidas como uma ameaça e ainda hoje o projecto de lei continua na “gaveta”.  

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