A revelhação do PSD

Eu não tenho nada contra renovar o PSD. Mas se é para revelhar mais vale deixar assim.

A morte política de Pedro Passos Coelho é um tema recorrente, que entretém jornalistas e alimenta conspirações há já muitos meses, por razões bastante compreensíveis: o famoso diabo não veio, António Costa parece estar de pedra e cal em São Bento, ninguém vê como as autárquicas possam correr bem ao PSD, as manifestações de desagrado interno acumulam-se nas páginas dos jornais e o discurso de Passos Coelho é visto como enclausurado num passado ao qual ninguém quer regressar. Tudo isto está certíssimo. Mas depois vem a terrível questão: saindo Pedro Passos Coelho, quem é que fica com o seu lugar?

A resposta a esta pergunta é um enorme ponto de interrogação. Todos os que aspiram à liderança social-democrata são figuras tão desgastadas quanto ele, e os poucos que não estão tão desgastados ou não querem o seu lugar, ou não têm peso suficiente no partido para ficarem com ele. A tão badalada renovação do PSD é apenas uma revelhação. A oposição mais consistente a Passos oriunda da área social-democrata é aquela que nos meios de comunicação social é liderada por Manuela Ferreira Leite ou por Pacheco Pereira. E que, nos bastidores do partido, é alimentada por Nuno Morais Sarmento ou por Rui Rio. Mas isso seria como substituir um prato que já está frio por comida congelada. E não é apenas congelada por essas figuras terem um passado de pior memória do que o de Passos — o caso de Morais Sarmento é o mais evidente, mas qualquer figura que tenha circulado pelos tristes governos de Durão Barroso e Santana Lopes não pode agora apresentar-se fresco que nem uma alface diante dos eleitores. É também comida congelada no sentido em que a área da social-democracia representada por Ferreira Leite, Pacheco Pereira ou Rui Rio é oriunda do velho centrão despesista, dependente e excessivamente estatizado, muito mais próximo do pensamento de António Costa do que do de Passos Coelho.

A consequência dessa opção política seria um estreitamento do espaço ideológico dos principais partidos portugueses, que iria desguarnecer excessivamente a direita do PSD — entendendo eu aqui por direita do PSD o espaço liberal, e não o espaço conservador ocupado pelo CDS. Pedro Passos Coelho é acusado, e bem, de não estar a fazer uma oposição suficientemente eficaz a António Costa. Mas dificilmente a solução para essa falta de eficácia passará, num país que está neste momento muito polarizado pela opção do primeiro-ministro em se aliar à esquerda, por uma aproximação ao centro. Aquilo de que o PSD menos precisa é de um António Costa light, à semelhança de Rui Rio. Precisa, isso sim, de alguém que, substituindo Passos Coelho, mantenha um discurso de rigor nas contas públicas, de contenção da dimensão do Estado, de valorização da iniciativa privada e de denúncia incansável da patranha do fim da austeridade. Costa substituiu o velho discurso da tanga por um discurso-tanga turbinado por um optimismo que a médio prazo só vai prejudicar o país, criando-lhe falsas ilusões. Aquilo de que menos precisamos é do maior partido da oposição a alimentar os delírios despesistas que começam a ressurgir um pouco por todo o lado.

Passos Coelho está muito desgastado, sem dúvida, mas a base do seu discurso continua tão actual em 2017 como em 2011. O problema do seu afastamento é não se vislumbrar no PSD um único sucessor capaz de manter o partido no espaço político que neste momento ele ocupa. Eu não tenho nada contra renovar o PSD. Mas se é para revelhar mais vale deixar assim.

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