Aquiles tinha 22 anos quando comprou a empresa fundada pelo bisavô: a Ach. Brito

É a quarta geração na Ach. Brito, cujo portefólio de produtos-marca inclui a Musgo Real e a Claus Porto. O negócio não lhe saiu na herança – comprou ao resto da família uma empresa à beira da falência, que hoje está numa rota de crescimento.

"Foi um acto de paixão", confessa Aquiles de Brito, reflectindo a decisão que tomou em 1994. Junto com a irmã comprou a maioria do negócio de família, Ach. Brito – que inclui as marcas de sabonetes e outros produtos de beleza Claus Porto e Musgo Real –, ao tio. Assim, com apenas 22 anos “herdou” uma empresa que, apesar de bem cheirosa, passava por uma fase complicada.

Aquiles e Sónia reescreveram a narrativa da Ach. Brito e Claus Porto. Em vez de sabonetes mais acessíveis, focaram-se na na produção de produtos premium. “A estratégia foi tentar valorizar aquilo que tínhamos – a nossa historia”, recorda Aquiles, em entrevista ao Life&Style. Hoje é o único membro da família dentro da empresa, sendo que o controlo passou em 2015 para um grupo de investidores. 

Foi há 130 anos que os alemães radicados em Portugal, Ferdinand Claus e George Schweder, criaram a original fábrica de sabonetes, no Porto. O bisavô de Aquiles e Sónia, Achilles de Brito, entrou na empresa em 1903 – na altura, como guarda-livros. O nome, apesar de adaptado ao português moderno, mantém-se vivo também nos dois filhos de Aquiles, Aquiles Gustavo e Aquiles Afonso. Em 1925, o bisavô adquiriu a Claus & Schweder, através da sua firma Ach. Brito – tomando controlo inclusive da fábrica e equipamentos. Os sócios originais tinham voltado para a Alemanha anos antes, com o rebentar da Primeira Guerra.

Os produtos da Ach. Brito e Claus Porto passaram a conviver sob o guarda-chuva da empresa de Achilles de Brito, que viu na década de 1950 os seus anos de ouro – já com o filho de Achilles ao leme. Em 1953, chegaram inclusive a criar um estúdio litográfico próprio, onde eram desenhados à mão e impressos em larga escala os artísticos rótulos dos sabonetes. Aquiles conta que, tal como o bisavô, também o avô era “dinâmico e empreendedor”, mas que acabou por perder alguma energia depois do 25 de Abril de 1974, quando parte dos negócios de família foram nacionalizados. Foi também a década que viu a entrada no mercado português de inúmeras marcas internacionais que vieram competir com as portuguesas. A terceira geração tomou as rédeas de uma empresa já “parada no tempo”, intervindo, essencialmente no controlo de danos. 

Quarta Geração

Quando a empresa passou para as mãos da quarta geração, Aquiles tinha apenas 22 anos e Sónia 24. “Foi o meu primeiro emprego”, confirma o empresário, entre risos. A decisão de comprar a participação do tio foi mais  emocional do que racional, confessa.

A Ach. Brito estava parada no tempo e à margem das cadeias modernas de distribuição. Tinha uma rede de distribuição antiquada, virada para o pequeno comércio e drogarias, numa altura em que o mercado estava em  grande transformação. A parceria que criaram com o agente fundador da distribuidora americana Lafco, Jon Bresler, no início da década de 1990, foi um momento-chave, que acabou por definir o posicionamento da marca num segmento superior — primeiro em mercados externos e eventualmente, anos depois, também em Portugal.

O agente americano estava à procura de “algo europeu com história e autenticidade”, conta Aquiles. Queria “pegar no acervo histórico” da Claus Porto e recuperar alguns dos rótulos antigos — ao que o empresário respondeu “'vamos em frente”. “No fundo, [quis] reeditar a Claus Porto”, apostando nos produtos vintage, fabricados à mão e embalados com autênticas obras de arte. Entre 1995 e 1996 os produtos da Claus Porto tinham lugar em lojas da Quinta Avenida, em Nova Iorque, no Harrods e na Fashion Clinic, conta. Em Portugal, continuaram durante muitos anos a distribuir unicamente uma gama mais baixa, da Ach. Brito. Chegaram a aparecer no programa da Oprah Winfrey — algo que gerou um enorme volume de encomendas, para o qual não estavam prontos. A empresa — que suportava uma pesada estrutura de 120 trabalhadores — “precisava disso para pagar as contas”, justifica o empresário.

É preciso ter em conta que, apesar da aposta na marca Claus Porto e nos produtos de valor acrescentado, a empresa “tinha uma estrutura e indústria vocacionadas para larga escala e mercado nacional”. Ainda hoje, a marca divide-se entre o mercado de massas, com produtos mais acessíveis, e de gama superior, com os produtos artesanais da Claus Porto.

Aquiles garante que, na década de 1990, foram “contra toda a corrente que existia [em Portugal]”, ao apostar na marca em vez de na produção. “Com uma indústria têxtil fortíssima e sapatos, não houve a preocupação de  criar uma marca”, contempla com estranheza.

Mercado de nostalgia

A realidade do mercado em Portugal é hoje bem diferente. Não restam dúvidas de que existe procura de produtos portugueses com história — e o sucesso da cadeia de lojas A Vida Portuguesa, fundada em 2007, por Catarina Portas, prova-o. A Ach. Brito é, aliás, uma das accionistas da loja do Porto. A relação simbiótica entre as duas entidades já vem de trás: “[a Catarina Portas] sempre disse que quando abrisse uma loja no Porto queria que fosse com a Ach. Brito”, conta Aquiles.

A Claus Porto parece estar melhor do que nunca, com a abertura das duas primeiras lojas próprias em Portugal. No final de 2016 abriram portas em Lisboa e no início do Verão inauguraram uma loja-museu, no centro do Porto. “[Ambas] estão a correr muito bem”, comenta Aquiles, confessando este sempre foi um dos seus sonhos para a marca.

O plano de seis anos da Claus Porto pretende aumentar as vendas da marca no estrangeiro — expandindo, inclusive, para venda directa nos Estados Unidos. De acordo com a empresa, o plano representa um investimento de 5 milhões de euros. Actualmente, a Claus Porto está presente em 60 países, em armazéns como a Bergdorf Goodman, Neiman Marcus, Harrodds, Galeries Laffayette e Le Bon Marché.

Em 2015 foi procurar investidores, para “dar outro dinamismo à marca” e ajudá-la a ganhar escala. Não foi a primeira entrada de capital — sendo que em 2008, com a entrada de investidores, conseguiram adquirir uma das principais concorrentes, a Confiança —, mas desta vez deixou de ser Aquiles o accionista principal. Permanece como “segundo accionista da empresa” e mantem-se ligado à administração.” A irmã, entretanto, já saiu há alguns anos — tendo a sua participação, na altura, sido comprada pelo irmão.

De certa forma, o empresário de quarta geração sentiu que o seu papel na empresa estava cumprido: “ao longo da história toda da empresa terei passado a fase mais difícil e consegui dar a volta”. “Temos de questionar todos os dias o que estamos a fazer achei que era o momento certo porque os negócios fazem-se quando se está bem e não quando se está mal”, defende. “Claro que às vezes a pessoa sente alguma nostalgia. Só o futuro dirá [se foi a decisão certa]. Se tivesse continuasse sozinho também podia arrepender-me de não ter feito determinada decisão”.

Apesar de algumas empresas se terem perdido no pós 25 de Abril, o empresário mantém-se ligado a negócios de família como a Predial Ferreira & Filhos e a lindíssima Quinta nos Frades, que produz vinho de mesa, no Douro, e vende Vinho do Porto em lote para a Symington. “Sinto-me de consciência tranquila com os meus antepassados”, desabafa o empresário.

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