Comunidade, infância e família nos palcos do Teatro Nacional São João

Teatro Nacional portuense apresentou programação para o quadrimestre Setembro-Dezembro.

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Retrato de Família DR
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Exposição de cartazes do Teatro Carlos Alberto DR
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Ocupação - Días Hábiles DR
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Phobos DR

Vinte produções, que incluem meia dúzia de estreias e o regresso de criações internacionais, fazem o calendário dos vários palcos do Teatro Nacional São João (TNSJ) no regresso à actividade após as férias, e até ao final do ano. A relação com a comunidade, a família e a infância são temas denominadores comuns do programa, que foi divulgado esta quinta-feira no Porto.

O palco escolhido para a apresentação da programação para o quadrimestre Setembro-Dezembro foi o Teatro Carlos Alberto (TeCA), sala que desde 2003, e após a sua remodelação mais recente (com assinatura do arquitecto Nuno Lacerda Lopes), integra os equipamentos do teatro nacional portuense. Uma escolha que não foi ao acaso, antes motivada pelo facto de esta casa de espectáculos assinalar este ano o seu 120.º aniversário.

Inaugurado a 14 de Outubro de 1897, por iniciativa do empresário Manuel da Silva Neves, o Teatro Carlos Alberto tornou-se o teatro popular da cidade, acolhendo teatro, circo, operetas, espectáculos de zarzuela e, depois, também cinema.

A assinalar também o aniversário, o TeCA expõe, até 30 de Setembro, Teatro de rua, uma selecção de cartazes que documenta o capítulo mais recente da sua história. “É interessante ver a quantidade de coisas que aí acontecem: teatro de reportório, teatro estrangeiro, marionetas, dança, música, um imenso elenco de criadores, o que mostra não existir qualquer hierarquização de qualidade em relação ao palco do São João”, comenta, em declarações ao PÚBLICO, Nuno Carinhas, director artístico do TNSJ, referindo-se à actividade do novo Carlos Alberto.

Ainda no programa do 120.º aniversário, realiza-se este sábado, às 15h00, uma visita aos bastidores do teatro guiada pelo arquitecto Nuno Lacerda Lopes.

O TeCA vai, de resto, ser o palco com que o TNSJ se associa à 4.ª edição do MEXE – Encontro Internacional de Arte e Comunidade (18 a 24 de Setembro). Cidade – Corpo colectivo é o tema da edição deste ano de um programa promovido pela associação Pele e dirigido por Hugo Cruz. Reunindo produções teatrais internacionais, cinema, workshops e um Encontro Internacional de Reflexão sobre Práticas Artísticas Comunitárias, o MEXE corporiza aquilo que Nuno Carinhas identifica como “uma abertura à cidade e ao teatro da comunidade”, que permanece uma das linhas identitárias do TNSJ. “E não deixa de ser uma curiosidade interessante que, por simples acaso, porque este programa já estava agendado há muito tempo, ele vá decorrer em época de campanha eleitoral autárquica, momento especialmente oportuno para debater a cidade e o papel do teatro na comunidade”, nota o director artístico e encenador.

Retratos de família

Nuno Carinhas acrescenta a família e a infância como os outros dois temas dominantes na programação do primeiro quadrimestre da nova temporada. E destaca nela uma das estreias anunciadas, Retrato de Família (TeCA, 12 de Outubro), uma encenação de Manuel Tur (e co-produção com A Turma), que tem por base os textos O Pelicano, de Strindberg, e Tatuagem, de Dea Loher – “duas obras que distam quase um século e nos lançam no epicentro de redutos familiares que, em vez de se oferecerem como lugares de afectividade e segurança, se revelam opressivos espaços de enclausuramento”, escreve o director artístico no comunicado da programação.

É também no eixo temático da família que Carinhas arruma as produções Quem Tem Medo de Virgínia Woolf (TNSJ, 14 de Setembro), Email (desta tua mãe que tanto te ama) (Mosteiro São Bento da Vitória, 20 de Outubro) e A Promessa (TNSJ, 16 de Novembro). A primeira é uma nova versão do clássico de Edward Albee, com encenação (e interpretação) de Diogo Infante, que, tendo-se estreado em Abril em Lisboa, percorre agora o país em digressão, tendo a particularidade de fazer regressar ao São João a actriz Alexandra Lencastre – que, anteriormente, lembra Carinhas, só tinha pisado o palco da Praça da Batalha em 1994, com a peça O Tempo e o Quarto, de Botho Strauss, numa encenação de João Lourenço.

E o director do TNSJ assinala aqui uma espécie de “rima” com a nova produção do Ensemble, A Grande Vaga de Frio, que Luísa Costa Gomes adaptou a partir de Orlando, de Virginia Woolf, peça para a voz e o corpo de Emília Silvestre, numa encenação de Carlos Pimenta – a estreia acontecerá em Lisboa (CCB, 12 de Outubro), chegando ao TeCA, a 10 de Novembro.

Monólogo para uma actriz (Anabela Faustino) é também Email, reposição de um texto de Jacinto Lucas Pires, uma “comédia agridoce”, carta de amor de uma mãe a um filho morto, estreado em 2015 em Estarreja.

A 16 de Novembro, chega ao palco do São João um dos acontecimentos deste início de temporada, a reencenação portuense de A Promessa, de Bernardo Santareno, que teve estreia na cidade em 1957, pela mão de António Pedro e do seu Teatro Experimental do Porto (TEP).

“Convidei o João Cardoso, e ele propôs-me o Bernardo Santareno; achei um desafio corajoso, uma proposta irrecusável”, diz Carinhas, lembrando a importância deste autor, que vê como “um dos dramaturgos modernistas mais importantes, com o seu teatro sacrificial”. O próprio director do TNSJ vai fazer o desenho de luz para esta peça, que, aquando da estreia, motivou reacções pelo seu “ambiente de religiosidade erótica”, “reparo que deveríamos tomar hoje como um elogio”, defende Carinhas.

Regresso do musical

A pensar no imaginário da infância, está a reposição de (TNSJ, 13 de Dezembro), um musical com encenação de Nuno Carinhas, texto de Regina Guimarães e música dos Clã, que esgotou o TeCA durante mais de três semanas em Janeiro deste ano. “É um regresso muito pedido; foi uma produção muito feliz, e arriscamos este salto para uma sala maior”, diz o director sobre a transposição de para o palco do São João.

Também na expectativa de voltar a “maravilhar meninos e sisudos senhores grandes”, José Caldas retoma um seu espectáculo de 1979, Ou Isto ou Aquilo, um recital de poesia (de Cecília Meireles) e música (de Luís Pedro Fonseca), com a participação de Lena d’Água.

Novidade neste calendário do TNSJ é o regresso de produções internacionais, no âmbito do vínculo do teatro nacional portuense com a União dos Teatros da Europa (UTE). O Mal-Entendido (TNSJ, 19 de Outubro), uma versão para marionetas da peça homónima de Albert Camus, uma tragédia moderna sobre o tema do filho pródigo, chega da Áustria, numa produção da Schauspielhaus Graz, com encenação de Nikolaus Habjan.

Este O Mal-Entendido surge no meio do acolhimento que o TNSJ faz de duas produções do Festival Internacional de Marionetas do Porto (13 a 29 de Outubro), com a co-produção com o Teatro de Ferro, Marionetas Tradicionais de um País que Não Existe, história de “um ataque amorista” encenada por Igor Gandra; e Phobos (MSBV, 18 de Outubro), uma criação de Gustavo Costa, crítica ao universo impessoal das novas tecnologias vistas como uma Orquestra Robótica Disfuncional.

Entre as outras propostas dos vários palcos do TNSJ até ao Natal, assinale-se ainda a parceria com Serralves no acolhimento de uma das criações da coreógrafa suíça Alexandra Bachzetsis, Private Song (TNSJ, 13 de Outubro), um dia depois de o auditório da fundação receber Private: Wear a mask when you talk to me, duas maneiras de questionar a relação do espectador com os corpos em movimento no palco.

E já na próxima semana (MSBV, 16 de Setembro) começa a mostra Ocupação – Días Hábiles, dirigida por Alfredo Martins: são dois espectáculos, um filme documental (Manoel Congo) e duas oficinas sobre o tema da imigração e a crise dos refugiados, a partir da viagem e da residência que Martins e Rui Santos fizeram à América do Sul.

 

 

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