Câmara de Lisboa tenta anular venda da Vila Dias, no Beato

A autarquia não terá sido informada de que a vila estava à venda e, por isso, não pôde exercer o direito de preferência. O proprietário e um conjunto de moradores dizem-se incrédulos com a situação.

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O novo dono já fez obras e tinha um projecto de renovação. Prometeu manter as rendas a quem lá está DR

A incerteza sobre o futuro voltou à Vila Dias, na freguesia lisboeta do Beato. Aquela antiga vila operária, com 161 casas muito necessitadas de obras profundas, foi comprada em Abril por um investidor privado que promete reabilitar tudo, atrair novos moradores e manter as rendas às pessoas que já lá moram. Mas a câmara pediu recentemente ao tribunal que anule a venda da vila e um grupo de moradores teme que tudo volte à estaca zero.

O dono do bairro e um grupo de residentes dirigiram-se esta terça-feira à Assembleia Municipal de Lisboa para mostrar desagrado e tentar obter esclarecimentos. “Realizou-se, a 18 de Agosto, uma sessão de esclarecimento sobre a Vila Dias, de que não tivemos conhecimento e que nos surpreendeu, a anunciar uma intervenção da câmara municipal nessa propriedade”, disse José Morais Rocha, o novo senhorio. “Segundo nos disseram, a câmara vai instaurar um processo judicial de preferência e, se o juiz não voltar a dar razão, seguir-se-á uma expropriação amigável e, se não for amigável, será litigiosa”, queixou-se.

O que se passou, explicou Helena Roseta quando José Rocha acabou de falar, é que a câmara não foi avisada de que a vila ia ser vendida e, portanto, não pôde exercer o direito de preferência na transacção. De acordo com a lei, a autarquia tem de ser informada previamente da venda de imóveis em algumas zonas da cidade, para decidir se os quer comprar ou não. “A passagem da propriedade para si não obedeceu a uma coisa fundamental na lei”, disse a presidente da assembleia municipal ao dono da vila. “É essa a razão que leva a câmara a meter a acção judicial, no sentido de poder exercer o direito de preferência”, acrescentou.

Mas José Morais Rocha, que falava também em nome de moradores que subscreveram um abaixo-assinado, mostrou-se incrédulo. “Não compreendemos esta atitude, que vai contra tudo o que a câmara tem dito no sentido de pretender estimular que a iniciativa privada faça a conservação dos seus imóveis”, afirmou o engenheiro. O responsável pela Sociedade Vila Dias, que comprou o bairro por 1,9 milhões de euros, explicou que, nos últimos meses, tem estado a resolver “todas as situações de perigo, que diziam fundamentalmente respeito a escadas comuns, infiltrações, empenas exteriores e reparações de telhados”. 

José Rocha disse ainda que, depois de ser notificado para a realização de vistorias municipais, esteve “durante vários dias” a acompanhá-las. “Até pelo conhecimento pessoal que já tínhamos da situação da maior parte dos inquilinos”, acrescentou. No fim da intervenção, foi aplaudido pelos moradores que se encontravam nas galerias.

“A câmara já há muito tempo que vinha trabalhando no sentido de poder ter um papel muito importante naquela zona”, sublinhou Helena Roseta logo de seguida. “Por essa razão é que esta assembleia municipal aprovou a constituição da Área de Reabilitação Urbana Sistemática daquela zona, daquele conjunto de prédios.” Pela lei, a câmara tem direito de preferência sobre os imóveis que se encontrem dentro destas áreas. 

“Eu conheço bem aquela zona, fui lá várias vezes. Sei muito bem a situação muito, muito negativa e muito degradada em que algumas daquelas casas estão. Sei muito bem o sofrimento de anos, anos e anos dos moradores da Vila Dias com proprietários anteriores”, afirmou a autarca. Mas, sublinhou, “a câmara não vai prescindir dos seus direitos”.

O PÚBLICO tentou perceber melhor os contornos de toda a situação, mas não conseguiu obter mais esclarecimentos da câmara municipal até à publicação deste artigo.

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