Candidata do PS "humilha" opositor ex-emigrante na Venezuela. CDS acusa-a de "xenofobia"

Joana Campos, presidente da Junta de São Francisco de Assis, imitou o sotaque do candidato do CDS, ex-emigrante da Venezuela. Centristas consideram tratar-se de uma "humilhação" e pedem a PS que se demarque.

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Minas da panasqueira, na Barroca Grande, pertencem à freguesia de São Francisco de Assis JH JOAO HENRIQUES

As eleições autárquicas deste ano estão a ser pródigas em acusações de xenofobia. Desta vez, o caso aconteceu no interior do país. Joana Campos, presidente da Junta de Freguesia de São Francisco de Assis, na Covilhã, e candidata apoiada pelo PS, imitou o sotaque do candidato do CDS, Júlio Canhoto, disse que este só ali estava porque tinha fugido da Venezuela e, nas palavras do CDS, "humilhou" o candidato durante um debate entre candidatos à junta, na Rádio Cova da Beira. O candidato do CDS à Câmara da Covilhã, Adolfo Mesquista Nunes, acusa a socialista de "xenofobia" e pede ao PS que se demarque desta atitude.

O debate começou logo crispado, com os candidatos a falarem de actos de vandalismo que aconteceram na localidade. Júlio Canhoto disse que a presidente da junta deveria ter feito queixa à GNR e Joana Campos a atirar-lhe que "se calhar, se calhar" ele saberia quem tinham sido os responsáveis, dando a entender que o centrista tinha algo a ver com o que acontecera. Depois, a socialista criticou o centrista por ter vindo para Portugal e ter instalado o seu negócio no Fundão, lamentando que o candidato considere que a aldeia tem falta de dinamismo: "Lamento que fale assim da terra que o acolheu e lhe deu trabalho".

Se até aqui o debate estava em tom duro, mas sem problemas de maior, é o que se segue que os centristas não querem deixar passar. A dada altura, a candidata imita o sotaque do centrista que, como ex-emigrante, fala português misturado com espanhol. Estavam a debater as propostas para dinamizar o turismo na freguesia, o candidato questiona se a candidata sabe quais as propostas. "Se lo sabes..." ia a dizer, quando Joana Campos responde: "Se lo sabesSe lo sabes. Sei, sim senhor", imitando o sotaque do opositor. Mais tarde, quando o centrista referiu que Joana Campos era "apojada" pelo PS, nova referência ao sotaque: "Não estou apojada em niguém. Podia estar apoiada. É bom que esse português melhore senão na Barroca Grande ninguém 'vai o' entender [sic]". (o som do debate na Rádio Cova da Beira está disponível abaixo).

Além das referências ao sotaque, Joana Campos refere por várias vezes o facto de Júlio Canhoto ter vivido fora de Portugal. "Qual a sua preocupação há 16 anos se nem vivia, nem sabia onde era a aldeia de São Francisco de Assis se viveu na Venezuela? Se as suas raízes são na Venezuela", questionou. Depois foi mais longe e por duas vezes referiu, primeiro que a família de Canhoto só estava em Portugal porque estava a fugir do que se passava naquele país, e numa segunda vez, dizendo-o directamente sobre Canhoto: "Só está na aldeia porque teve de fugir do país onde estava". 

Já o centrista acusou a socialista de promover "uma junta familiar", uma vez que a presidente "é secretária, presidente e ainda faz os serviços no correio".

CDS questiona PS nacional sobre "discriminação"

Depois deste debate, Adolfo Mesquita Nunes, criticou a posição da candidata socialista e pede ao PS nacional que tome uma atitude. "Se o PS Covilhã encara com naturalidade e não pede à sua candidata que se retrate, o que tem a dizer o PS nacional? Está o PS nacional de acordo esta discriminação a luso-descendentes? Para o PS nacional, a terra do nosso candidato é a Venezuela? Ou vai o PS nacional por cobro a isto, exigindo que a candidate se retrate ou retirando-lhe o apoio?", disse em declarações ao PÚBLICO.

Em causa estão as declarações de Vítor Pereira, o socialista presidente da Câmara da Covilhã, que disse que não reconhece "tendência xenófoba" na candidata apoiada pelo PS, referindo que a autarca é uma "cidadã educada, bem formada que tem valores de referência que o demonstra na sua vida pessoal e política, que mostrou no passado, mostrou no presente e no futuro”. O autarca da Covilhã, em declarações registadas pela Rádio Covilhã, afirmou ainda que "o PS é por natureza um partido plural, aberto, tolerante e a sua prática política, ao longo da sua existência é a de ser contra qualquer tipo de xenofobia, racismo ou atitudes que não são próprias de quem defende os valores da república e da constituição".

Para Mesquita Nunes, estas declarações do presidente da câmara, "desvalorizando e encarando com naturalidade que uma candidata por si apoiada acuse um cidadão português luso-descendente de ter a sua terra na Venezuela, de só cá estar por ter de lá fugido como quem não lhe reconhece estatuto político", não são suficientes, referiu ao PÚBLICO.

Já ontem, numa conferência de imprensa na Covilhã, referiu que o candidato do CDS "é um ex-emigrante e na sua cirscunstância de ex-emigrante, na sua circunstância de ter ainda um sotaque diferente do português clássico, na sua circunstância de ter estado ausente do país e ter decidido voltar, foi humilhado, gozado pela candidata apoiada pelo PS. Gozou com o sotaque, mimetizou e imitou o sotaque do nosso candidato. Disse que o lugar dele era na Venezuela, que ninguém o entendia", palavras registadas pela Rádio da Covilhã

O centristas considerou que estas declarações "são uma ofensa e humilhação a todos os que emigraram e voltaram, a todos os cidadãos portugueses que não nasceram em Portugal e aqueles que regressam para lutar pelas suas terras. A superioridade insuportável, que é dos populistas nacionalistas a candidata do PS dedicou parte do seu debate a humilhar o nosso candidato. Observações que consideramos xenófobas", disse ao mesmo tempo que desafiou o PS a retirar o apoio a Joana Campos.

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