Supremo Tribunal do Quénia anula vitória de Kenyatta e manda repetir eleições

Juízes identificaram múltiplas irregularidades e deram razão ao candidato da oposição, Raila Odinga. Há festejos nas ruas e Presidente vai falar ao país.

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Apoiante de Raila Odinga celebra em Mathare Norte, Nairobi DANIEL IRUNGU/EPA

O Supremo Tribunal do Quénia anulou as eleições presidenciais de 8 de Agosto, em que foi reeleito o Presidente Uhuru Kenyatta, com 54,3% dos votos, e ordenou que se realizem novas eleições dentro de 60 dias.

O candidato da oposição, Raila Odinga, tinha rejeitado os resultados, defendendo que o sistema informático da comissão eleitoral tinha sido pirateado, o que resultou numa “fraude maciça” a favor de Kenyatta. 

Os observadores internacionais às eleições afirmaram, no entanto, que não havia indícios de manipulação. Não foram encontrados “sinais de manipulação centralizada ou localizada” no processo de voto, afirmou a chefe da missão da União Europeia, Marietje Schaake.

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Odinga é o candidato da Super Aliança Nacional (Nasa) DANIEL IRUNGU/REUTERS
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Raila Odinga, à saída do Supremo Tribunal Baz Ratner/REUTERS

Odinga, à frente da Super Aliança Nacional (Nasa), que teve 44,7% dos votos, recorreu para o Supremo, que revelou esta sexta-feira a sua decisão: a comissão eleitoral não respeitou a Constituição na condução do processo eleitoral, disse o juiz David Maraga, porta-voz do tribunal, citado pela BBC. Ilibou no entanto o Presidente Uhuru Kenyatta de qualquer responsabilidade.

Dias antes das eleições, o responsável pelo sistema de voto electrónico na comissão eleitoral foi encontrado assassinado e o seu corpo tinha sinais de tortura. A comissão eleitoral reconheceu que houve uma tentativa de pirataria informática, mas que não tinha tido sucesso ou não tinha afectado a contagem dos votos.

Porém, cerca de um terço dos boletins dos boletins de voto depositados nas urnas tinha irregularidades, disse agora o Supremo, que consultou uma comissão de especialistas em tecnologias de informação. Alguns estão em branco, outros foram assinados todos pela mesma pessoa, alguns vieram de mesas de voto que simplesmente não existiam. Há milhares sem selos oficiais ou marcas-de-água e alguns têm resultados diferentes dos totais anunciados pela comissão eleitoral, diz ainda a BBC. 

Presidente aceita mas...

O Presidente Kenyatta protestou contra a decisão do Supremo. "Pessoalmente, não concordo com a decisão, mas respeito-a", afirmou, submetendo-se ao poder judicial. Ainda assim, não resiste a dar um toque de apelo à revolta:  "Não concordo porque milhões de quenianos fizeram a sua escolha e seis pessoas decidiram ir contra a vontade do povo", afirmou Kenyatta, referindo-se aos juízes.."

Já Raila Odinga celebrou "um dia histórico para o povo do Quénia e, por extensão, para o povo do continente africano". Embora inicialmente Odinga tenha dito que não confiava nos tribunais - em 2013 também perdeu as eleições presidenciais e levou o caso ao Supremo, mas perdeu -, disse agora que é uma decisão judicial inédita em África, que abre um precedente. Em vez de pôr em causa a votação, a estratégia de Odinga, desta vez, foi questionar a contagem.

Os seus apoiantes saíram de imediato para as ruas para comemorar, por exemplo no grande bairro de lata de Kibera, nos arredores de Nairóbi, um dos redutos de Odinga. Receia-se que haja agora confrontos.

Paira o temor de um regresso da violência étnica ao Quénia por causa da disputa política - em 2007, o anúncio do resultado das presienciais resultou numa espiral de violência que fez 1200 mortos e 600 mil desalojados. Na altura, o Presidente Kenyatta e o vice-presidente, William Ruto, foram denunciados ao Tribunal Penal Internacional como organizadores da violência, mas os processos contra eles não avançaram.

As eleições a 8 de Agosto ficaram marcadas por episódios de violência que causaram dezenas de mortos. A Comissão Nacional de Direitos Humanos deu conta da morte de 24 pessoas, 17 das quais na zona da capital. A oposição falou em centenas de mortos e as forças de segurança do Governo negaram as acusações de que recorreram à força. 

 

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