Os mundos de Sofia

Adaptando a condessa de Ségur, Christophe Honoré recupera a graça e a frescura dos seus melhores filmes.

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Um casting perfeito em Os Desastres de Sofia

Depois da princesa de Clèves (o excelente A Bela Junie, 2008) e de Ovídio (o desastroso Metamorfoses, 2014), Christophe Honoré atira-se à condessa de Ségur e os livros que encantaram gerações de miúdas e miúdos — e, no processo, recupera muita da graça, da leveza e da frescura que o tornaram no realizador do momento faz agora dez anos com As Canções de Amor (2007).

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Os seus Desastres de Sofia (que incluem igualmente material do livro seguinte, As Meninas Exemplares) pegam numa ideia fora de moda e fora de tempo do “filme de família” em imagem real, e dão-lhe uma volta sôfrega, atrevida, veloz. Câmara à mão a apanhar a quente e em cenários reais as tropelias de Sofia, do primo Paul e das amigas Camila, Margarida e Madalena (e que bons são os miúdos!); esquilos e ouriços-cacheiros desenhados a dar piscadelas de olhos aos anos de ouro da Disney; a banda-sonora pop doce-amarga de Alex Beaupain a remeter, outra vez, para Demy (e é engraçado ver Os Desastres de Sofia em contexto das actuais reposições do mestre).

Acima de tudo, percebe-se estar aqui um trabalho de amor pelos livros (afinal, as crianças serão sempre crianças) e uma vontade — plenamente conseguida — de fazer um filme “de hoje” sem trair o espírito de uma obra que pertence claramente a “ontem” nem criar algo demasiado bafiento ou excessivamente moderno. Honoré ganha a aposta, com a perfeição de um casting que, entre adultos e crianças, encontrou uma Sofia perfeita em Caroline Grant, e com a modulação bem sacada de um tom entre o truculento-infantil e o melancólico-adolescente. Não deixa de ser um filme algo quixótico nestes tempos em que o cinema para toda a família se vê limitado às animações dobradas — mas é também esse quixotismo que torna Os Desastres de Sofia altamente recomendável.

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