Nova tendência: as videoquedas

Estamos ainda no início da época, mas podemos já começar a perceber alguns comportamentos e tendências que o videoárbitro (VAR) trouxe para o nosso futebol.

O número de cartões amarelos a jogadores por manifestarem desacordo com as decisões dos árbitros baixou. É um facto. Os jogadores sentem agora que,  havendo alguma falha importante da equipa de arbitragem, esta poderá ser corrigida pelo VAR. Não adianta, portanto, andar sempre a questionar as decisões dos árbitros. Este é, sem dúvida, um benefício colateral resultante da implementação da tecnologia.

A presença do VAR reduziu também, parece-me, as tentativas de simulações descaradas. Nos muitos jogos que tenho visionado, poucos foram os jogadores que, procurando enganar o árbitro, se deixaram cair sem qualquer contacto por parte de adversários. Os jogadores estão conscientes de que o “big brother” VAR irá, em princípio, rever e anular qualquer erro de um árbitro provocado por uma simulação. 

A “videoarbitragem” trouxe, no entanto, uma nova tendência para os nossos relvados: as “videoquedas”. As videoquedas podem caracterizar-se algures entre as simulações e as quedas por desistência de disputar a bola após um contacto. Concretizando, são quedas que acontecem sem qualquer falta, sempre após um contacto visível com um adversário e, normalmente, implicam a queda voluntária do interveniente desistindo de jogar a bola e ficando a olhar para o árbitro.
Os jogadores sabem que, para além do árbitro principal que tem a primeira e última palavra sobre todos os lances do jogo, existe um outro árbitro a ver o jogo pela televisão e que poderá ter uma palavra a dizer nas principais decisões do jogo, nomeadamente os lances de pontapé de penálti.

Assim, muitos jogadores estão a cair ou, pelo menos, a deixar de disputar a bola, mal sentem que houve um contacto com um adversário. Na televisão, principalmente em slow motion, os contactos parecem sempre ser mais impactantes na acção dos jogadores do que ao vivo e em velocidade normal. Em muitos lances deste género, os jogadores parecem ter esperança de que o VAR intervenha e diga que o contacto era motivador de falta. Felizmente, a bem do futebol e do futuro do projecto videoárbitro, tal não tem acontecido. 

Alguns exemplos desta jornada poderão ajudar-me a explicar o que tipifico como videoquedas.

No jogo Rio Ave-Benfica, o jogador André Almeida entrou na área adversária e deu-se um contacto com um defensor que estava à sua frente. Contacto existiu, foi inevitável, mas aconteceu também sem falta de qualquer dos intervenientes. Houve quem pedisse pontapé de penálti, mas estiveram bem o árbitro, Hugo Miguel, e o VAR, Fábio Veríssimo, a perceber que era uma videoqueda.

No Sporting-Estoril, também aconteceram videoquedas. Bas Dost “sofreu” uma videoqueda no interior da área do Estoril quando, ao sentir que o adversário directo tinha o braço a envolver-lhe o tronco e ao aperceber-se de que a bola lhe iria passar por cima sem lhe conseguir chegar, caiu, desistindo de tentar jogar a bola.
No mesmo jogo, neste caso na área do Sporting, Kléber também “sofreu” uma videoqueda ao disputar uma bola com Mathieu.

O central do Sporting antecipou-se e cortou a bola. Aconteceu, depois, um contacto normal entre os dois jogadores que “provocou” a queda ao atacante do Estoril. 

Em ambos os lances, Luís Godinho (árbitro) e Tiago Martins (VAR) souberam avaliar correctamente. Perceberam que não tinha existido qualquer falta e deixaram seguir o jogo.

O caso mais interessante de videoqueda aconteceu no Sp. Braga-FC Porto, na área bracarense, em lance entre Brahimi e Fransérgio. Houve um cruzamento para a zona onde estes jogadores estavam e ambos, de olhos na bola, correram para a tentar cabecear. Antes de chegarem à bola sentiram que alguém lhes estava a tocar e, vai daí, aconteceu a videoqueda. O contacto existiu, foi mútuo e sem qualquer infracção. A videoqueda terá sido provocada “apenas” por uma indicação dos seus cérebros de que poderiam cair, pois tinha havido contacto. Desistiram de tentar cabecear e aconteceu uma dupla videoqueda. Bem Carlos Xistra e Bruno Esteves ao não caírem, eles, nesta situação.

Acredito que muitos jogadores o façam de forma inconsciente, outros fá-lo-ão, infelizmente, de forma consciente. As muitas videoquedas que têm acontecido terão tendência para diminuir. Primeiro porque os árbitros e os VAR vão continuar a saber “ler” maioritariamente bem esses lances. Segundo porque os jogadores, treinadores, dirigentes, jornalistas e comentadores vão perceber que o VAR analisa cada situação em velocidade normal de jogo. O slow motion é utilizado apenas para perceber o local de contacto e, por isso, não devemos formar opiniões sobre determinados lances olhando para eles a uma velocidade de câmara que faz parecer tudo maior e mais grave.

Ouça também o podcast Jogo Limpo, com a análise aos lances da 4.ª jornada da I Liga

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