Jorge, o árbitro. Jorge, o homem

O Jorge Sousa é um árbitro frio. Não se zanga. Não se excede. Não deixa transparecer emoções. Um bom árbitro. Talvez o melhor da arbitragem actual!

Até há poucos dias, qualquer pessoa atenta ao futebol português facilmente concordaria com as afirmações anteriores.

O Jorge Sousa é rude, mal educado, descontrolado, prepotente. Com aquela atitude podemos mesmo dizer que não tem perfil para ser árbitro.

Esta é a imagem que hoje, e por causa de um momento, muita gente tem daquele que na passada época foi considerado o melhor árbitro português.

Já muitos falaram, e vão continuar a fazê-lo até à exaustão e durante muito tempo, sobre as palavras e atitude do árbitro Jorge Sousa. Não preciso dizer muito. Errou. Ponto. Foi, ao contrário do que tantas vezes acontece com outros agentes desportivos, castigado por esse erro. Ponto.

Mas deixem que vos escreva um pouco, relembrando umas coisas e revelando outras, sobre o Jorge Sousa.

É muito raro ver o Jorge a rir-se dentro de um campo de futebol. Foi essa a atitude que escolheu ter desde sempre na arbitragem. Essa sua forma de estar dentro de campo reflecte a sua postura na arbitragem: sério, focado, dedicado, e honesto. Tudo isto, mais a qualidade das suas decisões (erra como todos, mas é consensual que erra menos que a maioria), fez com que aos 42 anos de idade e após 18 anos a apitar no futebol profissional tenha conseguido o respeito e admiração da maior parte dos colegas, jogadores, treinadores, dirigentes e mesmo adeptos do futebol português.

É muito raro estar com o Jorge e não estarmos todos a rir. É uma pessoa bem-disposta. Com humor inteligente. Em paz com a vida. Em ambiente descontraído diz umas asneiras. Normal... é do norte. Não há ali atitudes falsas ou sorrisos forçados. É o que é!

O Jorge Sousa, para além de ser árbitro, é também um homem. Com forças e fraquezas, qualidades e defeitos, alegrias e tristezas, sucessos e falhanços. Dizer que o Jorge “é também um homem” pode parecer básico mas acreditem que isto de se ser árbitro limita muito a nossa possibilidade de sermos homens! Pois... porque árbitro não tem direito a ter fraquezas, defeitos, tristezas ou falhanços. Não é admissível num árbitro.

O que aconteceu ao Jorge naquele momento... foi homem!

Jorge, valha o que valer, para mim e para muitos a tua condição de grande árbitro não ficou beliscada por um momento de infelicidade do homem.

Jorge, valha o que valer, a admiração que tenho por ti enquanto homem não ficou em nada afectada por este episódio. Só quem não te conhecer poderá achar que aquele momento te define. Aliás, é mesmo necessária alguma má fé para achar que aquela situação pode definir alguém!

Jorge, as palavras acima não querem dizer que não continue a bater no árbitro Jorge Sousa quando este cometer erros em campo. Entenda, o leitor, que este “bater” é uma das palavras que, entre árbitros, usamos para nos referirmos a uma situação em que um de nós “reconhece e aponta” os erros de arbitragem de outro árbitro. Esclareço que o meu “bater” virá sempre, quanto possível, acompanhado por uma explicação na tentativa de ajudar as pessoas a perceber os motivos e contexto de cada decisão.

Jorge, mandaram-te para o caralho* durante três jogos. Tenta não te zangar muito com o futebol português. Aproveita para gozar esses fins-de-semana com a família e volta com mesma postura que tiveste ao longo de toda a tua carreira. A arbitragem e o futebol português precisam de árbitros e homens como tu.

* Segundo autores conceituados, nomeadamente da Academia das Ciências de Lisboa, a palavra "caralho" designava a pequena cesta que se encontrava no alto dos mastros das caravelas. Dada a sua situação, o caralho era um lugar muito instável pois era onde se manifestava com maior intensidade a oscilação e o rolamento lateral da embarcação. Este local, nada agradável, era também e por isso mesmo considerado lugar de castigo e para aí eram mandados os marinheiros que infringiam alguma das normas vigentes a bordo. O prevaricador era então obrigado a cumprir horas e por vezes até dias inteiros no caralho e, quando descia, vinha tão maldisposto que se mantinha quieto por uns tempos.

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