Contra o pôr-do-sol

É por agora, nos meados de Agosto, que as noites começam a ser menos boas mas os princípios delas - os pôres-do-sol - são os mais bonitos do ano. É como se cada dia se recusasse a morrer. É como aqueles filmes em que o anti-herói decide que não vai simplesmente entregar-se à polícia: vai morrer aos tiros na glória da câmara lenta.

Chega a hora do dia despedir-se de nós e, em vez de desaparecer discretamente, como quem já abusou da hospitalidade, revolta-se. O sol pega fogo aos destroços. É a política da terra queimada. Ai, não é para mim? Então não há-de ser para ninguém. E vai daí toma lá labaredas, nuvens cor-de-rosa, aguarelas lambidas por dragões.

Cor-de-rosa. Quantas cores pode ter uma rosa? Quantos milhares de rosas diferentes é que há? Qual é a cor do mármore Rosa Portugal? Será a cor do Mateus Rosé? Quantas cores têm os rosés portugueses, desde o mais pálido ao mais vermelho? Quais são as rosas que crescem selvagens em Portugal? Que cores podem ter?

Num pôr-do-sol de Agosto para Setembro responde-se a estas perguntas todas. O sol não se pôe: expôe-se. E compôe-se de uma só cor, de um só cor-de-rosa, que apresenta como uma resposta à beleza, como se fosse simples e solitária e óbvia. Cor-de-rosa, diz, é esta cor. Esta cor hoje. Apesar de parecer que vai ser sempre esta cor, ela faz questão de ser ligeiramente diferente todos os dias.

Ao pôr-se assim, o sol amaldiçoa a noite mas o ser humano é tão torto que lhe dá a volta e interpreta aquele arrebol como uma benção.

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