A favor de candidaturas independentes

As candidaturas independentes têm o mérito de desafiar as feias organizações em que se tornaram muitas das estruturas partidárias.

As candidaturas independentes são muitas vezes reduzidas à figura do candidato a presidente da câmara ou encaradas como uma manifestação de ressabiamento de facções, ou de indivíduos, de organizações partidárias. Mas essa análise esconde o essencial. O mérito de uma candidatura independente não assenta numa superioridade de candidatos que nada têm a ver com estruturas partidárias nem traduz uma desistência dos partidos. Pelo contrário. As candidaturas independentes têm, neste momento, o mérito de desafiar as feias organizações em que se tornaram muitas das estruturas partidárias por esse país fora. O mérito de permitir que os cidadãos reclamem melhores partidos. Competindo com eles? Sim, se for preciso. E, aqui e agora, é.

Os partidos existem para nos proporem uma visão de comunidade e sociedade e os modelos de organização para a concretizar. O seu objectivo primeiro é alcançarem a governação, o poder. Serem Estado. Acontece que alguns partidos são, em boa verdade, a antecâmara do Estado, sendo por vezes vistos por muita gente como a antecâmara de acesso aos privilégios que o Estado, com os seus imensos recursos, pode proporcionar. Esse facto e a inexistência de estímulos para se tornarem melhores tende a tornar essas estruturas em organizações medíocres, sem brilho nem ambição.

Na realidade, no nosso sistema político, alguns partidos — por vezes fala-se do “arco da governação” — dão como adquirido o acesso ao poder. Mais tarde ou mais cedo, inexoravelmente, ele chegará, quanto mais não seja através da alternância. Nesse contexto, em que apenas o tempo, e não o mérito, é necessário para se atingir o objectivo principal da organização, o que se pode esperar? Não muito mais do que laxismo e facilitismo. E com eles a falta de transparência, o oportunismo, o terreno fértil para a troca de favores e para quem se procura servir em vez de servir.

É neste contexto que, em muitos lados no país, e em particular em Coimbra, os cidadãos tomaram a iniciativa de chamar a si a intervenção política e decidiram competir com os partidos. Não para que que eles desapareçam, mas sim, pelo contrário, na expectativa de contribuir para que eles não se tornem irrelevantes. Não para dizerem que não querem os partidos, mas para afirmarem que querem mais, muito mais, do que aquilo que lhes é dado — mais competência, mais ambição, mais ousadia, mais transparência, mais honestidade.

Querem, em resumo, dizer que não vale tudo e que não aceitam tudo. E que para eles, os cidadãos, estarem disponíveis para confiar nos partidos, esses têm de ser muito mais exigentes com a forma como abordam o exercício do poder. Em vários aspectos, a começar logo nessa necessidade maior do nosso país que é a descentralização. 

Dizer tudo isto, denunciar tudo isto, exigir tudo isto, tem peso. São muitos os que o dizem. Mas, se as palavras são poderosas, passar delas aos actos é poderosíssimo. E passar das palavras aos actos, neste caso, é ir para o terreno, ouvir as pessoas e instituições, identificar problemas, construir com a comunidade propostas de soluções, apresentar um programa honesto, coerente e ambicioso.

Passar das palavras aos actos é dar esse passo que é tudo menos fácil: apresentar candidaturas independentes. E, fazendo-o, não só discutir, defender e lutar por uma visão para as nossas terras, como também criar um estímulo bastante forte para a melhoria dos partidos políticos que a devem servir.

No Porto, em Coimbra e noutros locais isso está a ser feito. Felizmente.

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