Trump na Polónia vai vender gás e falar de uma amizade especial

Varsóvia espera ganhar força como contrapeso em relação ao eixo Paris-Berlim com a visita do Presidente norte-americano.

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Trump tenta na Polónia começar de novo a sua relação com a Europa, com um país mais favorável Yuri Gripas/REUTERS

Donald Trump está de volta à Europa, e a primeira paragem é na Polónia. O Presidente norte-americano quer vender gás natural liquefeito, e Varsóvia vê em Trump um aliado natural para os seus diferendos com Bruxelas e a vizinha Alemanha, que o Governo profundamente conservador e nacionalista do partido Lei e Justiça (PiS) vê como um eterno rival.

Com a expectativa de uma recepção positiva, ao contrário dos grandes protestos que o esperam em Hamburgo, na cimeira do G20 na sexta-feira e no sábado, o Presidente Trump espera começar de novo a sua relação com a Europa, depois de ter começado com o pé errado em Maio, na NATO e na cimeira do G7. Participa quinta-feira num encontro da Iniciativa dos Três Mares em Varsóvia – um grupo que pretende promover a integração entre 12 países da Europa central dos mares Negro, Báltico e Adriático. É a "nova Europa" de que falava George W. Bush nos tempos da guerra do Iraque, embora se adicione também a Áustria e todos juntos representem apenas cerca de 10% do PIB da UE.

Com a visita de Trump, o Governo polaco, que se sente ideologicamente alinhado com a nova Casa Branca, sente que ganhou uma espécie de lotaria diplomática, escreve a revista Foreign Policy. O Governo do PiS, que é dirigido na sombra por um homem que não tem qualquer cargo político - o ex-primeiro-ministro Jaroslaw Kaczynski - quer marcar pontos enquanto líder na Europa, e marcar o contraste com a vizinha Alemanha.

Em termos práticos, a Polónia quer cimentar os seus créditos de fundadora da Iniciativa dos Três Mares, um grupo que pretende dinamizar as trocas comerciais, energéticas e a construção de infra-estruturas ao longo de um eixo Norte-Sul, dos Estados Bálticos até aos Balcãs – ao contrário do que tem sido privilegiado até agora, num eixo Leste-Oeste, que reflecte a influência alemã, sublinha a Reuters.

Um projecto fundamental deste grupo é a construção do novo Corredor de Gás Norte-Sul, nos próximos três anos, para transportar gás natural liquefeito norte-americano do terminal em Swinoujscie, na Polónia, até um novo terminal na Croácia. A viagem far-se-ia não só através do território polaco mas também da República Checa, da Eslováquia e da Hungria.

Varsóvia vê este projecto como um contrapeso ao domínio franco-alemão da União Europeia e uma alternativa à dependência do gás natural da Rússia, que já muitas vezes se mostrou disposta a fechar as torneiras por motivos políticos.

O primeiro transporte de gás liquefeito americano já chegou a Swinoujscie, diz a Reuters. É no seu encalço, e à espera de novos negócios, que Trump passa pela Polónia, antes de ir para uma conturbada cimeira das 20 maiores economias do mundo (G20) e uma reunião, olhos nos olhos, com o Presidente russo, Vladimir Putin.

Cheira a Intermarium

Se antes disso se encontrará com o homem mais poderoso da Polónia, o secretário-geral Kaczynski, não se sabe. Mas o PiS está a organizar uma entusiástica recepção a Trump: cada membro do partido está encarregue de levar até 50 pessoas do seu círculo de amigos e conhecidos para ir assistir a um discurso do Presidente norte-americano, para que ele tenha uma plateia bem cheia, noticiou o jornal polaco Gazeta Wyborcza.

No resto da Europa, não há grande entusiasmo com esta Iniciativa dos Três Mares. “Temos as nossas dúvidas”, respondeu um diplomata da Europa ocidental, quando a Reuters lhe perguntou se poderia ter pés para andar. Em Berlim, teme-se que a visita de Trump sirva para aprofundar as divisões entre a "velha" e a "nova" Europa. E sentem na Iniciativa dos Três Mares um certo cheiro de Intermarium, o conceito avançado após a I Guerra de uma federação de Estados bálticos e do Mar Negro, liderada pela Polónia, que serviria de contrapoder ao expansionismo alemão e russo – e do qual há vestígios na ideologia do partido Lei e Justiça, sublinha o Financial Times.

O Governo polaco, que polvilha as suas relações com Bruxelas de eurocepticismo e olha com desconfiança para o novo Presidente francês, Emmanuel Macron, que prometeu um reforço da integração europeia e dar um novo fôlego ao motor franco-alemão, gostaria por seu lado que Trump legitimasse as suas ambições. E porque Varsóvia precisa de aliados, no seu confronto com a UE, devido à aprovação de leis para controlar o Tribunal Constitucional e outros tribunais.

Para as potências estrangeiras, a formação de grupos regionais é interessante por divide e enfraquece a União Europeia. Um estudo recente do think tank húngaro Political Capital concluiu que o Kremlin planta ideias sobre sociedade "tradicional" para alimentar divisões entre a Europa De Leste e o "Ocidente niilista e decadente", diz a Foreign Policy

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