A fotografia que reacendeu as teorias sobre o fim de Amelia Earhart, heroína da América

Pioneira da aviação, desapareceu em 1937 no Pacífico quando terminava a circum-navegação aérea da Terra. Imagem de um espião americano revelada em documentário televisivo volta a pô-la nas ilhas Marshall e sob controlo japonês.

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A imagem que causou nova discussão sobre os últimos tempos de vida da aviadora History Channel
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Amelia Earhart Reuters
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Amelia Earhart é uma heroína da aviação, uma figura histórica americana e mundial e uma personagem de uma história que não tem fim – a piloto pioneira desapareceu em 1937 no Pacífico e desde então tem-se especulado e investigado sobre os seus últimos dias. Agora, uma fotografia dos anos 1930 pode dar novas pistas sobre o seu paradeiro após o desaparecimento, nomeadamente que pode ter sido capturada pelo exército japonês. Tão veementemente quanto os peritos de um novo documentário defendem esta tese, outros disparam que “isto é uma parvoíce”.

A imagem agora recuperada nos Arquivos Nacionais dos EUA faz parte de um programa que o History Channel norte-americano (com uma grelha distinta da do Canal História português) vai estrear domingo, dia 9. Em Amelia Earhart: The Lost Evidence vários peritos investigam e defendem — ou contestam — a tese de que o avião de dois motores da norte-americana se despenhou nas ilhas Marshall, então sob controlo do Império do Japão, tendo sido capturada pelo exército japonês e sido feita prisioneira na ilha de Saipan (a maior das Ilhas Marianas, no Pacífico Ocidental), onde morreria. 

A imagem, a preto e branco, mostra um grupo de pessoas numa doca, ao longe, e a sua origem está identificada – foi feita no Atol de Jaluit, nas Marshall, e o fotógrafo será um espião norte-americano. No verso tem o carimbo “Office of Naval Intelligence”, os serviços de informação da Marinha americana.

Charles Lindbergh foi o primeiro piloto norte-americano a atravessar o Atlântico por via aérea, mas Amelia Earhart sucedeu-lhe como a primeira mulher a fazê-lo em 1928. Mulher norte-americana do primeiro quartel do século XX, oriunda de uma família de ascendência alemã sem grandes problemas financeiros, aprendeu mecânica, foi fotógrafa, estenógrafa e condutora de camiões, além de enfermeira para os soldados da I Guerra. Apaixonou-se pela aviação em 1920, numa visita a um aeródromo, e oito anos e vários aviões mais tarde tornar-se-ia uma celebridade. Menos de uma década depois, o seu Lockheed-Electra desapareceu no Oceano Pacífico enquanto pretendia terminar a primeira viagem em torno da Terra ao longo da linha do Equador.

O mistério em torno do seu fim, do seu paradeiro e dos últimos capítulos da sua história perdura até hoje, com vários livros e filmes sobre a sua vida e outras tantas investigações e expedições feitas no seu encalço. Nesses primeiros meses de 1937, Earhart viajava com o seu navegador Fred Noonan. Ela tinha 39 anos, ele 44. A tentativa de volta ao mundo teria vários acidentes de percurso, tendo partido de Oakland, na Califórnia, rumo a leste – Miami, África, Índia, Austrália, e Nova Guiné, de onde partiram para o seu último voo conhecido. No dia 2 de Julho, nunca chegaram à ilha de Howland, no meio do Pacífico, onde deveriam ter feito escala para depois seguirem até ao Havai e daí para a Califórnia. As buscas de outros tantos meses não foram bem sucedidas. Um ano e meio depois, Earhart e Noonan foram dados como mortos.

Uma das teses sobre o seu destino passava pelo Japão, adversário dos EUA, e que teria ou sido capturada e feita prisioneira ou virado a sua lealdade para o império nipónico. Agora, uma imagem que tem estado nos Arquivos Nacionais dos EUA está a ser tomada como nova pista sobre Amelia Earhart, com alguns peritos a especular que Earhart, Noonan e o seu avião estão ali, fotografados nas ilhas Marshall (também no Pacífico) e que a piloto poderá ter morrido sob detenção pelos japoneses. O analista forense Kent Gibson disse ao History Channel que pela sua especialidade, o reconhecimento facial, diria que na imagem está a dupla de aviadores norte-americanos. Também Shawn Henry, antigo director do FBI e analista do canal televisivo americano NBC, diz que “ao ver a análise que foi feita, não há margem para muitas dúvidas dos espectadores de que se trata de Amelia Earhart e Fred Noonan”.

Uma parvoíce ou um revés da História?

Como nota a BBC, estabelecer a ligação entre Earhart e Noonan e a imagem granulada e difusa parece difícil de estabelecer e até forçada. As duas figuras na fotografia que estão a ser identificadas como a dupla de americanos estão de costas, sentados na doca, e à direita e numa zona pouco focada da imagem, está um objecto que argumentam ser o avião de Earhart acoplado a uma barcaça. Um vaso de guerra na imagem foi identificado pelos autores do documentário como sendo o japonês Koshu Maru, que tem sido associado à captura dos aviadores nas várias teorias sobre o seu destino. A análise detalhada indica que foram tidas em conta as medidas físicas da piloto e os registos médicos e dentários de Noonan, por exemplo. Os autores do documentário defendem que Earhart terá acabado os seus dias como prisioneira de guerra já durante a II Guerra, mas também admitem que o Japão não tem qualquer registo da sua presença nos campos, embora, como nota a BBC, muitos dos arquivos de guerra japoneses se tenham perdido.

Mas para Ric Gillespie, director do International Group for Historic Aircraft Recovery, “esta é só uma fotografia de um porto em Jaluit com um monte de pessoas”. Citado pelo Guardian, é peremptório: “Há um tal apetite por qualquer coisa relacionada com Amelia Earhart que mesmo uma coisa tão ridícula põe toda a gente a falar nisso”. Para Gillespie, autor do livro Finding Amelia e que investigou durante décadas a vida e desaparecimento da aviadora, “isto é uma parvoíce”. Até o cabelo da mulher na foto está demasiado comprido para ser Earhart, em comparação com imagens da aviadora feitas dias antes. Já Shawn Henry diz simplesmente: “Isto muda totalmente a História”.

A fotografia foi recuperada pelo agente do FBI reformado Les Kinney, que procurava exactamente por provas e indícios que pudessem ter escapado às várias equipas que investigaram o caso Earhart. Terá de ter sido feita antes de 1943, quando a ilha foi bombardeada pelos americanos. A sua presença nas ilhas Marshall é uma possibilidade que vigora desde a década de 1960, recorda o Guardian, alimentada por relatos de ilhéus que dizem ter visto um avião aterrar e dois aviadores sob controlo dos japoneses. Além da teoria de que os norte-americanos teriam acabado sob captura japonesa, outra tese indicam que pode ter morrido como náufraga noutra ilha próxima, actualmente parte do arquipélago de Kiribati. Numa ilha que há 80 anos era desabitada foram encontrados um esqueleto e objectos como um hidratante de marca americana e um estojo de maquilhagem que Gillespie, que trabalhou nessas expedições, liga à presença de uma mulher americana que defende ter sido Earhart.

Há muito mais anos, em 1940, ossadas que se viriam a revelar masculinas foram encontradas no atol de Nikumaroro e chegou a aventar-se a hipótese de serem de Earhart. A explicação que tem vingado ao longo das oito décadas como “oficial” é de que o mau tempo e problemas de comunicação com um navio que deveria ajudar a reabastecer o Lockheed-Electra terão causado a queda eventual do avião por falta de combustível. Possivelmente perdido do mar, o pequeno avião nunca foi encontrado.

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