Exame de Português: jurisprudência não é favorável à anulação da prova

Ministro da Educação garantiu que exame não seria anulado. Especialistas em Direito Administrativo sem consenso quanto às medidas a adoptar e seus efeitos caso se confirme fuga de informação.

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O exame de Português foi realizado por mais de 70 mil alunos Margarida Basto

Os efeitos da anulação de uma prova de avaliação, como a do exame de Português do 12.º ano, que está a ser investigado por suspeitas de fuga de informação, já foram apreciados há uns anos em tribunal. E a "jurisprudência", resultante deste caso, não é de todo favorável à anulação. Quem o afirma é o advogado e professor da Universidade Católica, Luís Fábrica, recordando o que se passou quando a Autoridade Tributária decidiu anular todas as provas de acesso à carreira por suspeitas de fraude em um dos centros ondes estas tinham sido realizadas.

“O tribunal deu razão aos que se sentiram lesados com esta medida, considerando que tinha havido violação do princípio da proporcionalidade, já que foram anuladas todas as provas sem que a autoridade tributária tivesse provado que tinha havido fraudes em mais do que um centro”, indicou ao PÚBLICO. Para Luís Fábrica, esta decisão leva a que tenham de ser tomadas “muitas cautelas quanto a qualquer anulação em massa”.

O ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, indicou nesta terça-feira que a prova de Português, realizada por mais de 70 mil alunos no dia 19, não será anulada mesmo que se comprove que houve fuga de informação, o que está a ser investigado pelo Ministério Público e pela Inspecção-Geral da Educação e Ciência (IGEC). “Neste momento não está em cima da mesa” a possível anulação da prova, indicou o ministro aos jornalistas, depois de primeiro ter dito que esta opção “nem foi equacionada”.

Como acontece quase sempre em Direito Administrativo, não existem consensos quanto às consequências de uma decisão como estas. Luís Fábrica admite que poderá haver alunos que recorram a tribunal por se sentirem lesados com a decisão de não anular a prova, mas que nesse caso “terão de provar que se não tivesse havido fraude os resultados teriam sido diferentes, o que não é fácil”. O Ministério da Educação deverá optar pelo “mal menor”, que no seu entender será a não anulação do exame, acrescenta, ressalvando que não conhece o caso pormenor.

Com a mesma ressalva, o advogado e também especialista em Direito Administrativo, considera que “na dúvida, o bom senso aconselharia a que se repetisse a prova”. Só assim seriam acautelados os princípios constitucionais da “proporcionalidade, igualdade e justiça” que a decisão de não anulação porá em causa, refere. “Só se o ministério conseguir provar que o número de beneficiados pela fuga foi muito reduzido é que concordaria que o exame não fosse anulado”, indica, lembrando que este é também uma das provas principais de acesso ao ensino superior e que nesta corrida qualquer décima a mais ou a menos conta para se ser colocado no curso escolhido.

“Em teoria, tem que se ponderar quais os interesses e direitos que devem prevalecer e quais os que sãos sacrificados”, adianta o advogado João Correia, frisando que esta é uma equação que sempre se coloca quando se decidem medidas “para repor a legalidade”, como é o caso, que diz não conhecer de perto.

“Dentro do princípio da legalidade, é poder discricionário da administração pública decidir que direitos retém e que direitos sacrifica e, quando tal acontece, não há um princípio da igualdade”, especifica, acrescentando que a decisão a ser tomada pela administração tem de ser aquela que visa “atingir o melhor fim”. 

O inquérito sobre a eventual fuga de informação do exame nacional de Português foi aberto depois de ter sido divulgada uma gravação áudio, de uma suposta aluna, que terá circulado na rede WhatsApp alguns dias antes do exame, dando conta de conteúdos que acabaram por sair na prova.

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