O manshouting

A praga do manspreading está bem documentada mas a de manshouting é igualmente invasiva.

Levantam a voz e não estão a falar com os companheiros de mesa. Não. Estão a dirigir-se ao público da sala. Trazem-nos um recado: um recado que repetem mecanicamente, sem variar, por ser fundamental. Pior: têm uma história engraçada para partilhar. A estrela é sempre aquele nosso criado, ao nosso dispor constante, enquanto ainda tivermos orelhas para levar com ela.

Os olhos do discursante correm de uma ponta a outra, arregalando se houver sinal de audição. Se alguém cai na asneira de se virar de repente, para ver de onde vem o chiqueiro, não há perdão nem fuga. O homem - só raramente é uma mulher - suspira de alívio, ao ver que conseguiu finalmente cativar a sua atenção.

Só falta grasnar "olá! Obrigado por ter vindo ao espectáculo de mim mesmo! Se gostar do que ouve, por favor diga aos seus amigos. Estou cá todas as noites de segunda a sábado. Maneira que vou direito ao assunto..."

A praga do manspreading está bem documentada mas a de manshouting é igualmente invasiva. Como um gás venenoso os monólogos gritados ocupam as nossas cabeças e expulsam qualquer calma ou pensamento. As crianças, ao menos, só berram a espaços e têm a desculpa de estarem maçados, para não falar na vantagem de haver adultos para tentar pô-los na ordem. Pode não funcionar mas as intenções são melhores do que nada.

No manshouting não há ninguém para contra-gritar "cala-te!" Meus queridos tempos antigos em que as pessoas gritavam ao telemóvel e éramos sustidos pela esperança que desligassem do outro lado...

 

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