Conselho Nacional do Ambiente defende reforma das florestas com medidas para travar abandono rural

Num parecer sobre a reforma das florestas aprovada pelo Governo, os conselheiros lembram que o êxodo rural na segunda metade do séc. XX deixou o interior “sem gente e sem uma tradição de silvicultura que cuidasse da floresta portuguesa”.

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adriano miranda

Persistem questões, repetem-se recomendações e mantêm-se problemas. Esta é opinião do presidente do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável (CNADS), Filipe Duarte Santos, expressa em conferência de imprensa nesta sexta-feira, sobre a Reforma das Florestas proposta pelo Governo.

“Enquanto o mundo rural continuar dissociado da floresta será muito difícil fazer face ao envelhecimento da população e ao abandono do território”, defendeu João Guerreiro, ex-reitor da Universidade do Algarve (UAlg) e conselheiro do CNADS. Em 17 anos, o CNADS produziu oito pareceres. O último, acerca da Reforma das Florestas recentemente aprovada pelo Governo, foi emitido em Fevereiro deste ano. Nele é explicado que o êxodo rural na segunda metade do séc. XX deixou o interior “sem gente e sem uma tradição de silvicultura que cuidasse da floresta portuguesa”.

Mas será que podemos falar de “florestas” à escala nacional? O investigador e ex-presidente da Liga para Protecção da Natureza (LPN) Eugénio Sequeira fez a pergunta e respondeu que, na maior parte dos casos, não, porque a definição de floresta deve ir além da madeira, da cortiça e da celulose.

As potencialidades da floresta de um país mediterrânico são muito maiores do que as de um país do Norte da Europa. João Guerreiro salienta que há toda uma gama de subprodutos (como as resinas, os frutos, o mel ou as pinhas) que poderiam ser certificados.

De acordo com o especialista Eugénio Sequeira, o esforço deverá ser feito no sentido de equilibrar investimento e rendimento a longo prazo, de forma a garantir que a conservação do solo e da água ou a preservação da biodiversidade se tornem lucrativas. “Sem a remuneração daqueles que previnem a disseminação do fogo, a delapidação dos recursos naturais ou o avanço de pragas e doenças, nada feito”, assegura. 

A evolução da área florestal portuguesa contrasta com a realidade espanhola, francesa, italiana ou grega. Ao contrário de todos os outros países, que viram a extensão das suas florestas aumentar entre 1990 e 2010, disse João Guerreiro, “Portugal não ficou bem na fotografia” por ter sido o único a registar um decréscimo (7%).

Só uma economia florestal mais próspera nos permitirá enfrentar as alterações climáticas e atingir as metas do Acordo de Paris. No rescaldo de um incêndio da magnitude do de Pedrógão Grande, Eugénio Sequeira lembrou o problema dos solos atingidos pelas chamas — “a capacidade de retenção e de infiltração da água tende a diminuir, e o escoamento superficial aumenta, agravando-se a erosão do solo”.

De acordo com o parecer do CNADS, nos últimos 55 anos, a precipitação média anual diminuiu 37mm e a temperatura média anual subiu 0,25º Celsius, por década. O cenário climático da Península Ibérica é particularmente preocupante devido ao elevado risco de desertificação. As pragas e doenças costumam ser variáveis fora da equação, mas "os seus efeitos podem ser mais graves do que os dos incêndios", frisa João Guerreiro. 

A capacidade das autarquias serem boas gestoras das florestas é posta em causa a partir do momento em que estas não conseguem disponibilizar os meios financeiros e os corpos técnicos necessários. “O financiamento deverá ser responsabilidade das autarquias, das entidades privadas, mas também da administração central — embora Portugal seja dos países com menor área florestal pública à escala mundial”, afirma o líder do CNADS.

Texto editado por Hugo Torres

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