Governo unido, partidos dão tréguas, Marcelo adia as “interrogações”

Todos os partidos coincidiram num ponto: ainda não é a altura certa para falar de responsabilidades. “Chegará o momento de apurar o que aconteceu”, promete Costa. Marcelo ajuda.

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LUSA/PAULO CUNHA

“Há interrogações e sentimentos que não podem deixar de nos angustiar. Mas guardemos no imediato estes e outros sentimentos que nos assaltam no mais fundo do nosso coração. Sem nos esquecermos, concentremos agora a nossa vontade no essencial: prosseguir o combate em curso, manter e alargar a nossa solidariedade aos que sofreram e sofrem a tragédia, demonstrando que nos instantes mais difíceis da nossa vida como nação somos como um só.” Foi com este repto que Marcelo Rebelo de Sousa terminou a sua comunicação ao país, depois das 20h30, ao fim de 24 horas de uma tragédia “de que não temos memória” — nas palavras de António Costa.

Quando chegou a Pedrógão Grande, ao início da madrugada de domingo — e o número de vítimas do incêndio ainda era oficialmente de 19 —, o Presidente da República abraçou-se ao secretário de Estado da Administração Interna, Jorge Gomes, que chorava no seu ombro. A imagem prenunciava uma gravidade ainda maior, no já devastador cenário de crise instalado naquele concelho do distrito de Leiria.

Ao longo da madrugada, e do dia, vários ministros (Constança Urbano de Sousa, da Administração Interna, Capoulas Santos, da Agricultura, Adalberto Campos Fernandes, da Saúde, Pedro Marques, Planeamento) foram chegando ao terreno para verificar as condições de resposta. E tiveram — destinado às várias forças no terreno (bombeiros, INEM, Protecção Civil, PJ, GNR) — do Presidente, na sua primeira declaração pública, um voto de confiança: “O que se fez foi o máximo que se poderia ter feito. Não era possível fazer mais. Há situações que são imprevisíveis e, quando ocorrem, não há capacidade de prevenção que possa ocorrer, a capacidade de resposta tem sido indómita.”

Rapidamente, o Governo decretou e o Presidente promulgou três dias de luto nacional, pelas 61 vítimas do incêndio (último balanço à hora de fecho desta edição) no distrito de Leiria. Todas as actividades da agenda institucional do Presidente e do Governo, bem como as iniciativas partidárias foram canceladas.

Todos os partidos reagiram da mesma forma, expressando solidariedade e pesar. E frisaram, quase em sintonia, a ideia que Marcelo viria a reforçar na sua comunicação na noite de domingo. Este é um tempo de união. “Agora é o tempo de as autoridades actuarem, não é o tempo dos políticos”, afirmou, na noite de sábado, o líder do PSD, Passos Coelho, garantindo ter “toda a confiança” na actuação dos bombeiros e autoridades envolvidas no combate ao incêndio.

A mesma ideia foi transmitida pela líder do CDS. “É o tempo para estarmos unidos em luto pelas famílias, pelos amigos, e também unidos junto daqueles que estão a combater no terreno, Protecção Civil e bombeiros, em condições tão árduas e tão difíceis”, afirmou Assunção Cristas.

Catarina Martins, do Bloco de Esquerda, reagiu da mesma forma. Estes são dias de acção, “depois terá de haver avaliação de como é que foi possível, como é que aconteceu, do que tem de ser feito”.

Jerónimo de Sousa, secretário-geral do PCP, manifestou “o profundo pesar” do seu partido pelas vítimas, bem como a sua solidariedade para com as famílias e feridos e expressou agradecimento pelo empenhamento dos bombeiros.

António Costa deslocou-se a Pedrógão Grande ao final da manhã de domingo, depois de ter estado, ele próprio, retido em alguns momentos pelas chamas que ainda lavravam em quatro frentes em vários concelhos.

“Chegará o momento de apurar o que aconteceu”, afirmou o primeiro-ministro, à entrada para uma reunião na câmara.

“É isso que venho aqui fazer, para começar a dar a resposta às populações em termos de alojamento de emergência, em termos de assegurar rendimento, restabelecimento das produções e infra-estruturas”, afirmou Costa. “Quero sublinhar o grande sentido de unidade nacional com que o país está a enfrentar esta tragédia, de que não temos felizmente memória e para a qual temos de estar à altura de saber responder”, afirmou.

De colete laranja, da Protecção Civil, a ministra da Administração Interna passou a noite e o dia no centro de operações de Pedrógão. Ainda que nenhum partido o tenha afirmado, é sobre a sua tutela que recaem as principais responsabilidades numa tragédia como esta. Mas Constança Urbano de Sousa também recusou falar de responsabilidades agora. “É um momento de pesar e de concentrar todo o esforço no combate a este incêndio. Quando isto terminar, será feita uma avaliação sobre o que correu bem, o que não correu, sobre o que aconteceu”, prometeu a ministra.

Para já, a garantia do Presidente da República, de que se fez “o máximo que poderia ser feito” dá uma trégua para que a ministra se concentre na tarefa principal — coordenar as forças ao seu dispor no terreno. Mas, como reconhecera logo na noite de sábado o primeiro-ministro, António Costa, será preciso, depois, “tirar ilações” desta tragédia. Como reconhecia Marcelo, na noite deste domingo: “Guardemos no imediato estes e outros sentimentos que nos assaltam no mais fundo do nosso coração.” O essencial, é, agora, ajudar e reconstruir.

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