Moção de censura do Podemos a Rajoy esgotou-se numa troca de adjectivos

A iniciativa de Iglesias, que visava intervir nas primárias do PSOE, ficou sem objecto desde a eleição de Pedro Sánchez.

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Pablo Iglesias falou durante mais de duas horas Reuters

A pretexto do debate da moção de censura apresentada pelo Unidos Podemos contra o governo de Mariano Rajoy, o Congresso dos Deputados espanhol foi esta terça-feira palco de um simulacro de combate político, que se resumiu a trocas de acusações e uma farta soma de adjectivos ou insultos. A censura estava desde a origem condenada à rejeição, tendo apenas o apoio do partido de Pablo Iglesias e do seu associado catalão, o Compromis. Por outro lado, a moção deixara de ter objecto. Foi apresentada em Maio como forma de intervenção do Podemos nas primárias do PSOE e contando com a eleição de Susana Díaz. A vitória de Pedro Sánchez esvaziou-a de sentido. Ainda não decorreu a votação.

Segundo a Constituição espanhola, a moção de censura tem de ser "construtiva", isto é, deve apresentar uma maioria alternativa à do governo. A moção de Iglesias é a terceira na história do Parlamento espanhol. A primeira foi apresentada em 1980 por Felipe González contra o executivo de Adolfo Suárez e falhou por 24 votos. A segunda foi apresentada pela Aliança Popular (antecessora do Partido Popular) contra o governo de González, em 1987, tendo sido rejeitada por clara maioria.

A iniciativa de Iglesias não tem qualquer base de sustentação. O PSOE, o Cidadãos e o PNV basco não a aprovariam e os independentistas catalães só votariam a favor de um governo alternativo se este aprovasse o referendo sobre a independência, coisa a que o PSOE e o Cidadãos se opõem. Em resumo: Iglesias não tinha nenhum alternativa de governo a apresentar. O objectivo da moção era propagandístico: encurralar o PSOE para o desgastar e responsabilizar pela continuidade do governo do PP, dando ao Podemos a imagem de líder da oposição. Teve um efeito de boomerang, reforçando a unidade dos socialistas contra o "oportunismo" de Iglesias.

Vazio e propostas

O PSOE já tinha respondido antecipadamente a Iglesias, lembrando que foi o Podemos quem, em 2016, sabotou a iniciativa de Pedro Sánchez para constituir uma maioria de governo com o Cidadãos.

De parte a parte, a sessão foi marcada pela multiplicação dos adjectivos e a ausência de propostas. O debate foi aberto por Irene Montero, porta-voz parlamentar do Podemos. Coube-lhe o papel da virulência, centrando-se na corrupção. Qualificou o PP como organização de "delinquentes", tratou Rajoy de "machista", "franquista" e "saqueador". Rajoy não esperou pelo discurso de Iglesias e contra-atacou imediatamente, fazendo chacota sobre a "moção de censura contra a burguesia planetária" e ironizando sobre o fracasso do Podemos em tomar conta do PSOE. Sublinhou que um governo do Podemos seria "letal para o interesse geral" e para a democracia.

Iglesias fez um discurso calmo, de mais de duas horas, privilegiando o tema da corrupção, fazendo digressões históricas mas sem propostas políticas a apresentar, a não ser convidar o PSOE a um "entendimento" para "tirar do governo Rajoy antes que seja tarde".

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