O século XIX foi devolvido ao Jardim Botânico de Queluz

Construído no século XVIII, abandonado no século XIX, transformado no século XX e recuperado no século XXI: o Jardim Botânico do Palácio Nacional de Queluz renasceu.

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A planta do jardim de 1865 que foi agora reproduzida no terreno Torre do Tombo
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Margarida Basto
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São pouco mais de dois mil metros quadrados em 16 hectares de jardim. De pequena escala, quando comparado com outros da mesma época, o Jardim Botânico do Palácio de Queluz ficou pronto em 1776. De lazer e recreio e não de ensino ou aprendizagem, o também conhecido por Jardim das Estufas era “uma área vivida de forma diferente”. Depois de muitas vicissitudes, renasceu agora.

A entrada das tropas francesas pela fronteira portuguesa em 1807, levaram D. João VI e a sua mãe, a rainha D. Maria I, a partirem para o Brasil no ano seguinte. No Palácio de Queluz, ficavam as 200 espécies de plantas e os ananases plantados e, a partir de então, abandonados. Em 1821, a corte regressa a Portugal e realoja-se em Queluz.

Mais de um século depois, em 1940, o jardim perdeu a sua função e foi transformado em roseiral. Já em 1953, 1967 e 1983, as fortes cheias encarregaram-se de destruir e degradar o que restava do Jardim das Estufas — o “golpe da misericórdia” estava dado e, em 1984, o Jardim Botânico foi desmontado e transformado em picadeiro da Escola Portuguesa de Arte Equestre.

Uma nova oportunidade

Aos olhos da Parques Sintra em 2012, este pequeno jardim foi encarado como uma “prioridade”. A investigação histórica e as sondagens arqueológicas para o total restauro do Jardim Botânico começaram há cinco anos. Mas esta nova vida trouxe para a modernidade tudo o que há de antigo.       

Na Torre do Tombo, Nuno Oliveira e Marta Alves descobriram um desenho do Jardim Botânico de 1865, que “não deu para fazer totalmente igual, mas foi a base de todo o projecto”, explica a coordenadora da obra.

Pedras, cantarias, azulejos, estátuas e até uma grande peça em chumbo foram descobertas durante as escavações pelos 16 hectares de espaço verde do Palácio de Queluz. O projecto ganhou ânimo. “Reparámos que tínhamos os elementos originais do jardim, o que se revelou determinante para perceber que podíamos fazer a reconstrução”.

Depois das fissuras recuperadas e de algumas peças replicadas, o Director Técnico para o Património Natural, da Parques de Sintra, Nuno Oliveira, garante que “tudo é original, menos a estrutura das estufas”.

Pelos caminhos em saibro granítico que separam os 24 canteiros delineados por plantas de murta, chega-se às quatro estufas de plantas exóticas e de cultivo de ananases, que se impõem no jardim organizado simetricamente em torno delas. O centro do jardim, com sistema de rega automatizado, é marcado por um lago, tal como na cartografia de 1865, onde se destacam quatro estátuas de cães perdigueiros e uma figura em chumbo no meio.   

Mas nenhum pormenor foi esquecido. A partir de um Index (lista) de Manuel de Moraes Soares de 1789, descobriram-se o nome das 200 espécies existentes na época no jardim. A colecção botânica que povoa o jardim neste momento inspira-se nessa lista e mais de metade já tem sementes plantadas. Os canteiros estão classificados pelas 24 ordens de plantas — em latim —  de Carlos Lineu (que dividiu e classificou as plantas de acordo com o seu sistema sexual e estrutura reprodutiva).

Desde as mais vulgares como o tomilho, o alecrim ou a mandioca aos mais exóticos como o ananás, muitas espécies tiveram de vir de Inglaterra, França, Holanda, de viveiros nacionais e de outros jardins botânicos de modo a cumprir com o máximo rigor a lista do século XVIII.

Este “puzzle gigante” demorou dois anos a estudar e a procurar evidências e mais de dois a montar e envolvendo o trabalho de cerca de 20 técnicos. O projecto obedece aos regulamentos de segurança em vigor, o que significa que “a estrutura é robusta o suficente para aguentar possíveis cheias ou inundações”, explica Marta Alves. 

A manutenção dos dois mil metros que conjugam património natural e construído será garantida pela Parques de Sintra. Vários séculos mais tarde a nova oportunidade ao jardim outrora abandonado está dada e todos podem ir ver se valeu a pena a partir da próxima terça-feira, dia 6 de Junho.

Texto editado por Ana Fernandes     

Notícia corrigida às 11h41 de 28 de Junho: onde se lia "Pedro III", passa a ler-se "D. João VI".

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