Temer recuou e tirou tropas da rua, mas os seus dias podem estar contados

Após intensas críticas, decreto que autorizou uso de militares para reprimir manifestantes foi revogado. Aposta-se em decisão do Tribunal Supremo Eleitoral para que o Presidente brasileiro saia de cena.

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Manifestante ferido nos protestos em Brasília, reprimidos por várias polícias e pelo exército Ueslei Marcelino/REUTERS

Criticado por vários quadrantes políticos e por juristas, o Presidente brasileiro recuou e revogou o decreto com que mandou as Forças Armadas para a rua para reprimir os protestos na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, na quarta-feira, que começaram por ser contra as reformas do mercado do trabalho e da Segurança Social e acabaram por ser pela demissão de Michel Temer.

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, garante que não tinha pedido ao Presidente que mandasse a tropa para a rua, para garantir a segurança do Congresso. “Esse decreto é ilegal. Ele diz que não pediu. Então, que ele venha a público e diga que o Governo errou ao dizer que ele que pediu", afirmou Jandira Feghali, deputada do Partido Comunista do Brasil, citada pela Agência Estado.

Quando os militares chegaram à Esplanada dos Ministérios, o trabalho normal do plenário parou. A senadora Gleisi Hoffmann, do Partido dos Trabalhadores, leu o decreto de Michel Temer. “Isso aqui abre um precedente grave no país. Estamos caminhando para o imponderável e podemos estar caminhando para um regime de excepção, que é gravíssimo para a nossa democracia”, afirmou.

Já esta quinta-feira, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, disse que houve “um mal-entendido”: não foi a pedido de Maia, a decisão foi tomada pelo Governo – ou por Michel Temer, que é o único com poder de decretar a Garantia da lei e da Ordem (GLO), que regulamenta o uso esporádico das Forças Armadas, quando há uma crise de segurança pública.

Para a poder usar, o Presidente teve de declarar que a polícia de Brasília não tinha capacidade de conter os manifestantes – que seriam 25 mil nos números oficiais, ou 100 mil, segundo os organizadores.

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Os manifestantes incendiaram algumas zonas no Ministério da Agricultura Ueslei Marcelino/REUTERS

Dilma Rousseff fez uso deste decreto em 2013, quando enfrentou protestos nas grandes cidades por causa do preço dos transportes que se transformaram num alargado movimento de contestação social. Mas usar o exército contra uma manifestação em Brasília, a capital, pareceu um abuso. "Temer cala protesto contra seu Governo, usando exército. Medida autoritária, com claros sinais de abuso”, escreveu no Facebook Eloísa Machado, professora de Direito Constitucional, citada pelo El País Brasil.

"Saída honrosa"

Tanto a tentativa de demonstração de força como o passo atrás de Temer podem ser lidos como uma demonstração da insegurança de um Presidente que está a ser investigado por corrupção e que recusa demitir-se.

Enquanto isso, três anteriores presidentes – Fernando Henrique Cardoso, Lula da Silva e José Sarney – discutem nos bastidores possíveis acordos entre os maiores partidos brasileiros para o substituir, sem chegar a haver eleições directas. Políticos, juízes e economistas fazem parte desta bolsa de apostas em que se tentam equilíbrios delicados, de uma elite minada por acusações de corrupção.

Mas há uma aposta forte em que o desenlace desta crise esteja na possibilidade de Temer ser obrigado a sair de cena com a decisão do Tribunal Superior Eleitoral, esperada para 6 de Junho, sobre a validade da candidatura de Dilma Rousseff e Michel Temer em 2014. A queixa foi apresentada pelo Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), que no entanto é aliado de Temer no governo, e ainda não decidiu se deixará de o apoiar. Alega que a candidatura foi financiada de forma ilegal e pede a invalidação da “chapa” Rousseff-Temer.

Uma decisão desfavorável a Temer levaria à cassação do mandato e à pena de inelegibilidade, mas é vista pelos seus aliados como “uma saída honrosa” para o Presidente, apanhado em gravações feitas por um empresário acusado nas investigações da Lava-Jato a incentivar o pagamento de subornos a outros políticos.

“Temer poderia argumentar que seria deposto em razão de erros cometidos pela campanha de Dilma”, explica o jornal Estado de São Paulo. Os juízes deverão levar em conta os cenários de instabilidade política na sua avaliação, diz Gilmar Mendes, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – que, no entanto, é amigo de Michel Temer. 

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