O meu dicionário de moda: Azeiteiro e Burgundy

Não esperem encontrar por aqui o mais rigoroso dos dicionários de moda

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Não esperem encontrar por aqui o mais rigoroso dos dicionários de moda. Desde logo porque não é nada fácil compendiar todo um mundo de termos em vinte e quatro letras e, admito, há gente muito mais capacitada do que eu para o fazer. Se, no entanto, uma pesquisa no Google vos direcionou até esta crónica, deve haver uma razão forte que o justifique. Porque este não é um dicionário técnico, é certo, mas é muito mais divertido. Vamos a isto.

Azeiteiro

A expressão pode ter vários significados (pode ser aquele que produz ou comercializa azeite, pode ser o recipiente onde se guarda o produto e até pode ser, pasme-se, o indivíduo que explora prostitutas, normalmente conhecido como chulo), mas a definição de Azeiteiro que me interessa é aquela que tem por sinónimos parolo ou piroso. O Azeiteiro é uma espécie bastante vulgar e nada esquisita que se dá em climas amenos ou mais rígidos, sobrevive a altas temperaturas e aos dias gélidos, planta-se e prolifera em qualquer lado - independentemente da qualidade e da composição do solo -, e não requer grande manutenção. Por regra o Azeiteiro gosta de ajuntamentos (não é de estranhar, por isso, avistá-lo em shoppings, jogos de futebol, supermercados, concertos, praias a rebentar pelas costuras, manifestações ou festas populares), mas também existe o Azeiteiro Solitário, que normalmente só se junta a grupos com mais de cinco pessoas em situações excecionais: casamentos, concentrações de tuning ou reuniões sobre unhas de gelinho são disso exemplo. Quase posso jurar que todos nós já nos cruzamos variadíssimas vezes com Azeiteiros, na versão fêmea ou macho, e por isso não vou estar aqui a cansar-vos com a enumeração das características inerentes à espécie. Se em determinada ocasião não tiverem a certeza se devem classificar alguém como Azeiteiro ou projeto de, tabelem-no pela escala máxima. Apercebendo-se que exageraram, a desilusão é menor. Para os que tiverem curiosidade em perceber a amplitude e plenitude do conceito de Azeiteiro, desloquem-se a uma semana de moda ou, em versão mais comedida, assistam a uma edição do Portugal Fashion. É certo que vão encontrar gente cheia de pinta (aproveitem para se inspirar em alguns modelitos) mas também poderão observar bem de perto o Azeiteiro superlativo, que é o mesmo que dizer na variante fashion victim.

Burgundy

É um tom de vermelho com uma pequena porção de púrpura, chamando-se assim, dizem, por causa do vinho da Borgonha, produzido na região com o mesmo nome. Surgiu em força como cor tendência no inverno de 2013 e pronuncia-se burgundi (não caiam no erro de dizer burgundai, para não apanharem com um misto de chacota e sobrancelhas interrogativas, está bem?). Adoro esta cor, principalmente nas estações mais frias, porque aquece qualquer look, mas não percebo de onde vem este raio de necessidade de criar designações novas para o que já está definido e perfeitamente assimilado pela sociedade. E isto porque, não sendo uma especialista em análise cromática (ou, se calhar, por isso), ia jurar que o burgundy é igualzinho ao bordeaux e muito, muito parecido com tons como o marsala, o vermelho púrpura ou o grená. (Faço aqui um parêstesis para explicar que o bordeaux, curiosamente, é do mesmo tom do vinho tinto de Bordéus, o que me leva a crer que, no fundo, estamos face a um lobby da indústria vinícola, mas isso é um tema sobre o qual não me vou alongar). Dizia eu, não percebo porque é inventam diferentes designações para a mesma cor, só conseguindo justificá-lo com o deleite cruel dos especialistas em cores aquando do convívio com meia dúzia de leigos. E parece-me que, se podemos criar termos com esta facildade, também podemos aboli-los, certo? Sendo assim, em vez de se andar a confundir as pessoas com mesquinhices como as cores, proponho que se faça desaparecer do léxico português expressões ou designações que não interessam a ninguém, e chego-me já à frente para não acharem que isto é só garganta. Camilha. Alguém arranje uma forma, por favor, de fazer sumir o substantivo camilha, aquele tipo de mesa que só sobrevive em casa das avós, normalmente encimada por um napperon de renda. Se acham que isso é pedir de mais, que é não é nada fácil retirar o vocábulo de circulação, então assumamos todos essa responsabilidade: cabe a cada um de nós fazer desaparecer qualquer camilha que nos apareça à frente. O processo é mais longo e sinuoso, eu sei, mas um dia chegamos lá.

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