Poesia, tipografia e ilustração num livro para falar de refugiados

"Clube Mediterrâneo - Doze fotogramas e uma devoração" é um livro de poemas sobre refugiados feito a seis mãos — as de João Pedro Mésseder, Ana Biscaia e Joana Monteiro

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O escritor João Pedro Mésseder, a ilustradora Ana Biscaia e a designer Joana Monteiro juntaram-se para criar um livro de pequenos poemas sobre refugiados, entre a denúncia e a lamentação.

O livro Clube Mediterrâneo - Doze fotogramas e uma devoração começou por ser apenas um conjunto de pequenos poemas, fragmentos que surgiram quando as imagens que o escritor João Pedro Mésseder via todos os dias na televisão se tornaram "insustentáveis". "Sejam bem-vindos, irmãos, a estas areias cálidas, a este arame farpado, a estas coronhas, a estas rasteiras e pontapés", diz um dos pequenos fragmentos do escritor na obra que é apresentada a 3 de Junho, no Museu da Água, em Coimbra, pelas 19h.

O livro, que é "trágico e irónico ao mesmo tempo", apresenta uma "linha de denúncia, de crítica e outra de lamentação", numa pequena obra que também procura reflectir "sobre esta identidade europeia em crise, que a si mesma se devora", afirmou à agência Lusa João Pedro Mésseder. Muros, fronteiras fechadas, um mar que é um cemitério e o acto de devorar — a Europa que se devora e que "devora" os refugiados — estão presentes ao longo das páginas do livro, acompanhado pela tipografia e design de Joana Monteiro e da ilustração de Ana Biscaia.

No Clube Mediterrâneo - Doze fotogramas e uma devoração, surgem imagens de pessoas com semblantes quase fantasmagóricos, um olhar de frente de refugiados com o sofrimento estampado no rosto, homens, mulheres e crianças a caminhar, arame farpado ou a classe política. "Há uma certa dimensão de elegia", notou João Pedro Mésseder, considerando que também se procura criticar uma Europa "especialista" em muros. "Toda a gente devora os refugiados e tudo isto se passa no berço da cultura europeia, em que muitos dos valores com os quais a Europa se ergueu e se afirmou parecem agora esquecidos", sublinhou o escritor, referindo que parte do título é também ele utilizado de forma irónica. Club Med "é uma empresa de turismo que apresenta os países do sul da Europa como uma espécie de paraísos, sendo que os governos do norte da Europa, com a crise das dívidas soberanas, se referiam aos países do sul como uma espécie de Club Med, em que passavam o dia todo na praia e a tomar sol", explanou.

Se da última vez que Ana Biscaia e o escritor se juntaram criaram um livro sobre a Palestina para crianças, desta vez o livro procura ir ao encontro de um público jovem adulto. "É um livro que pode ser um desbloqueador. A própria experiência de o fazer também fez com que uma série de coisas em mim se desbloqueassem um pouco", explanou a ilustradora, que nas imagens procurou retratar "pessoas como nós". "Há uma certa angústia nos olhos, mas ao mesmo tempo elas não se escondem. Queria apresentá-las com o máximo de dignidade possível", realçou.

O livro surge como "um ponto de partida" para se pegar nele "e construir projectos à volta", indo às escolas ou contactando bibliotecas escolares, referiu Joana Monteiro. O livro, editado pela Editora dos Tipos e Xerefé, conta com o apoio da Semana Cultural da Universidade de Coimbra e é trilingue — português, francês e inglês.

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