Blackburn Rovers e outros campeões desgraçados

Pela primeira vez na era Premier League, um campeão inglês foi despromovido à terceira divisão. Mas não é caso único no futebol europeu.

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A desilusão dos jogadores do Blackburn Rovers com mais uma despromoção Andrew Couldridge/Reuters

Último dia da época 1994-95. Jogava-se o título da Premier League em dois estádios, no Boleyn Ground, em Londres, e Anfield, em Liverpool. Liderava o Blackburn Rovers, que ia a Liverpool, com dois pontos de vantagem sobre o Manchester United, que defrontava o West Ham. Chegou-se ao minuto 90 e ambos os jogos estavam empatados 1-1. Em Merseyside, ao terceiro minuto da compensação, Jamie Redknapp faz o 2-1 para os “reds” e lança o Rovers numa incerteza que seria breve. Logo a seguir ao golo, acabava o jogo em Londres sem que se desfizesse o empate e o Blackburn era campeão pela terceira vez, interrompendo dois anos de domínio do United.

Passaram 22 anos sobre essa conquista e o Rovers não voltou a subir tão alto. Aconteceu o contrário. No último fim-de-semana, o Blackburn, longe dos tempos em que tinha Alan Shearer e Chris Sutton na frente, ficou com seu futuro definido. Vai jogar a época 2017-18 na League One, o equivalente à III Divisão inglesa, depois de muitas épocas de má gestão, e é o primeiro clube campeão da era Premier League a descer tão baixo na pirâmide. Por pouco não teve a companhia de outro histórico do futebol inglês, o Nottingham Forest, o clube que tem mais títulos de campeão europeu (dois) que de campeão inglês, e que se safou de mais uma descida graças à diferença de golos.

A enorme diversidade de campeões ingleses da I Divisão faz com que os exemplos do Rovers e do Forest não sejam únicos. Já 24 equipas diferentes foram campeãs inglesas e, dessas, 11 estiveram na Premier League em 2016-17 (um deles desceu, o Sunderland), 11 no Championship (que também tem dois campeões europeus, o Forest e o Aston Villa), um na League One (Sheffield United, que subiu) e um na League Two (o Portsmouth, que também subiu). No Championsip continua aquele que foi o primeiro grande dominador do futebol inglês, o Preston North End, bicampeão nas duas primeiras temporadas de futebol inglês (1889 e 1890), mas que já não vê futebol de primeira desde 1961.

Tal como em Inglaterra, a Alemanha tem uma grande diversidade de campeões, o que não acontece agora, com o Bayern a ganhar sete dos últimos dez. Foram 29 os campeões alemães (sem contar com a Oberliga da RDA) e destes, dez estiveram na Bundesliga na última época. Há muitos antigos campeões germânicos perdidos pelos regionais, outros que já nem existem, outros que andam num permanente sobe e desce entre as duas divisões de topo. Depois dos 27 títulos do Bayern, é o Nuremberga que surge em segundo lugar, com nove campeonatos (mais um que o Borussia Dortmund), mas apenas um deles (1968) foi conquistado na era da Bundesliga — cinco foram conquistados antes da II Guerra Mundial.

Nenhuma equipa alemã teve, no entanto, uma queda tão vertiginosa quanto o Dínamo de Berlim, que ganhou dez campeonatos consecutivos na RDA entre 1979 e 1988. Era a equipa da Stasi e gozava dos favores do regime, mas desapareceu de circulação depois da queda do muro. Nunca participou na Bundesliga despois da reunificação e o melhor que conseguiu foi estar nos primeiros anos na III Divisão — ainda passou pela quinta e agora está na quarta. Tal como o Dínamo, nenhum dos antigos campeões da RDA está na Bundesliga, sendo o Dínamo de Dresden (oito títulos) o único que está na Bundesliga 2.

A Série A italiana tem quase todos os seus campeões na I Divisão (12 em 16) e terá mais um na próxima época, o Hellas Verona, segundo na Série B. O Pro Vercelli, sete vezes campeão entre 1908 e 1922, também se mantém na Série B, enquanto são dois os antigos campeões que jogam na Série D, Casale e Novese. Em França, contando apenas os campeonatos profissionais a partir de 1932-33, 11 dos 19 campeões estão na Ligue 1, sendo que os dois mais recentes que não estão lá, Lens (1998) e Auxerre (1996), têm perspectivas diferentes para as próximas semanas — o primeiro está na luta para regressar à primeira, o segundo está a tentar não descer à terceira.

Das “big 5”, a liga espanhola é a única que tem todos os seus campeões a jogarem uns contra os outros no topo e o mesmo acontece em Portugal, sendo que o Sporting tem uma visão alternativa do histórico de competições nacional. Os “leões”, cuja opinião é partilhada desde há poucos dias pelo FC Porto, entendem que uma competição denominada como Campeonato de Portugal que se disputou entre 1921 e 1938 vale como o campeonato nacional e não como a Taça de Portugal. Se esta visão for tomada como oficial, para além de mais quatro títulos para o Sporting, serão declarados como campeões portugueses o Marítimo, o Olhanense (que desceu esta época à terceira divisão) e o Carcavelinhos, clube que já não existe desde 1942, ano em que se fundiu com o União Foot-Ball Lisboa para dar origem ao Atlético.

* Planisférico é uma rubrica semanal sobre histórias de futebol e campeonatos periféricos. Ouça também o podcast

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