"Só queria que o Papa pusesse o meu filho a falar"

Os cerca de 600 lugares destinados aos doentes vão receber a bênção directamente das mãos do Papa motivam filas enormes de espera. Há 24 médicos destacados para fazer a selecção dos doentes.

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A fila dos doentes que se candidataram a receber a bênção do Papa Francisco, na missa de sábado Enric Vives-Rubio

“O que queria pedir ao Papa? Só que ponha o meu menino a falar…”. Andreia Simões espera há horas na fila dos doentes que se candidataram a receber a bênção do Papa Francisco, na missa de sábado. Tem as mãos pousadas no carrinho onde o filho, Luke Inácio, de sete anos, se senta no alheamento típico das pessoas com autismo. Quando há cinco anos, os médicos deram como inevitável que Luke “teria que ter um tubo para retirar o líquido que lhe fazia inchar o cérebro, Andreia, que vive em Nova Jérsia, nos Estados Unidos, pediu à sua mãe, a viver em Portugal, que fosse a Fátima “dar 22 voltas à capelinha das aparições em joelhos”.

“Levou dois dias”, conta a avó, que também os acompanha. “Valeu a pena”, retoma Andreia. “O meu filho deixou de ter líquido e não precisou do tubo”. Desta vez, pré-inscreveu-se na Internet para um dos cerca de 600 lugares disponíveis para os doentes e voou desde os Estados Unidos, na esperança de que a bênção do Papa a ajude. “Queria muito que o Papa pusesse o meu filho a falar. Que me ajudasse a comunicar com ele. E a única coisa que tenho é fé”. E resistência, muita. Veio a pé ao longo de 160 quilómetros e só não chegou ao fim da peregrinação, porque o pai de Luke lhe telefonou a dizer que ele estava há um dia sem comer. “Tive que desistir, porque ele só come comigo”.

Não é Andreia a única a chorar nesta fila de doentes. Quase todos se comovem só de estar aqui. Apesar do cansaço e da espera que se adivinha por horas. É que, uma vez lá dentro, cada doente mostra os documentos médicos que atestam a sua condição, e é observado por um dos 24 médicos e 26 enfermeiros que, segundo adiantou ao PÚBLICO, Rui Correia de Oliveira, chefe dos serviços de saúde, vão ficar a assegurar este serviço até à noite.

Mais adiantado na fila está Júlio Silva, 64 anos, com sérias dificuldades em manter-se de pé, mas sem cadeira de rodas em que se apoiar. Teve cancro, fez quimioterapia, gostava de pedir ao Papa, “se conseguisse arranjar palavras para falar com uma pessoa tão extraordinária”, que continue a lutar pela paz. “Venho cá todos os anos, a 13 de Outubro e a 13 de Maio, mas é a minha primeira vez como doente. Gostava de ser abençoado por ele, para que o cancro não volte e porque o considero a pessoa mais extraordinária que já passou por Roma”.

O padre italiano Alfredo Morselli, também numa cadeira de rodas e obrigado a esperar para poder ficar próximo do Papa, diria a Francisco coisas um pouco diferentes. “Que clarifique o que quer e que responda às perguntas dos cardeais”, enuncia, referindo-se à carta que quatro cardeais dirigiram ao Papa Francisco a propósito do acolhimento por parte da Igreja dos divorciados recasados. “Está uma confusão. Não estou contra o Papa mas ele tem de explicar-se e de explicar o que significa a misericórdia para estas pessoas”, dizendo-se com dúvidas se a absolvição dos divorciados “é de facto um acto de miseriórdia”.

Misericórdia seria conseguir que todos estes candidatos garantissem um lugar perto do Papa. “Infelizmente, não vai dar. O espaço não estica”, lamenta Rui Correia Nunes.

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