A "geringonça" portuguesa pode ser a "quarta via" do socialismo europeu?

Fundação Europeia para os Estudos Progressistas promoveu debate em Bruxelas com o secretário de Estado Pedro Nuno Santos e com a assessora do Governo Ana Rita Ferreira.

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No Parlamento Europeu, os deputados de PS, BE, PCP e PEV divergem tanto quanto convergem FRANCOIS LENOIR/REUTERS

A solução de governo em Portugal – a “geringonça” - foi ontem apresentada em Bruxelas como a prova de que pode existir uma política alternativa à austeridade e uma "quarta via" para os partidos socialistas e sociais-democratas, arredados do poder e em crise em vários Estados-membros, voltarem ao Governo.

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A solução de governo em Portugal – a “geringonça” - foi ontem apresentada em Bruxelas como a prova de que pode existir uma política alternativa à austeridade e uma "quarta via" para os partidos socialistas e sociais-democratas, arredados do poder e em crise em vários Estados-membros, voltarem ao Governo.

A Fundação Res Publica, em colaboração com a Fundação Europeia para os Estudos Progressistas – o laboratório de ideias dos socialistas europeus -, promoveu na capital belga uma conferência sobre a solução governativa protagonizada pelo PS com o BE, PCP e Verdes, e que contou com a participação do secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares – a título pessoal e não como governante, realçou.

Perante uma plateia com poucos eurodeputados mas muitos jovens, Pedro Nuno Santos explicou em inglês o “sucesso” da actual experiência de Governo, “em que muitos no início não acreditaram, incluindo no PS”. Nuno Santos contrapôs a receita do executivo PSD/CDS-PP, que “asfixiou a economia”, à da “geringonça”, que “respeita o povo português”.

A conferência teve como ponto de partida o relatório da professora universitária Ana Rita Ferreira, que é assessora da secretária de Estado Adjunta do Primeiro-ministro, sobre a actual solução governativa. O relatório pretende demonstrar que é possível fazer uma política alternativa à da austeridade com “bons resultados”, valorizando o Estado Social e respeitando os compromissos europeus.

Para a autora, a experiência portuguesa demonstra que é possível desenvolver uma agenda de esquerda dentro da União Europeia. Ana Rita Ferreira admitiu que a actual solução pode não ser “exportável” para todos os Estados-membros, mas é uma espécie de "quarta via" para a social-democracia que pode ser considerada noutros países.

Os dois oradores reconheceram que há diferenças entre os partidos de esquerda portugueses em relação à União Europeia, mas este assunto - fracturante para PS, BE, PCP e Verdes - não foi desenvolvido.

Repetir a "geringonça" em 2019? “Vamos com calma”

Pedro Nuno Santos, que ressalvou não estar ali para dar “lições”, garantiu que a solução liderada por António Costa “funciona” e “vai até ao fim”. Questionado no final pelos jornalistas, em relação a uma possível renovação dos acordos para a próxima legislatura, o secretário de Estado considerou prematura essa discussão. “Estamos em 2017, faltam dois anos até às eleições legislativas. Vamos com calma”, exortou.

Por seu turno, a vice-presidente do grupo dos socialistas europeus Maria João Rodrigues sublinhou a necessidade de alternativas políticas, também no plano europeu. A eurodeputada explicou que a bancada socialista no Parlamento Europeu (PE)  já fez o debate das alianças – rompendo a designada “grande coligação” com o Partido Popular Europeu (PPE).

Os socialistas europeus pretendem alianças com as outras forças progressistas, mas estas não são aritmeticamente suficientes para alcançar uma maioria no hemiciclo – por isso, será necessário procurar apoios de deputados dos grupos liberal e do PPE.

No entanto, a tarefa de criar alianças à esquerda no PE não se revela fácil. Por exemplo, nas principais questões e políticas relacionadas com a União Europeia (UE) há uma divisão profunda entre os deputados do PS e os do PCP e BE. No PE, a “geringonça” só funciona metade das vezes.

A Europa é fonte de divergências profundas como ficou demonstrado mais uma vez nas presidenciais francesas. Na UE como nos Estados-membros ainda parece pouco exequível replicar a experiência liderada por António Costa.