Esperanza Fernández canta José Saramago em Serpa com toda a alma do flamenco

Festival Terras sem Sombra traz cantaora sevilhana para um concerto onde temas religiosos se juntam à palavra de Saramago. Este sábado em Serpa, às 21h30.

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Esperanza Fernández LUIS CASTILLA

Em Fevereiro foi o Alentejo a Sevilha, agora vem Sevilha ao Alentejo. Por iniciativa do festival Terras sem Sombra, as vozes do Rancho de Cantadores da Aldeia Nova de São Bento juntaram-se à da cantaora Esperanza Fernández no Consulado Geral de Portugal em Sevilha, num concerto a que foi dado o nome de Imenso Sul. Agora, é Esperanza Fernández que se apresenta em Serpa, este sábado, para um espectáculo onde temas religiosos “vertidos na liturgia popular em ritmos de soleá, petenera ou siguirya” se misturarão a outros inspirados nas palavras de José Saramago. O Nobel português foi, aliás, o inspirador do terceiro disco a solo de Esperanza, que depois de Esperanza Fernández (2001) e Recuerdos (2007), lançou em 2013 Esperanza Fernández Canta a José SaramagoMi Voz En Tu Palabra. Dele, disse (e escreveu) à data Pilar del Río: “A harmonia foi possível e agora sabemos que José Saramago sonha em flamenco com tanto duende e compás como Esperanza Fernández se transforma em poeta ao cantar.”

Nascida em Triana, Sevilha, em 1968, Esperanza Fernández Vargas iniciou-se cedo nas lides flamencas. “Primeiro bailando, teria uns 10 anos. Comecei em coisas pequenas, em festas de colégio, de fim de curso. Também gostava de cantar, mas a minha timidez fazia com que quisesse ser artista mas sem saber como.” Foi o pai que acabou por “empurrá-la”. Disse-lhe (e ela recorda-o, agora): “‘Bailas bem, mas devias dedicar-te mais ao canto. Porque tens uma voz bonita, tens muito bom ouvido.’ Isto porque eu cantava em casa, desde pequenina, ouvia muita música. O meu pai tinha organizado o grupo da Família Fernández e eu, que participava nele bailando, comecei a cantar.”

A sua estreia foi em Sevilha, mas depois correu mundo. Pisando os mesmos palcos que Paco de Lucía, Camarón de la Isla ou Enrique Morente. “Para mim foi um luxo, como artista e como pessoa poder dividir o palco com ele [Morente]. Enriqueceu-me muito. Só o facto de estar ao seu lado, ouvindo-o, ensaiando ou escutando algum conselho dele, não tenho palavras para definir o quanto me senti, e sinto, orgulhosa por isso.”

Benny Moré e Manolo Caracol

Há um mês, no dia 6 de Abril, Esperanza actuou em Lisboa, na Fundação Gulbenkian, num concerto associado às comemorações do Dia Internacional dos Ciganos. E em 2014 já se apresentara no Teatro São Luiz com um concerto baseado no disco de Saramago. Retomá-lo-á agora, em parte, em Serpa “Quando me propuseram fazer este festival, achei oportuno voltar a Saramago. É um concerto de música sacra, mas creio, por mim e por José [Saramago], que seria conveniente que a sua palavra estivesse neste festival.”

O disco, que tem dez canções (A ti regreso mar, Dimisión, En esta esquina del tiempo, Dijeron que había sol, Alegría, Balada, Ha de haber, Alzo una rosa, Madrigal e Intimidad), resulta de uma parceria de Esperanza com o (também sevilhano) pianista e compositor David Peña Dorantes, aos quais se associaram, nas composições, José Miguel Évora e Luis Pastor. A selecção literária foi de Juan Blanco Noriega. Em Serpa (Praça de República, 21h30), Esperanza terá consigo Miguel Ángel Cortés, na guitarra, e, nas palmas e percussão, Jorge Pérez “El Cubano”, Dani Bonilla e Miguel Junior.

Em Junho, Esperanza gravará um novo disco, Oh Vida!, a partir de um espectáculo que fez em 2016 com o pianista cubano Gonzalo Rubalcaba. “É dedicado a Benny Moré e a Manolo Caracol”, diz. “É uma fusão muito boa. Será gravado em Sevilha.”

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