Autarca de Gaia acusado pelo MP de injuriar e difamar ex-adjunto

Em causa estão dois textos que o presidente da Câmara de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues, publicou em Agosto no Facebook. Bruno Santos sentiu-se injuriado e difamado e o Ministério Público deu-lhe razão.

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Martin Henrik
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O presidente da Câmara de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues, foi acusado pelo Ministério Público da prática dos crimes de difamação e injúria, na sequência de uma queixa-crime apresentada pelo seu ex-adjunto Bruno Santos. Em causa estão dois textos, com insultos, que o autarca socialista publicou no Facebook em Agosto e que, na opinião de Bruno Santos - e do MP - tinham como alvo este ex-colaborador, que Eduardo Vítor Rodrigues demitira um mês antes.

Militante do PS, Bruno Santos foi contratado pelo autarca em Dezembro de 2013, para exercer funções de adjunto no gabinete de apoio à presidência. As relações entre os dois começaram a deteriorar-se e Eduardo Vítor acabou por afastá-lo, transferindo-o para o gabinete do vereador da Cultura, Delfim Sousa, onde Bruno Santos ficou um mês e meio, até ser exonerado a 25 de Julho de 2016.

Na véspera do afastamento, o antigo colaborador chegou a ser impedido pela segurança da autarquia de entrar na Casa da Presidência do município, para participar numa reunião de trabalho. Dias antes, Bruno Santos publicara no blogue Aventar um texto no qual se insurgia contra a “distinção bizarra” concedida pelo município a Marco António Costa, que atribuiu a medalha de mérito profissional a este antigo vice-presidente da Câmara de Gaia e actual vice-presidente do PSD. “É um erro político clamoroso e um gesto em tudo contraditório com os valores e os princípios de que o PS é digno baluarte”, escreveu Bruno Santos.

A partir do dia 28 de Agosto tudo se complicou. Eduardo Vítor Rodrigues publicou no seu perfil do Facebook um texto intitulado Gollum [personagem de O Senhor dos Anéis, de J.R. R. Tolkien] ou culambismo, propondo-se “ajudar a operacionalizar empiricamente uma suposta categoria social criada pelo ‘grande Miguel Esteves Cardoso’. A categoria social designada ‘lambe-cus’”. Dois dias depois, o autarca assinou um segundo texto, também no Facebook, no mesmo registo. São estas publicações que dão origem à queixa-crime apresentada em Setembro.

“O culambismo é uma vigarice intelectual e uma sacanice operacional que prolifera nas instituições, massajando o ego dos chefes que gostam disso. É apenas um pedaço de gente mal formada e que ocupa lugares importantes por efeito de escolhas mal feitas (mea culpa)”, escrevia Eduardo Vítor.

O autarca do PS usava termos como “vigarista” e “corrupto” para atacar o seu alvo, dizendo que “o lugar dos lambe-cus oportunistas e desleais (…) é na rua”. E defendia que “os impostos (…) não podem pagar desleais massagistas de hemorróidas dos chefes”. “Preciso de quem trabalhe pelo município de forma competente, crítica e solidária venha de onde vier. Quem não o fizer, mesmo sendo socialista, não tem lugar e vai para a rua”, acrescentava.

“Parasitas modernos, sabonetes de banho”

O nome de Bruno Santos nunca é referido nos textos, mas o autor assume que “é dedicado" a alguém "em concreto” e que ele sabe quem é. “Mas para já não identifico a criatura”.

No dia seguinte ao primeiro texto do autarca, o seu antigo adjunto usa o blogue Aventar para o acusar de não ter coragem de escrever o seu nome. “Toda a gente do meio político e municipal percebeu que o texto se dirigia a mim, mas o professor doutor Eduardo Vítor Rodrigues foi capaz de montar um ataque pessoal e político do mais violento e ignominioso que tenho visto, sem ter tido a coragem mínima de dar nome ao alvo da sua fúria, sem ter escrito uma única vez o meu nome”.

O presidente da câmara, que é membro do secretariado nacional do PS, chegou mesmo a desafiar o seu antigo adjunto para um confronto cara a cara: “Se tudo isto não chegar, (…) espero pela próxima comissão política concelhia [do PS]. Se o tratante aparecer aí, desafio-o para um debate a dois (…) é só aceitar e marcar dia e hora”.

Segundo a acusação, a que o PÚBLICO teve acesso, a publicação destes textos "consubstancia um ataque soez e inqualificável ao bom nome e honorabilidade” de Bruno Santos e “não pode dispensar a responsabilização criminal” do seu autor. “Trata-se de um inqualificável e deliberado ataque pessoal com repercussões na sua vida familiar, na sua vida privada, no seu currículo pessoal, bem como em toda a sua actividade profissional”. “O arguido escreve que de tantas vénias que fazem ficam com a espinha dorsal torcida (…). São parasitas modernos, sabonetes de banho, os emplastros dos momentos felizes. O lambe-cus tanto lambe o seu chefe como escraviza os súbditos”, cita ainda a acusação.

Para o MP, “será difícil encontrar num só texto um acervo de adjectivação tão infame e humilhante dirigido a qualquer ser humano e que atinja tão gravemente valores que constituem a reserva inatingível da dignidade de qualquer cidadão. Trata-se de um ataque deliberado, consciente e pessoal desferido contra o assistente, vilipendiando o seu bom nome e reputação pessoal e profissional, bem sabendo o arguido dos graves prejuízos/danos que causou e continua a causar e pelos quais terá que ser criminalmente responsabilizado”.

Contactado pelo PÚBLICO, Eduardo Vítor Rodrigues fez saber através da sua assessora de imprensa que não tinha comentários a fazer.

O episódio da exoneração de Bruno Santos foi reportado a António Costa, enquanto secretário-geral do PS e primeiro-ministro, e também ao ministro Adjunto, Eduardo Cabrita, e ao secretário de Estado das Autarquia, Carlos Miguel.

O MP acompanha a acusação particular avançada pelo ex-colaborador de Eduardo Vítor Rodrigues por considerar que existem indícios da prática dos crimes descritos e fundamentação jurídica na acusação. Bruno Santos pede ainda uma indemnização de 50 mil euros a Eduardo Vítor Rodrigues.

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