Gaia: a multiculturalidade mora mesmo aqui ao lado

Exemplar na integração da comunidade cigana local, o Centro Comunitário da Cruz Vermelha de Gaia tem agora uma exposição, feita pelas crianças, para ser vista até 7 de Maio

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Pixabay/Pexels

O relógio aponta para as 17 horas e Josiane, cabelos tão longos quanto negros, já tem o livro de Ciências Naturais aberto: “Por que razão é que as aves têm bicos e patas tão diferentes?”. A concentração esvaneceu-se assim que entrou naquela sala de estudo do Centro Comunitário da Cruz Vermelha de Vila Nova de Gaia.

Está no quinto ano e, à semelhança dos outros miúdos, a maioria de etnia cigana, com quem divide a mesa, não gosta de estudar. No entanto, é capaz de reconhecer que a escola a pode levar mais longe — ou, pelo menos, ser-lhe útil para percorrer a distância até se tornar bailarina profissional.

Enquanto isso não acontece, todos os dias depois das aulas, a rotina dos TPC tende a repetir-se, não só com ela, mas com todas as crianças que frequentam o centro, residentes no bairro social Cabo-mor, a dois passos dali.

Apesar de estarem perfeitamente integrados na comunidade, “são miúdos em situação de vulnerabilidade social e a assiduidade foi um dos um compromissos feito com os pais”, explica Veraneanda Barbosa, directora da Cruz Vermelha de Vila Nova de Gaia.

E é com base nesse contrato que foi possível realizarem-se actividades lúdico-pedagógicas como a preparação da Semana Europeia da Juventude, uma completa novidade.

Selmo tem nove anos e já consegue atribuir um nome à maioria das bandeiras da Europa que foram manualmente recortadas e coladas numa mesa. “Sabias que a Grécia é de todos o país mais quente”?, pergunta com entusiasmo Alexandra Novais, um dos rostos do centro.

A exposição interactiva, que inclui imagens, um quizz e um vídeo, é o culminar de várias semanas de trabalho.

“É preciso mudar mentalidades”

Para aquelas crianças, algumas de descendência espanhola ou romena, a geografia da Europa é algo profundamente vago e conceitos como “mobilidade” ou “multiculturalidade” são impronunciáveis.

“Não reconhecem Lisboa como fazendo parte do país. É demasiado longe e, se lhe disser que estes miúdos nunca atravessaram a ponte, não lhe estou a mentir”, refere Alexandra.

“O nosso principal objectivo é mudar mentalidades”, explica Veraneanda. “Nós queremos que as oportunidades cheguem a todos e que eles percebam que não é por serem ciganos que não podem ir onde os outros vão, fazer Erasmus, voluntariado europeu, pensar políticas mesmo que não façam disso carreira, ter ideias. Só que, infelizmente, são os primeiros a pôr obstáculos no caminho”, conclui a directora.

A exposição está patente no Centro Comunitário (Rua Diogo Cão, 257, V. N. Gaia) até 7 de Maio.

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