Instituto Ricardo Jorge integrado numa universidade? Ministério diz que não

Num documento classificado como confidencial, a Universidade Nova de Lisboa recomenda a integração do Instituto Ricardo Jorge.

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Margarida Basto

A integração do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (Insa) na Universidade Nova de Lisboa (UNL) estava a ser estudada quase em segredo. Mas, face à polémica que esta possibilidade está a gerar e, depois de o primeiro-ministro ter garantido quarta-feira no Parlamento que a privatização do laboratório do Estado está fora de questão, o Ministério da Saúde assegurou esta quinta-feira que o estatuto do Insa não será alterado.

Mas a polémica continua. A integração do Insa numa universidade é uma matéria que começou a ser equacionada no ano passado. No relatório de Outubro de 2016 sobre a “Promoção da Investigação Clínica e de Translação e da Investigação Biomédica em Portugal”, realizado por um grupo de trabalho liderado pelo patologista Sobrinho Simões, recomendava-se, a dado ponto, que o Insa fosse “integrado numa universidade”.

Mas esta possibilidade apenas surge com contornos claros num draft da UNL, classificado como "confidencial" e a que o PÚBLICO teve acesso, intitulado "Documento Estratégico para a Integração do Insa na UNL". Com data de Março passado, no draft  recomenda-se que as duas unidades orgânicas do Insa - a sede em Lisboa e o laboratório de Águas de Moura (Palmela) - sejam integradas no perímetro da UNL, enquanto se sugere que a delegação do Norte do instituto fique sob a alçada da Universidade do Porto. Na primeira página sublinha-se que o documento foi elaborado "na sequência de uma reunião”, em 24 de Fevereiro, com os ministros da Saúde (que tutela o Insa) e da Ciência.

Explica-se que a ambição da instituição é promover a concretização de "um novo campus da UNL", o campus do Lumiar Nova Saúde Pública, que contaria com as infra-estruturas já existentes da ENSP (Escola Nacional de Saúde Pública) e do Insa, entre outros, e estabelece-se um “paralelismo histórico” com o caso do Instituto de Higiene e Medicina Tropical, cuja integração na Universidade Nova, no século passado, é descrita como “bem sucedida e feita de forma relativamente serena”. 

O mesmo não sucederia neste caso, a crer na oposição já manifestada por Federação Nacional dos Médicos (Fnam), Ordem dos Médicos, Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública e, mais recentemente, pelo PCP, que já fez várias peguntas ao Governo sobre esta matéria. Esta quinta-feira, o grupo parlamentar do BE formalizou também um pedido de audição, no Parlamento, dos dois ministros (Saúde e Ciência), além dos responsáveis por todas as entidades acima referidas e igualmente de Sobrinho Simões, reclamando “explicações sobre o Insa”.

Organismo público sob a tutela do Ministério da Saúde mas com autonomia, o Insa é o laboratório de referência no sector da saúde. Sublinhando que os “contornos desta integração na UNL são tudo menos claros”, o BE lembra que a Universidade Nova constituiu, "em Março de 2016, um consórcio com o grupo José de Mello Saúde que terá sede no futuro Hospital CUF de Alcântara". Denominado Tagus Tank, este consórcio passa por uma parceria na área da investigação e do ensino, "abrindo-se mesmo a possibilidade de promover a formação de medicina em hospitais privados".

 “Aquilo que não podemos permitir é que o Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge seja desmembrado e seja retirado da área da saúde para vir a incorporar consórcios ou projetos que têm por base uma parceria público-privada com o grupo Mello”, contesta o BE.

Por causa desta matéria, a Ordem dos Médicos e a Associação dos Médicos de Saúde Pública retiraram-se no início deste mês da Comissão para a Reforma da Saúde Pública. Em 11 de Abril, num duro comunicado, a Fnam alertava já para um eventual “desmantelamento do Insa” e, na semana passada, o PCP fez várias perguntas ao Governo sobre esta matéria, usando igualmente esta palavra..

O PÚBLICO pediu esclarecimentos aos ministérios da Saúde e da Ciência, ao Insa e à Universidade Nova de Lisboa. Só o Ministério da Saúde respondeu, para esclarecer que, “independentemente de exercícios de reflexão realizados no contexto de grupos de trabalho, tendo em vista a valorização e aprofundamento das competências do Insa", o estatuto do instituto não será alterado, “em nenhuma circunstância”, em “termos que modifiquem a sua natureza pública”.

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