Peniche vai ter o 15.º museu nacional

Governo reafirmou esta quinta-feira intenção de criar museu da resistência contra a ditadura na Fortaleza de Peniche. E destinou 3,5 milhões de euros para a recuperação deste monumento nacional.

Fotogaleria
O ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes Rui Gaudêncio
Fotogaleria
Na conferência de imprensa estiveram também Maria Manuel Leitão Marques, ministra da Presidência, e de Pedro Marques, ministro do Planeamento e das Infra-estruturas Rui Gaudêncio
Fotogaleria
O Conselho de Ministros realizou-se em Peniche Rui Gaudêncio
Fotogaleria
Rui Gaudêncio
Fotogaleria
Rui Gaudêncio
Fotogaleria
Rui Gaudêncio
Fotogaleria
Rui Gaudêncio
Fotogaleria
Rui Gaudêncio
Fotogaleria
Rui Gaudêncio
Fotogaleria
Rui Gaudêncio

O museu nacional da resistência contra a ditadura, que vai recuperar os três edifícios da antiga prisão política do Estado Novo na Fortaleza de Peniche, vai ser o 15.º museu da Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC). O museu e a valorização da fortaleza, onde ficará instalado, viram esta quinta-feira ser-lhes atribuída, num Conselho de Ministros especial, uma verba de 3,5 milhões de euros para a recuperação de todo este monumento nacional, que inclui estruturas desde o século XVI, e para o respectivo projecto museográfico.

O Conselho de Ministros confirmou assim a dimensão nacional do museu a instalar na fortaleza — onde neste momento existe apenas um museu municipal com diversas temáticas —, notícia que já tinha sido avançada pelo PÚBLICO, depois de o grupo consultivo nomeado pelo ministro da Cultura ter apresentado as suas soluções para o futuro da Fortaleza de Peniche.

Após a conferência de imprensa que se seguiu ao Conselho de Ministros na Fortaleza de Peniche, o ministro da Cultura esclareceu o modelo orgânico ao PÚBLICO, afirmando que a tutela será da DGPC, o organismo da cultura que reúne monumentos e museus.

Depois de Évora e Conímbriga, que se juntaram recentemente ao clube dos museus nacionais, será agora a vez de Peniche. Mas enquanto os dois últimos já fizeram parte da rede nacional tutelada pela DGPC, Peniche dá um salto raro na estrutura museológica portuguesa, passando de municipal a nacional e alterando substancialmente o seu programa.

Na conferência de imprensa, o ministro da Cultura Luís Filipe de Castro Mendes disse que o Governo espera inaugurar o museu em 2019, antes do final da legislatura. Pedro Marques, ministro do Planeamento e das Infra-estruturas, que também estava presente, explicou que estas verbas saem do programa Portugal 2020 e que ainda esta quinta-feira iriam sair “os avisos das candidaturas”. 

À margem da conferência de imprensa, Paula Silva, directora-geral do património, disse que quer começar ainda este ano as obras nos edifícios da prisão e da própria fortaleza, chamando a atenção para o estado de degradação dos pavilhões A e B, que não estão musealizados, ao contrário do pavilhão C, onde se encontra o núcleo dedicado à resistência ao fascismo do actual museu municipal. Nas coberturas, apontou, é possível descortinar o ferro do betão armado que não devia estar à vista.

O ministro da Cultura esclareceu que o nome do museu não é definitivo e que vai agora ser discutido no âmbito do projecto de recuperação da fortaleza, acrescentando em tom de brincadeira que Maria Manuel Leitão Marques, ministra da Presidência e da Modernização Administrativa, igualmente na conferência de imprensa, tinha acabado de sugerir o nome de Museu da Liberdade. O museu foi, aliás, designado de várias maneiras durante a conferência de imprensa, tendo a ministra começado por chamar-lhe, no início do encontro com os jornalistas, "museu nacional dedicado à luta pela liberdade e democracia".

A verba de 3,5 milhões de euros é resultante de uma avaliação do estado de degradação do monumento feita pelo Instituto da Construção da Faculdade de Engenharia do Porto, a pedido da DGPC, e revelada pelo ministro à Lusa também há dez dias. Apesar de a verba não coincidir com a avaliação de 5,5 milhões feita há mais tempo pela Câmara Municipal de Peniche, o seu presidente, António José Correira, disse aos jornalistas após o anúncio do Governo que está "muito satisfeito". "A verba não tem de coincidir porque os 5,5 milhões tinham já algum investimento para algumas funcionalidades." Pedro Marques tinha esclarecido que a verba de 3,5 milhões é para três anos, incluindo já 2017.

"Um lugar vivo"

O Conselho de Ministros reuniu-se em Peniche precisamente no dia em que se comemoram 43 anos da libertação dos últimos presos políticos de Peniche, concretizada dois dias depois da Revolução de Abril. Antes da reunião, o primeiro-ministro António Costa, rodeado dos seus ministros, fez uma visita guiada por alguns presos políticos e pelo presidente da câmara ao monumento, tendo passado por diversas celas, nomeadamente pela de Álvaro Cunhal, o secretário-geral do PCP já desaparecido.

Domingos Abrantes, que aqui esteve preso duas vezes num total de dez anos e que chegou um mês depois da famosa fuga de Cunhal e mais nove presos em 1960, contou junto ao muro exterior por onde se deu a evasão como naquela noite um guarda que ajudou os presos comunistas na fuga se sentiu "enganado" pelo número inesperado de fugitivos e abandonou os últimos quatro à sua sorte. António Costa, cujo pai já falecido esteve preso no Aljube e em Caxias mas não em Peniche, não fez declarações oficiais aos jornalistas, mas disse, dentro da confinada cela de Cunhal, que é a homens como Domingos Abrantes que devemos a liberdade. "Acho fundamental manter esta memória viva porque como infelizmente a História nos tem recordado quando nos esquecemos, tendemos a repetir aquilo que nunca mais pode ser repetido", disse, citado pela Lusa.

Se a fotografia com os ministros foi feita no Baluarte Redondo, a estrutura mais antiga da fortaleza, já a que juntou o primeiro-ministro com as várias dezenas de presos políticos convidados para o evento foi tirada no Pátio da Cisterna, o espaço do pavilhão C onde os presos passavam o seu tempo de recreio.

Ex-preso, Gaspar Barreira, um cientista que faz parte do grupo consultivo nomeado depois de o Governo ter recuado na intenção de adaptar a fortaleza a uma pousada, lembra-se de serem proibidos de se aproximarem das janelas e de estas terem vidros foscos. Só se ouviam as ondas do mar, as gaivotas e o som das traineiras. Há cinco ou seis anos, deixou de ter pesadelos em que continuava preso e já não sabe se sofreu muito ou pouco: "Não gostava que isto fosse uma coisa dos coitadinhos, um muro das lamentações. Claro que estiveram presas 2400 pessoas em Peniche mas a repressão tinha mais aspectos do que prisão e tortura. A situação da mulher, por exemplo, era extremamente gravosa." 

Sobre o anúncio do Governo depois de o grupo de trabalho ter apresentado as suas conclusões há dez dias, ficou muito surpreendido com a rapidez. "Era isto que nós esperávamos, conseguir reverter o programa de privatização de parte do espaço, mas não esperava uma resposta tão rápida, extrema e eloquente." Conta que ainda se pensou numa pousada da juventude, mas não era rentável. Espera que se construa um auditório, que a câmara de Peniche não tem, e que possa surgir uma incubadora de empresas ligadas à economia do mar ou que se instalem aqui alguns ramos de investigação nesta área, porque este deve ser "um lugar vivo". 

Sugerir correcção
Ler 21 comentários