Novas regras ainda não chegam a todos os desempregados

Lei prevê que o novo modelo de acompanhamento, em vigor desde Outubro, devia abranger todos os 210 mil desempregados subsidiados até ao final de Abril. Aplicação está a ser gradual, mas IEFP garante que está a fazer "todos os esforços” para que o prazo seja cumprido.

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Barbara Raquel Moreira

O novo modelo de acompanhamento dos desempregados subsidiados, que substituiu o controlo quinzenal, está a ser aplicado de forma gradual e passados quase seis meses ainda não chegou a todos - apesar de a lei determinar que isso deverá acontecer até ao final de Abril. Os casos de Domingos, 33 anos, e de Cláudia, 41, ilustram bem a forma como o Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) está a pôr em prática as novas regras. Domingos, desempregado desde meados de Dezembro, demorou pouco mais de dois meses até encontrar um rumo para a sua vida profissional. Cláudia está desempregada há um ano e desde que acabaram as apresentações quinzenais não voltou a ser contactada pelo centro de emprego. Está à espera que o seu Plano Pessoal de Emprego (PPE) seja revisto.

Em Outubro do ano passado, o Governo acabou com a obrigação de os desempregados subsidiados se apresentarem de 15 em 15 dias nos centros de emprego. Em alternativa, criou o Modelo de Acompanhamento Personalizado para o Emprego (MAPE), obrigando os centros do IEFP a serem mais proactivos na procura de soluções em conjunto com os desempregados. Com novas regras, o PPE de cada desempregado tem de ser desenhado no prazo de 15 dias após a inscrição e passa a haver uma planificação trimestral das acções destinadas a apoiar o seu regresso ao mercado de trabalho. No caso dos desempregados que já estavam inscritos nos centros do IEFP quando o novo modelo entrou em vigor, os PPE “devem ser reavaliados no prazo máximo de seis meses”. Ou seja, até ao final de Abril.

A poucos dias do final do mês, o novo regime ainda não abrange todos os 210 mil desempregados que recebem subsídio. O IEFP diz que é cedo para fazer uma apreciação global das mudanças e não tem dados quantitativos, mas reconhece que os centros têm dado prioridade a quem se inscreveu de Outubro em diante, enquanto a resposta aos que já estavam nas listas tem sido faseada.

"A revisão dos PPE está a ser efectuada de forma gradual, tendo sido priorizados os candidatos que há mais tempo se encontravam sem integrar qualquer acção prevista no plano”, explicou fonte oficial do IEFP. Questionada sobre se o prazo de Abril será cumprido, a mesma fonte respondeu que “estão a ser desenvolvidos todos os esforços necessários” para que isso aconteça.

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Cláudia, que prefere não revelar o último nome, é uma das pessoas que ainda não sentiu qualquer mudança. É jornalista e está desempregada há um ano. A sua relação com o centro de emprego onde está inscrita, na zona da Grande Lisboa, é “distante”. Desde Outubro, não foi contactada e aguarda a revisão do seu PPE, um documento onde inscreveu os seus interesses e as suas prioridades profissionais. A avaliar pela experiência vivida no último ano, receia não lhe servirá de muito para sair da situação em que se encontra. 

Também Paula (que pede igualmente para não ser identificada pelo último nome), 53 anos e inscrita num centro da região Norte, está na mesma situação. Desde que acabou a obrigação de se apresentar de 15 em 15 dias, esta contabilista apenas foi convocada para ir ao centro de emprego provar que continua à procura de trabalho. O PPE não foi revisto, o subsídio está quase a terminar e Paula não tem qualquer expectativa de que possa vir a encontrar emprego com a ajuda do Estado.

Uma questão de expectativas

Um técnico do IEFP com quem PÚBLICO falou explicou que no serviço onde trabalha “já foram chamadas todas as pessoas subsidiadas para a primeira sessão de direitos e deveres e foram feitas algumas reformulações do PPE”. Noutros centros, os desempregados inscritos há mais tempo estão a ser convocados para essa acção inicial ou para conhecerem as formações disponíveis, enquanto a revisão dos PPE não avança.

Se em algumas circunstâncias essas sessões são úteis, noutras são consideradas extemporâneas. Uma das desempregadas com quem o PÚBLICO falou, e que pediu para não ser identificada, diz que só agora ficou ciente de que poderia tirar um mês de férias (em que não está sujeita às obrigações e deveres). Outra revela que não lhe acrescentou nada de novo, lembrando que, no momento da inscrição, já tinha recebido um documento com essas explicações.

Para  o IEFP, "de uma forma geral, há boa receptividade dos utentes às intervenções desenvolvidas”. “Observa-se que os baixos níveis de escolaridade, as situações de precariedade financeira e a revolta sentida pela situação de desemprego, são factores que determinam em grande parte a aceitação do público", justifica fonte oficial do instituto.

Domingos Morais, 33 anos, não tem nada a apontar ao acompanhamento que recebe no centro de emprego da margem sul do Tejo onde está inscrito. Ficou desempregado em meados de Dezembro e passadas duas semanas foi chamado para uma sessão de esclarecimento sobre os seus direitos e deveres e, depois, para participar numa apresentação das acções de formação disponíveis. Em Março, começou uma formação em aeronáutica no Centro de Formação de Setúbal do IEFP.

O curso dura 15 meses e a expectativa é “encontrar trabalho numa empresa do ramo da aeronáutica”. Domingos que não foi além do 12º ano, “por circunstâncias da vida”, tem agora os olhos postos na construtora aeronáutica Embraer, em Évora, e espera ter encontrado um rumo para a sua vida profissional, depois de ter trabalhado sempre na área do atendimento ao público.

Sem reforço de pessoal é difícil ter resultados

Embora ainda não haja dados quantitativos que permitam perceber o impacto que o novo acompanhamento tem na vida dos desempregados, os testemunhos de pessoas que ficaram desempregadas de Outubro em diante ouvidos pelo PÚBLICO dão conta de um esforço para as enquadrar num momento mais precoce. 

Há, contudo, quem receie que esse acompanhamento mais próximo não se traduza na resposta que todos esperam: voltar ao mercado de trabalho. Ana Pires, representante da CGTP no conselho de administração do IEFP, alerta que "o novo modelo é exigente e exigirá o reforço de recursos humanos". "Enquanto isso não acontecer, é muito difícil fazer um acompanhamento próximo e haver um desfecho positivo”, antecipa.

Um dos técnicos de emprego que falou com o PÚBLICO lembra que essa necessidade de recursos nem sempre pressupõe maior número de trabalhadores, mas sim a necessidade de formação. O IEFP, por seu lado, destaca o envolvimento dos seus trabalhadores e acrescenta que está também a recorrer aos Gabinetes de Inserção Profissional espalhados pelo país (criados por autarquias, por exemplo).

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